Semana Europeia do Antibiótico comemorou-se entre os dias 18 e 24 de novembro. Antes de tudo, qual a importância que esta efeméride tem no domínio da sensibilização da população, no que concerne à utilização excessiva e incorreta dos antibióticos?
Paulo Teixeira (PT) – Os antibióticos revolucionaram a medicina e aumentaram significativamente a esperança média de vida nas últimas décadas. No entanto, reconhecemos que estamos a esgotar este recurso valioso e como tal é importante recorrer à sensibilização de todos.
Os antibióticos são salva-vidas, mas a sua eficácia está cada vez mais ameaçada devido ao crescente desenvolvimento de bactérias resistentes. O consumo inapropriado de antibióticos é uma das maiores causas para este problema e, se nada for feito, corremos o risco de podermos regressar ao passado, onde infeções fáceis de tratar estarão em risco de ser não tratáveis e procedimentos médicos de rotina poderão ser fatais.
A este ritmo, em 2050 problemas relacionados com a resistência aos antibióticos matarão mais do que o cancro, afetando pessoas de todas as idades e de todos os países, com efeitos laterais também para a sociedade e o ambiente.
O GIS – Grupo de Infeção e Sepsis, em conjunto com a Pfizer, tem vindo a promover a campanha – “Tome a Atitude Certa”, com vista à prática de comportamentos diferentes e mais conscientes sobre a utilização de antibióticos. Antes de tudo, de que forma é fundamental que este género de iniciativas continuem a ser criadas e o que espera desta?
Paulo Mergulhão (PM) – A campanha “Tome a Atitude Certa” tem como objetivo fundamental a sensibilização de todos os intervenientes para a dimensão do problema da resistência aos antimicrobianos (RAM) e das atitudes que podem ser adotadas nos diversos níveis de intervenção no sentido de melhorar a situação.
Sem serem os únicos instrumentos disponíveis, as campanhas de sensibilização alargada são muito relevantes uma vez que permitem o contacto com um segmento muito alargado da sociedade. Esta abrangência é relevante se se reconhecer que o combate à RAM não se limita ao microcosmo da Medicina Humana. A realidade é que o consumo de antimicrobianos ocorre em múltiplos contextos e que a sua utilização racional deve ser um objetivo aceite de forma transversal pela sociedade e não apenas por alguns setores.
Esta necessidade decorre do facto do antibiótico ocupar um lugar fundamental na prática da Medicina moderna. Este papel encontra-se atualmente em risco devido à emergência crescente de bactérias resistentes aos antibióticos.
“Tome a atitude Certa” _ Qual o objetivo desta campanha? De que forma é que este mote deve funcionar como uma chamada de atenção?
PT – Esta iniciativa pretende esclarecer e informar a população portuguesa dos perigos que a automedicação tem para a saúde, assim como alertar para os riscos da utilização incorreta de antibióticos em situações onde os mesmos não são eficazes, como por exemplo: infeções virais, como gripes e constipações.
Decisores políticos, administradores hospitalares, médicos, enfermeiros, farmacêuticos, comunicação social e público em geral são o alvo desta campanha, para que em conjunto possamos caminhar para uma utilização mais correta dos antibióticos. A resistência aos antibióticos é uma preocupação e um problema de saúde pública mundial e é importante que cada um assuma a sua responsabilidade e “Tome a atitude certa”.
Com este projeto, pretende-se alertar para a problemática da situação, bem como sobre quais são, na prática, as atitudes certas que todos devemos tomar. Para elucidar o nosso leitor, quais são realmente as atitudes corretas a tomar?
PM – Existe um enorme leque de estratégias sensatas que abrangem múltiplos intervenientes. Muito recentemente foi publicado o “Plano Nacional de Combate à Resistência aos Antimicrobianos 2019-2023” que tenta apresentar uma perspetiva mais detalhada sobre a questão, identificando diversas entidades, públicas e privadas, que podem e devem ter uma palavra nesta matéria.
É um tema demasiado vasto para uma resposta curta mas há aspetos que merecem realce. Desde logo a necessidade de envolver o público. Há medidas simples, acessíveis a todos e que podem contribuir significativamente para preservar a eficácia dos antibióticos.
Atitudes como tomar antibióticos apenas quando prescritos por um médico e garantir que entendemos como o fazer, nomeadamente ter os cuidados de perceber quando se deve parar. Outro aspeto relevante é o de evitar partilhar antibióticos. A utilização destes fármacos ocorre em situações muito específicas e altamente variáveis. Logo, a prescrição que é apropriada para uma determinada pessoa dificilmente o será para outra, por muitas semelhanças que pareçam existir. A questão da partilha de antibióticos pode ser amplificada pela inexistência da possibilidade de prescrever antibióticos em “unidose”, ou seja, o médico poder prescrever o número de comprimidos necessário à duração de tratamento que pretende. Uma vez que as embalagens têm tamanhos fixos (p. Ex. 8 ou 16 comprimidos) isto leva frequentemente a que, no final do tratamento prescrito, sobrem alguns comprimidos. Idealmente estes devem ser devolvidos nos locais apropriados para o efeito. Não devem ser guardados para uma qualquer eventualidade nem eliminados no saneamento público uma vez que isso vai aumentar a pressão de seleção sobre os microrganismos e contribuir para agravar o problema da RAM.
