O mundo vive num momento particularmente difícil, fruto da pandemia da COVID-19, que aportou uma série de mudanças no nosso quotidiano e nos obriga hoje a viver num «novo normal». No sentido de contextualizar junto do nosso leitor, que análise perpetua da forma como as entidades responsáveis dos Açores lidaram e lidam com esta novo panorama?
A Região Autónoma dos Açores impôs medidas muito severas para a prevenção e contenção da pandemia, restringindo liberdades e direitos dos cidadãos, tão caros à nossa Autonomia. Fizemos do isolamento das nossas ilhas a nossa maior força. Agora estamos concentrados na retoma da atividade, em todos os sectores, de forma cautelosa, mas segura.
Quais foram, na sua opinião, os momentos chave para que a região tenha conseguido ultrapassar os obstáculos e as dificuldades impostas?
Os momentos-chave correspondem à escalada, em grau de severidade, das medidas adotadas na Região desde o dia 11 de março, data da declaração da situação de alerta em todo o território da Região Autónoma do Açores.
A título de exemplo, em 12 de março, encerrámos estabelecimentos de ensino, de diversão noturna e salas de cinema, ginásios, respostas sociais, museus, entre outros.
Em 13 de março, decidimos impor quarentena a todos os passageiros desembarcados na Região e concentrar os voos da Azores Airlines nos aeroportos de Ponta Delgada, em São Miguel, e das Lajes, na Terceira. A 19 de março, suspendemos as ligações aéreas e marítimas entre todas as ilhas da Região. Foram decisões difíceis, mas adequadas à situação epidemiológica.
Muito recentemente agradeceu a todas as organizações do setor social que se aliaram ao Governo dos Açores no âmbito das medidas de prevenção e contenção da pandemia de COVID-19. De que forma é que este sentido de união e solidariedade foram fundamentais nesta luta?
União e solidariedade foram fundamentais, mas eu acrescentaria a confiança. Foi graças à confiança que, quando surgiu um caso de infeção na comunidade sem-abrigo, contámos com o apoio de organizações do sector social, que garantiram o acolhimento, o isolamento e a vigilância dos casos suspeitos com ele relacionados. Assim, prevenimos o que se poderia revelar uma tragédia.
E esta cooperação evolui nos dois sentidos, porque, perante um caso de infeção numa estrutura residencial para idosos, foram os enfermeiros da Unidade de Saúde da Ilha de São Miguel que prontamente asseguraram todos os cuidados aos utentes daquela instituição.
De que forma tem sido importante implementar medidas centradas no reforço da relação entre a autarquia, entidades de saúde e a população?
Tem sido crucial. Não é possível assegurar a defesa da saúde dos cidadãos sem o apoio das autarquias, intervenientes em todos os sectores da atividade.
Por outro lado, não haverá fator mais decisivo para a saúde do que a conduta individual.
Por isso, fizemos uma campanha de comunicação assertiva, em diversas frentes, para garantir a transparência e o conhecimento da população sobre a situação epidemiológica, as medidas adotadas e os meios de autoproteção.
Todos esperamos que isso não aconteça, mas na possibilidade de uma segunda vaga, estão os Açores preparados para dar resposta a este novo desafio, caso o mesmo venha a acontecer?
Estamos mais preparados do que no início do ano. Os profissionais estão mais treinados, a população está mais sensibilizada, as organizações estão mais ágeis, temos mais equipamentos e material clínico. Mas não podemos baixar a guarda. Nenhum sistema é inexpugnável e o fator crítico de sucesso será a conduta de cada um de nós.
Que conselho deixaria à população dos Açores no sentido de evitarmos essa segunda vaga? O que está a ser realizado nesse sentido?
Não existindo, à data, nenhum caso de transmissão local, temos de apostar na contenção dos casos importados. Assim, todos os passageiros que chegam à Região têm de apresentar um teste de despiste ao SARS-CoV-2, realizado nas 72 horas antes da partida pelo método RT-PCR, com resultado negativo, ou fazer o teste à chegada. Caso permaneçam na Região, deverão fazer novo teste seis dias após o primeiro.
Para acolher melhor e com mais segurança quem chega à nossa Região, estabelecemos convenções com laboratórios em território continental e na Região Autónoma da Madeira. Trata-se de um esforço muito grande da Região e dos profissionais do Serviço Regional de Saúde, que trabalham dia e noite nos aeroportos e nos laboratórios, para garantir o processo administrativo, a colheita, a análise laboratorial e a comunicação do resultado.
Abordando um outro tema, fale-nos um pouco mais do seu percurso e de como a sua capacidade de liderança, aliada a outros fatores, foi fundamental, por exemplo, nesta luta.
Enquanto Secretária Regional da Saúde, com a tutela da Saúde e da Proteção Civil, a minha principal preocupação é garantir dois elementos fundamentais. Primeiro, que as unidades de saúde e os seus profissionais e os bombeiros dos Açores dispõem de recursos para lidar com um aumento do número de casos de Covid-19.
Segundo, que a prestação de cuidados urgentes ou inadiáveis e a vigilância da doença crónica não são descuradas. Por isso, procurei fazer um acompanhamento de proximidade, reunindo diariamente com os dirigentes e profissionais de hospitais, unidades de saúde de ilha e do Serviço Regional de Proteção Civil e Bombeiros dos Açores.
O que é para si ser um verdadeiro líder e gestor de pessoas? O diálogo e a capacidade de escutar são dois dos principais pilares para uma gestão positiva?
Liderar é manter a visão de conjunto, mesmo quando os problemas ameaçam enviesar a análise, é dar o exemplo, é manter um discurso confiante, é estar mais perto de quem está no terreno.
O diálogo e a capacidade de escutar são dois pilares essenciais, mas são também o mais difícil em momentos críticos. Por isso, optei por agendar reuniões sempre ao mesmo dia e à mesma hora. Assim, todos parávamos, ao mesmo tempo, para debater os acontecimentos do dia.
Acha que existe alguma diferença entre uma liderança feminina e uma masculina? Ou acredita que a liderança positiva não tem género?
A liderança positiva não tem género, tem pessoas. Não se aprende, pois não há receita. Cada líder tem o seu estilo de liderança, que resulta do seu desenvolvimento pessoal. Funcionará à escala da sua mundividência.
O que falta, na sua opinião, para que a igualdade de oportunidades seja cada vez mais uma realidade?
Circunscrevendo-me à nossa realidade, eu diria que as mulheres deveriam ser tão exigentes com os homens como são com elas próprias.
A terminar, o que podemos continuar a esperar da sua parte e qual a mensagem que gostaria de deixar ao universo feminino que dia após dia continua a mostrar a sua força?
Poderão esperar da minha parte, garantidamente, alegria no trabalho. Estou na Saúde para cuidar das pessoas, por isso, todos os dias são proveitosos. A minha mensagem para o universo feminino é: nunca desfaçam as malas. O mundo está cheio de desafios, na nossa rua ou no outro lado do planeta.