“A União Europeia é fonte de Direito Nacional e assenta nos Valores da Democracia e do Primado da Lei”

Na atual conjuntura de guerra na Ucrânia, vemos colocados em causa os Direitos Fundamentais do Homem, a Liberdade, a Segurança e a Justiça. Importa, por isso, compreender aprofundadamente a complexidade da questão, bem como reconhecer a solidariedade que, felizmente, se faz sentir em Portugal no que à mesma diz respeito. Neste sentido, José Luís da Cruz Vilaça, atual Presidente da Associação Portuguesa do Direito da Energia (APDEN) e antigo Juiz do Tribunal de Justiça da União Europeia, e Paulo Sande, Advogado e antigo Diretor do Gabinete em Portugal do Parlamento Europeu, dão voz à matéria e expressam, em entrevista, a sua perspetiva e conhecimento.

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A Cruz Vilaça Advogados é uma marca de renome na área do Direito que visa responder eficazmente aos desafios transnacionais inerentes a este setor e à sua especialização. Tendo em conta a atual situação em que o mundo se encontra, de que forma pensam participar nesta dinâmica de apoio?
Somos, quase por definição, uma sociedade vocacionada para agir nesse mundo global, em permanente transformação. Contemplamos, na nossa intervenção, todas as jurisdições relevantes, a começar naturalmente pelo direito português, mas em permanente interação com o direito europeu, nosso principal fator diferenciador. E em razão da matéria, tratamos de assuntos, também por natureza de vocação global, como a concorrência, a energia, os direitos humanos, o digital, entre muitos outros. Tudo isto, finalmente, em estreita colaboração com escritórios e advogados amigos e parceiros, seja em Portugal seja em vários países, nomeadamente europeus.

A onda de solidariedade para com a Ucrânia estendeu-se a vários setores e também na advocacia os profissionais disponibilizaram-se para prestar assistência jurídica gratuita aos cidadãos ucranianos que se encontram em Portugal. De que forma é que este comportamento/atitude revela e bem, como o setor da Advocacia está comprometido em apoiar estas pessoas e a fazer parte da solução?
Discretamente, demos já um apoio concreto à justa causa ucraniana, através de uma contribuição financeira para uma organização idónea de apoio aos refugiados ucranianos. Além disso, colocámo-nos à disposição das autoridades daquele país para outro tipo de colaboração, que não cabe aqui revelar. Por essa razão também vimos com grande entusiasmo e esperança a reação de tantos dos nossos colegas, cujo âmbito de atuação é relevante para o apoio direito aos cidadãos ucranianos com necessidades em Portugal, reação essa bem reveladora da forma como a advocacia é – e deve sempre ser – um setor, e uma profissão, para quem as pessoas estão em primeiro lugar e são a prioridade, sempre e em qualquer circunstância. A vida, quase desde o princípio da organização social dos seres humanos, assenta em regras, primeiro comportamentais e sociais, depois normativas; os advogados são, e serão sempre, pela sua profissão e a responsabilidade que lhe é inerente, seus principais intérpretes, responsáveis primeiros por apoiar quem, no fundo, como eles também, são o cadinho essencial das nossas sociedades: as pessoas.

Direitos Fundamentais do Homem, Liberdade, Segurança e Justiça, algo que mais do que nunca, a todos diz respeito. De que forma a Cruz Vilaça Advogados está a encarar esta violação maciça dos direitos humanos de um povo Europeu que almeja viver livre e independente?
Trata-se indiscutivelmente de uma situação inaceitável sob praticamente todos os pontos de vista, para glosar o nome da vossa revista. E, na perspetiva da nossa sociedade, se de um lado está um país democrático, livre, não sem defeitos, mas a prosseguir no caminho da construção de uma sociedade baseada no primado do direito e da defesa dos direitos fundamentais, do outro emerge uma manifestação da mais antiga tradição autocrática da velha Europa, claramente não democrática, desrespeitadora da liberdade e dos direitos dos cidadãos, iliberal, que faz jus ao velho conceito do poder como afirmação de força e de supremacia: “might makes right”. Isso não é, ou pelo menos não devia ser aceitável em pleno século XXI, e ainda bem que o Ocidente reagiu da forma enérgica, rápida e solidária como o fez, sem deixar de agir com precaução para evitar uma escalada que levasse a uma guerra generalizada, quiçá com a utilização de armas nucleares.