Por outro lado, a prevenção da infeção é igualmente um aspeto que não deve ser descurado. O cumprimento rigoroso das recomendações referentes à vacinação, ter atenção à higiene das mãos e minimizar (na medida do possível) o contacto com outros em situação de doença aguda podem também ser eficazes ao reduzir o risco de infeção e, logo, a necessidade de usar antibióticos.
Na sua opinião, o combate à resistência aos antibióticos deve ser uma prioridade de saúde pública para os próximos anos? Sente que estamos no caminho certo nesta temática?
PM – O combate à RAM e prevenção da infeção foram já assumidos como programa de saúde prioritário, integrados numa estrutura única denominada Programa de Prevenção e Controlo de Infeção e Resistência aos Antimicrobianos (PPCIRA). A criação do PPCIRA em 2013 representa um passo importante de reconhecimento, por parte da tutela, da dimensão do problema e da necessidade de atuar sobre ele. No entanto as equipas no terreno, que têm a responsabilidade de implementar as recomendações sobre boas práticas de prevenção de infeção e de utilização de antibióticos continuam a deparar-se com inúmeros obstáculos e constrangimentos que carecem de identificação e resolução.
Como já foi dito, o problema não se coloca apenas ao nível da Medicina Humana. Áreas como a agropecuária e a Medicina Veterinária são também intervenientes importantes neste assunto. A Aliança Portuguesa para a Preservação do Antibiótico reflete este entendimento alargado. Promovida em parceria entre o Grupo de Infeção e Sepsis e a Direcção Geral de Saúde, nasceu em 2011 e engloba parceiros tão diversos como Administrações Regionais de Saúde, Apifarma, Associação Nacional de Farmácias, Associação Portuguesa de Médicos de Clínica Geral, DECO, Direcção-Geral de Veterinária, Instituto Nacional da Saúde, Ordem dos Enfermeiros, Ordem dos Farmacêuticos, Ordem dos Médicos e Ordem dos Médicos Veterinários. Este é talvez um bom momento para a relançar revendo os seus objetivos e criando iniciativas para os levar a bom porto.
De que forma é que o GIS – Grupo de Infeção e Sepsis tem vindo a contribuir decisivamente para tentar alterar este cenário?
PM – O GIS tem em 2020 o seu 25º aniversário. Na sua génese está o objetivo de promover a utilização racional e otimizada dos antimicrobianos. Inicialmente mais dedicado à questão da infeção grave (“sepsis”), o avolumar do problema da RAM tem levado o grupo a dedicar cada vez maior atenção ao tema da boa utilização de antimicrobianos nos mais diversos contextos.
Já em 2011 foi lançada a campanha de divulgação “Antibióticos a mais, saúde a menos”, em parceria com a Direcção Geral de Saúde e que tinha como objetivo fundamental aumentar a visibilidade de um problema que já na altura era preocupante.
Especificamente na área da saúde humana o GIS tem desenvolvido vários instrumentos de formação pós-graduada dirigidos para a melhoria das práticas de utilização de antimicrobianos. O congresso anual do Grupo (Simpósio de Infeção e Sepsis) que é, reconhecidamente, uma das principais reuniões Nacionais sobre infeção dedica atualmente uma proporção significativa da sua duração à discussão sobre a RAM e como a combater.
Para a Pfizer, quão relevante tem sido esta “luta” em prol desta consciencialização e sensibilização?
PT – Desde o nosso trabalho pioneiro com a penicilina em 1940 que a Pfizer tem tido um papel ativo no desenvolvimento de medicamentos e vacinas inovadoras e na criação de ferramentas, políticas e programas educacionais para atender às crescentes necessidades dos doentes e profissionais de saúde na área das doenças infeciosas.
Possuímos o maior e mais variado portfólio de antimicrobianos da indústria farmacêutica, nomeadamente no tratamento de infeções bacterianas por gram-negativos e infeções fúngicas invasivas e orgulhamo-nos de assumir a liderança na luta contra o problema das multirresistências. Prova disso, é o facto da Pfizer ter sido reconhecida este ano pela Access to Medicines Foundation, no 2020 Antimicrobial Resistance Benchmark Report, como uma das principais empresas da indústria farmacêutica a estar na vanguarda desta problemática.
O relatório (Benchmark 2020) destaca a liderança da Pfizer no desenvolvimento e acesso a novos medicamentos e vacinas, na aplicação de medidas de produção responsável que minimizam o impacto na saúde humana e no meio ambiente, tanto nas nossas fábricas, como na gestão de riscos com os nossos fornecedores. É ainda destacado o nosso compromisso com o banco de dados “Atlas”, um programa de vigilância inovador para ajudar os profissionais de saúde a compreenderem melhor os padrões das resistências.
A Pfizer é ainda, desde 2016, uma das empresas signatárias da Declaração de Combate à Resistência Antimicrobiana e temos orgulho de sermos pioneiros no fornecimento de tratamentos e soluções que permitem uma maior proteção contra as doenças infeciosas, agora e no futuro.
Na Pfizer, acreditamos que só as empresas biofarmacêuticas capazes de criar valor significativo para os doentes irão prosperar. É essa a razão para um renovado ênfase no nosso propósito: Breakthroughs that change patients’ lives – Inovação que transforma a vida dos doentes. Um propósito claro, que define quem somos como empresa e que guia a nossa cultura.