Início Atualidade “A metodologia BIM já não é totalmente desconhecida em Portugal”

“A metodologia BIM já não é totalmente desconhecida em Portugal”

0
“A metodologia BIM já não é totalmente desconhecida em Portugal”

Opinião de Rui Gavina, Partner e Digital Practice Manager da VN2R e Co-Fundador do Grupo Académico ISEPBIM

Com a necessidade de reestruturação dos espaços e infraestruturas para a criação de ambientes seguros e funcionais, tornou-se claro (para os mais desatentos) que o setor da construção não se limita ao seu lado visível e redutor. As responsabilidades do setor da construção transcendem em muito o seu processo construtivo e ambiente construído enquanto produto final. O contexto atual, demonstra que fatores como a adaptabilidade e versatilidade de espaços são cada vez mais relevantes na forma como pensamos concebemos e exploramos edifícios ou infraestruturas. Torna-se então notória a abrangência do setor da construção, o seu envolvimento em todo o ciclo de vida do edificado e a transição do foco da cadeia de valor do produto (ativo de construção) para o utilizador.

Para além de abrangente, o setor da construção tem apresentado uma complexidade crescente e de difícil gestão. As infraestruturas e espaços urbanos encontram-se cada vez mais interligados e interdependentes, constituindo um sistema complexo. A título de exemplo, a construção ou ampliação de um espaço comercial não pode negligenciar a necessidade de infraestruturas e outros serviços necessários para o seu bom funcionamento. Ao exposto, acresce ainda a interdependência do ambiente edificado com o sistema económico, social e meio ambiente, sendo notório que uma mudança em qualquer um destes sistemas terá repercussão nos restantes.

Todas estas interfaces e extenso espectro, tanto ao nível do conjunto de agentes envolvidos como no que diz respeito ao espaço temporal, exigem mecanismos que garantam não só o acesso a informação necessária no momento certo, como a existência de informação que possa ser automaticamente interpretada, utilizada, comunicada e correlacionada. Embora a tecnologia e digitalização sejam incontornáveis para atingir este fim, não são autossuficientes. A recolha e produção de dados digitais, sem estruturação, critério e contexto, impossibilita o seu uso enquanto fonte de informação. São necessários processos e regras que definam a organização destes dados, permitindo a sua partilha e interpretação inequívoca. O Building Information Modelling (BIM) apresenta-se como a metodologia de base para atingir estes objetivos.

O BIM é uma metodologia assente na desmaterialização de processos, permitindo a utilização colaborativa da representação digital de um ativo de construção para apoio aos processos na fase de projeto, construção e gestão operacional. O que diferencia o BIM do simples uso tecnológico para a digitalização é a existência de um conjunto de processos, normativas e guias que definem os requisitos de informação digital, a forma como esta é estruturada e classificada, assim como os métodos e procedimentos de produção colaborativa de informação. Pretende-se assim garantir tomadas de decisão mais ágeis e fundamentadas, sendo possível aferir as interdependências entre sistemas (económico, social, ambiental e dentro da própria edificação). O BIM permite que os ativos sejam descritos e caraterizados através de informação digital partilhada, eliminando erros de interpretação e comunicação, pela forma inequívoca como esta é classificada.

A metodologia BIM já não é totalmente desconhecida em Portugal, principalmente no setor privado, embora exista ainda um entendimento impreciso quanto ao que efetivamente representa. Por muitos, é ainda entendida como uma representação digital tridimensional de um edifício, sendo o principal objetivo a otimização dos processos de trabalho com o benefício de permitir uma visualização tridimensional. Por este motivo, o BIM é frequentemente descrito como uma evolução na produção de desenhos, pela transição do CADD (Computer Aided Design and Drafting) para a criação de modelos tridimensionais ricos em informação, a partir dos quais são extraídos esses mesmos desenhos com recurso a automatismos. Assim, é privilegiada a eficiência na obtenção dos mesmos resultados, fazendo do BIM uma atividade suplementar, quando se deveria pensar na eficácia, utilizando o BIM como metodologia intrínseca à criação de valor no setor da construção. Esta perceção redutora do BIM é motivada pelo ainda diminuto envolvimento por parte dos gestores do edificado e das entidades publicas, assim como pelas carências formativas dos profissionais do setor da construção neste âmbito.

No panorama internacional, Portugal não se encontra na linha da frente neste processo de transição digital do setor da construção, com o BIM como metodologia de base. É necessário um maior investimento público e sensibilização da sociedade em geral para esta problemática e para a relevância da integração e interdependência do ambiente construído com o sistema socioeconómico e meio ambiente. No entanto, existem várias iniciativas meritórias em Portugal que têm impulsionado a mudança, perspetivando um futuro promissor, nomeadamente a Plataforma Tecnológica Portuguesa da Construção (PTCP), o cluster AEC (Arquitectura, Engenharia e Construção), o BUILT CoLAB e a comissão técnica CT197, para a normalização BIM em Portugal.