O Conselho de Direitos Humanos da ONU aprovou uma resolução a favor da criação de uma comissão internacional de inquérito sobre as possíveis violações dos direitos humanos na Ucrânia na sequência da invasão russa. Em que medida esta resolução impactará a curto prazo – tendo em conta a urgência – a atuação da Rússia?
Dificilmente. O tempo da sua instalação, do lançamento e instrução do inquérito, ainda por cima num período de tanta instabilidade e desinformação, será, espera-se, suficiente para que a guerra termine ou, pelo menos, as hostilidades cessem. E se assim não for, qualquer conclusão que considere provadas as violações dificilmente será aceite pelas partes, e certamente será rejeitada pelo Presidente russo, tornando impossível qualquer tipo de resultado prático. Em todo o caso, é importante para o futuro, num tempo – ainda por descortinar – em que responsabilidades serão atribuídas e consequências retiradas por uma das maiores tragédias em solo europeu depois da 2ª guerra mundial.

Esta é uma marca que centra a sua prática nas áreas do Direito da União Europeia, da Concorrência e da Proteção dos Direitos Fundamentais. Em que medida o foco nestes setores constitui valor acrescentado a quem vos procura – agora mais do que nunca?
A União Europeia é fonte de direito nacional e assenta nos valores da democracia e do primado da lei – de que decorre aliás o princípio da condicionalidade aplicável à utilização dos fundos europeus – por valores tão decisivos como a democracia, o primado da lei, o respeito pelos direitos fundamentais e da independência da magistratura, a livre concorrência, a proteção de direitos básicos dos cidadãos. Codificadas na Carta Europeia dos Direitos Fundamentais estão normas essenciais de proteção dos direitos dos cidadãos, inclusive relativas a áreas novas, como os dados, o sigilo, o direito ao esquecimento, o ambiente e muitas outras. Os nossos clientes reconhecem a especificidade das nossas competências nessas matérias e temos o maior gosto em ajudá-los a encontrar as soluções mais eficazes e eficientes para dar resposta a problemas reais ou até para antecipar prejuízos e evitar consequências relacionadas com esse tipo de matérias.

Qual a importância para este escritório, de trabalhar uma área do Direito tão fundamental como o Direito da União Europeia?
Temos consciência de ser dos poucos, senão o único, escritório português que tem como matriz essencial a consideração de todo o acervo de legislação, jurisprudência e princípios europeus, para defesa dos nossos clientes, nacionais, europeus ou estrangeiros. Naturalmente, atuamos também, em muitos processos, exclusivamente na jurisdição nacional, mas a nossa mais-valia consiste justamente em enquadrar sempre as análises que fazemos das situações e problemas que nos são colocados – e as ilações delas decorrentes – num contexto alargado, em que o direito europeu, como responsável por mais de 85% da legislação nacional, está presente e é relevante. As matérias em que a nossa experimentadíssima equipa de profissionais atua em defesa dos nossos clientes podem ir de um problema individual de um cliente que reclama o ressarcimento de um prejuízo por responsabilidade de uma instituição ou de um Estado até a processos complexos do mundo do direito da concorrência – em todos os casos, consideramos devidamente a já referida interação entre os dispositivos legislativos e jurisprudenciais aplicáveis e pertinentes. É uma realidade fascinante, que só nesse cotejo e nessa relação permitem determinar com a maior precisão aquilo que deve ser prosseguido para defesa dos interesses dos nossos clientes.

