Início Atualidade “É crucial uma estratégia nacional para o aumento da natalidade”

“É crucial uma estratégia nacional para o aumento da natalidade”

0
“É crucial uma estratégia nacional para o aumento da natalidade”

A avaliação e o tratamento de situações clínicas de infertilidade conjugal fazem parte das preocupações médicas há mais de um século. Sendo   Cláudia Freitas Diretora do Centro de Medicina de Reprodução do Hospital Dr. Nélio Mendonça, como nos pode descrever a realidade que se vive atualmente em Portugal no que respeita à fertilidade?
Portugal é o país com uma das mais baixas taxas de natalidade da União Europeia. Trata-se de um problema complexo e são múltiplas as razões que conduzem a este facto: as condições socioeconómicas, a instabilidade das condições laborais e também o maior investimento por parte das mulheres na carreira profissional (por vontade/necessidade) protelando a idade em que os casais sentem ter as condições favoráveis à criação de um projeto de parentalidade.  Não sendo despiciendo também o atraso considerável, em relação a outros países desenvolvidos, no que respeita a medidas de proteção da maternidade/apoio à natalidade (período curto de licenças; insuficiente apoio aos tratamentos de infertilidade). É, pois, crucial uma estratégia nacional integrada e transversal (Saúde, Educação, Segurança Social) que vise a implementação de estratégias para o aumento da natalidade nacional.

É legítimo afirmar que a área da fertilidade está a mudar rapidamente e a importância da inovação a tornar-se cada vez mais evidente? Como tem vindo a ser a evolução ao longo dos tempos destes tratamentos?
Indubitavelmente é uma área com grande expansão quer ao nível do conhecimento científico, quer ao nível das técnicas de procriação medicamente assistida. A base será sempre a prevenção associada aos estilos de vida e a sensibilização para o impacto da idade na capacidade reprodutiva. Não obstante, a inovação nesta área permite ultrapassar muitos factores de infertilidade pela aplicação de novas tecnologias à medicina reprodutiva (avaliação em tempo real dos embriões, melhores técnicas de criopreservação de ovócitos e embriões, ampliação do estudo genético pré-implantatório).

Atravessamos mundialmente um período incerto provocado pela pandemia da COVID-19, cujas consequências têm sido devastadoras e em muitos casos irreversíveis. Passado todo este tempo, já é possível medir o real impacto da pandemia nos tratamentos de infertilidade?
Não temos ainda a visão do impacto social na sua plenitude, mas claramente houve uma diminuição quer na procura, mas sobretudo na oferta dos tratamentos de procriação medicamente assistida (PMA).  Segundo dados do Conselho Nacional de PMA, a maioria dos centros reduziu a atividade em 75% a 100% no ano transato no período de março a agosto, repercutindo-se em média em oito meses adicionais de tempo de espera e 2900 tratamentos adiados.

Tendo em conta a sua experiência, quais foram as principais dúvidas e preocupações dos pacientes que viram os seus tratamentos interrompidos nesta fase?
Sendo que 10% dos casais em idade reprodutiva poderão ter infertilidade e em média a maioria espera um ano para a realização de um tratamento de PMA, a resposta dos centros públicos é claramente insuficiente para as necessidades da nossa população. O contexto da infeção por SARS-CoV2 exacerbou ainda mais o período de espera, o que se torna devastador para os casais, pois um projeto muito desejado de repente torna-se ainda mais difícil de concretizar. Manifestaram também o receio pelo risco de infeção durante os tratamentos e principalmente durante a gestação.

Que recomendações daria a quem pensa iniciar um tratamento de infertilidade?
Procurar ajuda junto do seu médico assistente o mais cedo possível e  ter um estilo de vida saudável com evição de factores de risco como o tabagismo ou a obesidade.

Por fim, acredita que Portugal poderá continuar a afirmar-se na área da fertilidade? Como prevê que seja o futuro da mesma?
Claro que sim, temos um corpo clínico com sólida formação e tecnicamente diferenciado para realizar com qualidade os tratamentos de reprodução preconizados. O futuro esse, dependerá muito de como a estrutura governativa olhar nos próximos anos para o problema da natalidade e o afirmar como um desígnio de importância nacional e de relevância social, investindo nomeadamente nos centros de PMA e capacitando-os para uma resposta mais célere.