“Vive-se um período de estagnação do setor por motivos ideológicos provenientes da estratégia do estado e da desinformação transmitida ao consumidor”

Luís Vasconcellos, Administrador da Plainwater Serviços SGPS e Presidente da Águas de Barcelos, de Paços de Ferreira e do Marco de Canaveses considera que existe desinformação do consumidor no que refere ao setor da água. Defende ainda a análise da dessalinização da água como forma de ultrapassar a sua escassez e o investimento no tratamento das águas residuais.

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Como analisa a atualidade do setor da água?
Atualmente vive-se um período de estagnação do setor por motivos ideológicos provenientes da estratégia do Estado e da desinformação transmitida ao consumidor. Continua-se a esconder a verdade e a criar uma história do “bicho papão” à volta das concessionárias.

A privatização ou municipalização é uma das várias questões à volta deste setor, concorda?
Exatamente. Em primeiro, não existem privatizações na área da água e do saneamento, existem sim contratos de exploração e construção por um período de tempo definido, logo não são eternos. Trata-se de contratos que foram objeto de escrutínio, a maior parte, por concursos internacionais onde as Câmaras (concedentes) definiram as regras dos mesmos. Estes contratos foram validados pelo Tribunal de Contas e são auditados anualmente pelo regulador. Não sei como pode existir maior transparência.
Nestes concursos eram solicitadas propostas de gestão/exploração e construção de redes para a cobertura de água e saneamento de x% da população, onde os concorrentes apresentavam uma estrutura e evolução do preço, bem como um plano de investimentos estimado para esse objetivo.

O preço da água é muitas vezes alvo de comparações entre municípios, qual a sua análise?
O custo a cobrar pelo fornecimento da água deve incluir o custo da água, o custo da manutenção, o custo do investimento, o custo da remodelação, o custo da renda ou contrapartida paga às câmaras e o rendimento da atividade. Esta é a fórmula que todos os operadores utilizam sejam eles privados, públicos, municipais, agregações ou outros que venham a inventar.
O problema não é o custo da água, mas sim como se cobra esse custo. As concessões só têm uma forma de cobrar, que é através do tarifário aplicado aos utentes/utilizadores do serviço, já as restantes, para além dos tarifários, têm os impostos diretos e indiretos e subsídios para cobrir as diferenças entre o custo e o tarifário. Como vê, é muito fácil dizer que as concessões têm o tarifário ao utente mais alto que as restantes, não explicam é tudo.
Não sou contra a subsidiação direta ou indireta, sou é contra a não informação dessa subsidiação e que a mesma seja incluída aquando da comparação.

Qual seria a solução para clarificar este assunto?
Todos os operadores deveriam ser obrigados a ter um registo contabilístico desta atividade separada das restantes. Assim, ficaria expressa a necessidade de fundos provenientes de outras origens que não o tarifário cobrado diretamente ao utente/utilizador. Tão simples quanto isto, ou seja, transparência.

A questão das perdas de água vai além da questão ambiental, qual o caminho efetuado pelas suas concessionárias e o que pensa que ainda pode ser feito?
Esse é um tema para o qual trabalhamos diariamente. Para um combate às perdas, o primeiro passo é conhecer as redes, setorizar e controlar os seus consumos. Parece fácil, mas demora tempo e é necessário um investimento, que dependendo da dimensão, pode ser elevado. É necessário ter uma equipa dedicada e responsável, como as minhas, para se ter ganho neste combate, mas é crucial ter sempre a consciência que o mesmo nunca acaba.

As questões ambientais e climáticas, nomeadamente os episódios de seca extrema que o nosso país já viveu, estão na ordem do dia. Como vê a evolução nacional e internacional?
Há uns anos, numa entrevista a uma revista da área, alertei para a necessidade de começarmos a analisar a dessalinização como forma de ultrapassarmos a falta de água no Centro e Sul do País, principalmente no Sul, mas de imediato levantaram questões contra a solução, levando-nos a perder vários anos.
A estratégia parte pela definição da localização dos grandes consumidores de água, não podemos permitir processos produtivos de grande consumo de água onde ela já é escassa, temos que incentivar o consumo de água reciclada localizando esses processos produtivos em áreas que possam facilmente aceder às mesmas. Temos ainda muito que investir no tratamento das águas residuais, de forma a manter as nossas massas de água. Tem que se definir uma estratégia nacional para as lamas, quer das ETA’s quer das ETAR’s. Ou seja, ainda há muito por fazer e já estamos atrasados.