Que marca pretendem perpetuar junto de quem vos procura, no mundo, e principalmente, num âmbito tão importante como o Direito? Quais os valores fundamentais que defendem?
Num primeiro plano, Qualidade, Coesão, Ambição. A Qualidade da nossa equipa de advogados, consultores e colaboradores, com muitas dezenas de anos de experiência nas áreas da nossa competência. A Coesão de uma equipa que trabalha em sintonia, partilha por natureza e vocação opiniões e análises, age solidariamente no estudo e desenvolvimento dos processos que lhe são confiados. Uma equipa que mistura jovens e menos jovens, mulheres e homens (bastante mais mulheres que homens), experiência e entusiasmo. A Ambição de estar sempre à frente no conhecimento de todas as matérias, competências e saberes relevantes para o desempenho dos objetivos prosseguidos. De se atualizar em permanência, também na utilização das novas tecnologias, para agilizar e facilitar as tarefas prosseguidas com as mais recentes técnicas digitais e outras aplicadas ao exercício da advocacia. Num plano mais prático e técnico somos acessíveis – sempre disponíveis para os nossos clientes -, somos móveis – deslocando-nos onde precisam de nós, em Portugal de norte a sul e ilhas, na Europa, algures -, somos conectivos, sempre ligados e em permanente diálogo com quem connosco precisa e quer dialogar.

A terminar, com que olhar perspetivam o domínio da advocacia nos âmbitos dos Direitos Humanos e Direito da União Europeia, nos tempos que se avizinham?
A História recente da União Europeia, e, portanto, dos países que a constituem, é uma história de crises. Foi sempre assim ao longo do processo de integração europeia desde os idos de 50 do século passado. Mas os últimos anos têm sido férteis em situações difíceis, que interpelam (e ameaçam) a solidariedade e a coesão europeias e requerem respostas enérgicas e eficazes. Não raras vezes, essas crises constituíram mesmo um desafio existencial à própria continuidade do processo europeu. Apenas para dar alguns exemplos, recordamos a crise do subprime de 2008 e as suas repercussões na Europa. A crise da Ucrânia – Donbass e Crimeia – no rescaldo da tentativa de conclusão de um acordo de comércio livre aprofundado entre aquele país e a União Europeia. A crise dos refugiados, que em 2015 fez chegar à Europa mais de 1 milhão e 200 mil demandantes de asilo provenientes sobretudo da Síria e que tantos problemas de coesão provocaram (só a título de comparação, a guerra atual já provocou, em pouco mais de um mês, o êxodo de mais de 4 milhões! e a esta incomparavelmente superior crise a Europa respondeu com brio). A crise do Brexit, para muitos a anunciar a fragmentação da União. A Covid-19, a cuja ameaça essa mesma União respondeu com celeridade e em uníssono (relativo), uníssono esse muito mais claro na resposta agora dada ao ataque russo à Ucrânia. Em cada caso, o direito europeu – e, quase sempre, as questões relacionadas com os direitos humanos – estiveram na primeira linha das análises, das considerações e processos desencadeados a seu respeito ou para acudir à defesa dos interesses mais variados. Continuará a ser assim. Este é também um tempo em que a União Europeia pode, e na nossa opinião deve, responder de forma solidária e coesa à crise em curso, provavelmente a maior de todas elas pela sua natureza e dimensão. Novo direito será criado para reforçar a integração onde ela deve ser reforçada: em matéria de defesa, de recursos energéticos e do seu aproveitamento, de transição digital, de defesa dos direitos humanos, de reconfiguração do direito da concorrência, da política industrial e de saúde pública. A essa evolução do direito europeu, que depressa se tornará direito nacional, a Cruz Vilaça Advogados estará atenta, avaliando, estudando, analisando e aplicando. Tudo, sempre, para defesa dos interesses superiores dos nossos clientes.