
Todos os dias pelo menos uma família recebe aquela notícia para que nunca ninguém é preparado. Uma experiência que toca a cerca de 400 famílias todos os anos, com ou sem Covid-19. Apesar da taxa de sobrevivência ser de mais de 80%, três em cada quatro sobreviventes vivem com sequelas físicas ou emocionais. E ao contrário do que acontece na maioria do cancro nos adultos, a prevenção praticamente não existe. É sim, importante que seja diagnosticado precocemente, pois aumenta a taxa de sucesso dos tratamentos. Pais e médicos devem estar sensibilizados para isto e alerta para possíveis sintomas para uma doença que ainda é a primeira causa de morte não acidental na idade pediátrica. Pouco se sabe acerca das causas e o tempo vai passado e continua-se a quase não investir em investigação nesta área. Esta é uma realidade que precisamos que mude para melhorar a qualidade de vida destas crianças e adolescentes durante e pós tratamento. Tendo em conta o número reduzido de casos de cada tipo de cancro pediátrico, a investigação precisa de ser organizada a nível internacional, para que a amostra seja significativa e para que mais rapidamente se consiga tirar conclusões. Portugal deve contribuir para a evolução do conhecimento da doença e da melhoria contínua nos cuidados prestados, com a vantagem de assim as nossas crianças terem mais cedo acesso a terapias inovadoras. Apesar da investigação ser um tema ao qual nos dedicamos, existem outras questões que são importantes ser lembradas neste dia. Como é possível definir estratégias e prioridades para o futuro se não conhecemos o presente? O registo oncológico pediátrico nacional precisa de ser atualizado rapidamente. Apesar de legalmente obrigatório desde 2017. Quando confrontados com o diagnóstico de cancro estes pais, e as crianças, veem o mundo desabar à sua volta. Muita informação para processar, muitas decisões que precisam de ser tomadas. Nenhum pai ou mãe está preparado para receber uma notícia destas. O mundo como o conheciam desaparece. De repente tudo muda. É preciso que toda a família se reajuste a esta nova fase que gostariam que fosse o mais perto do “normal”, o que nem sempre é possível. O trabalho, a escola, os irmãos, a vida do casal, os avós e outros elementos da família. Como organizar tudo isto? Existem também questões financeiras. Em muitos casos um dos elementos do casal pode ser obrigado a deixar de trabalhar, alguns com direito a uma licença de acompanhamento, mas mesmo os que podem usufruir dessa licença tem um tempo limitado. E a sobrecarga emocional e física para este elemento do casal que fica a acompanhar a criança? A atual legislação não permite que esta licença seja alternada com outro elemento ou no caso de terem outro filho doente não permite que os dois recorram a esta licença em simultâneo. A entidade patronal aqui pode ter um papel muito importante na flexibilização do trabalho e na vida destes pais. As alterações físicas, efeitos secundários dos tratamentos, como o cansaço, má disposição, a queda de cabelo, têm frequentemente implicações na rotina da criança ou adolescente, com consequências na sua autoestima ou na forma de se relacionar com os outros, amigos, namorados, ou mesmo com a própria família. O apoio psicológico e o apoio social, por vezes insuficiente, são fundamentais para a reorganização destas famílias. Esta é uma realidade que ninguém quer conhecer, mas que ninguém pode ficar indiferente.