Uma notícia que o Anemia Working Group Portugal (AWGP) há muito esperava, sobretudo tendo em conta a prevalência de anemia e ferropénia na população portuguesa. Enquanto se aguarda pela estratégia nacional, e a propósito do Dia da Anemia, que se assinala no dia 26 de novembro, João Mairos, presidente do AWGP, alerta para esta prevalência: “em Portugal, estima-se que cerca de 32% dos portugueses adultos sofrem de ferropénia e 20% de anemia”.
O maior grupo de risco são as mulheres em idade fértil, que pelas perdas hemáticas mensais, perdem ferro, sendo necessário a sua reposição. O principal sintoma é a fadiga, e em regra geral, este grupo de risco, por todas as responsabilidades laborais, familiares e domésticas, considera ser normal o sentimento de fadiga, pelo que é comum desvalorizarem este sintoma, e em consequência não procurarem ajuda clínica. Outro dos sintomas é a perda de cabelo e unhas quebradiças, que como sabemos, todas tendemos a procurar ajuda nos nossos cabeleireiros e manicures. Doentes com insuficiência cardíaca, insuficiência renal, grávidas e doentes oncológicos são também outros grupos de risco.
Apesar de confundidas por muitos, ferropénia e anemia são diferentes, ainda que partilhem uma ligação forte. “A ferropénia traduz a diminuição do ferro disponível no nosso organismo, para integrar a hemoglobina. Estando, por esta razão, reduzida a hemoglobina nos glóbulos vermelhos, estamos perante a existência de anemia”, refere o especialista, que dá conta das consequências de uma ferropénia por tratar. “Implica menor disponibilidade de captação de oxigénio pelos glóbulos vermelhos e menor disponibilidade de energia para as funções do organismo. Por isso, a ferropénia está associada globalmente a sensação de fadiga, de fraqueza, de dificuldade de concentração, por vezes pode ser confundida com estado depressivo. Na gravidez, está associada ao parto pré-termo, ao baixo peso ao nascer e a maior mortalidade peri-natal. Está também associada ao agravamento da condição clínica dos doentes com insuficiência cardíaca, insuficiência renal e doença oncológica.”
Motivos de sobra para lhe prestar atenção, mais ainda tendo em conta, como acredita o presidente do AWGP, a existência de uma falta de sensibilização da população para o tema. “É preocupação atual o nível de literacia em Saúde dos portugueses. As pessoas têm acesso ilimitado à informação, sobretudo através da internet, mas nem sempre estão capacitadas para diferenciar a credibilidade das fontes de informação e não entendem o peso relativo dos assuntos. Para isso, é necessário atuar nas escolas com programas de literacia, o que leva tempo.”
O tempo tem levado também à implementação em Portugal do Patient Blood Management (PBM) o qual está intimamente ligado ao tratamento da anemia. João Mairos explica que, de acordo com a Organização Mundial da Saúde, trata-se de “uma abordagem sistematizada, baseada em evidências e focalizada no doente, de forma a otimizar a gestão da transfusão, com o objetivo de garantir um tratamento eficaz e de qualidade, assegurando os melhores cuidados de saúde em termos de segurança e eficiência. Não sendo fácil de explicar o conceito, poder-se-á afirmar que consiste em considerar o sangue de cada um de nós como um tesouro único e tomar uma série de ações clínicas e organizacionais para o preservar como primeira prioridade, evitando o recurso à transfusão”.
No que diz respeito à anemia, e porque “os doentes que sofrem de anemia e/ou de ferropénia estão mais sujeitos ao risco transfusional, impera, pois, tratar a anemia, a ferropénia e as suas causas subjacentes, como uma prioridade para o doente, respeitando assim o conceito de PBM”.
Uma gestão com ganhos comprovados. “Aos importantíssimos ganhos clínicos obtidos com o PBM, surgem associados ganhos económicos muito significativos. Um programa de PBM implementado na Austrália, entre 2008 e 2014, gerou uma poupança ao sistema de saúde na ordem dos 18.5 milhões de dólares só no que respeita a produtos do sangue e globalmente na ordem dos 80 a 100 milhões de dólares. Em Portugal, as estimativas apontam para uma poupança de 67,7 milhões de euros num ano.”
Apesar disto, e de já existirem, no nosso país, programas a decorrer, “há ainda muito para fazer, sobretudo consciencializar, de forma eficaz, todos os atores envolvidos (onde se incluem os profissionais de saúde) para a necessidade de implementar o PBM”. Esta é, defende o especialista, “simultaneamente uma obrigação clínica, ética e económica”.
Para aumentar a informação e conhecimento sobre a anemia e ferropénia, o AWGP em colaboração com a Federação Portuguesa de Futebol, realiza no dia 26 de novembro, rastreios junto da Seleção Nacional A de futebol Feminino.