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O TRAÇO QUE NOS DEFINE…

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O TRAÇO QUE NOS DEFINE…

Por esta altura, há um ano, ainda no florescimento desta pandemia a minha carreira profissional na ULSM era, na verdade, algo perfeitamente normal para um enfermeiro apesar de ser no serviço de medicina intensiva e da sua normal exigência. Ora, passados uns meses, a normalidade era um estado precioso e pouco ou nada permanecia igual. Ainda durante os meses de março e abril no primeiro confronto com um sem fim de novas regras e alterações, naquilo que agora sabemos ser a face mais suave da pandemia, tive a oportunidade de soltar um pequeno talento e de transformar algumas imagens em desenhos nos fatos de proteção que os profissionais usavam. Nesta fase acho que qualquer rabisco impressionava os meus colegas, mas na verdade foram eles que me incentivaram para o que veio a seguir. Aquela ilusão do “tens muito jeito”. Ilusão ou não, a tradução instantânea foram uns bonecos no papel e umas brincadeiras em casa. É assim que surge a minha vontade de desenhar e usar a grafite como ponte para o desenho.
Aproveitei o embalo no meu ego dado pelos meus colegas, a paciência de quem partilha os meus dias e segui. Simples. Começa como normalmente começam os momentos que nos marcam, como uma brincadeira. Comprei lápis e fui acrescentado material à medida que a complexidade me levantava barreiras. A pesquisa normal na internet das técnicas que desconhecia, permitiu-me entrar numa área que basicamente desconhecia, o desenho realista. Sem formação de qualquer tipo nesta área, percebi rapidamente a surpresa que um desenho transmite. Foi assim que comecei um trabalho, desenhar todos os profissionais do serviço de medicina intensiva do Hospital Pedro Hispano, o meu serviço. À medida que fui avançando, apesar das dificuldades de acompanhar a chegada de novos profissionais, a evolução foi por demais evidente. O desenhar todos os dias durante meses a fio permitiu uma evolução na minha formação e da capacidade de captar traços e expressões característicos de cada um, e transformar isso num desenho. É sem dúvida uma boa sensação e foi assim, desenhando, que consegui transformar um período conturbado num momento de aprendizagem e adaptação pessoal.
Ao fim de alguns meses e ainda com o projeto SMI quase a acabar, ao fim de quase 90 desenhos de 90 colegas, a quem agradeço curvado, todos com máscara, simbolicamente, consigo perceber a alegria e o sorriso que um desenho proporciona a quem se vê retratado e que por breves instantes suaviza a exigência dos tempos que correm. É por eles todos e muitos outros que na verdade vai mesmo ficar tudo mais ou menos…