Recentes Alterações ao Código dos Contratos Públicos

Marcelo Caetano, Presidente da Direção da ATAM , na entrevista com a Revista Pontos de Vista, deu-nos a sua perspetiva sobre as mais recentes atualizações ao Código dos Contratos Públicos.

329
Marcelo Caetano Delgado, Presidente da Direção da ATAM – Associação dos Trabalhadores da Administração Local

Foi publicado, no pretérito dia 7 de novembro de 2022, o Decreto-Lei n.º 78/2022, diploma que irá proceder:

– À 12.ª alteração do código dos contratos públicos;

– À 1.ª alteração à Lei n.º 30/2021, de 21 de maio que aprovou medidas especiais de contratação pública;

– À 1.ª alteração ao Decreto-Lei n.º 60/2018, de 3 de agosto, que procedeu à simplificação de procedimentos administrativos necessários à prossecução de atividades de investigação e desenvolvimento.

O diploma, em apreciação, entrou em vigor, no dia 2 de dezembro de 2022, sendo aplicável aos procedimentos de contratação pública que se iniciem após aquela data, bem como aos contratos celebrados ao abrigo desses procedimentos.

Fazendo um pequeno voo sobre as alterações introduzidas, pelo Decreto-Lei n.º 78/2022, de 7 de novembro, ao Código do Contratos Públicos, poder-se-á afirmar que as mesmas, em função da sua natureza e ou latitude, se projetam, quer ao nível da formação do contrato, quer ao nível da sua execução, sendo umas de natureza, manifestamente, procedimental ou formal, e outras de natureza mais substantiva.

Em termos, meramente, quantitativos, no âmbito da intervenção, deste novo diploma legal, com direta projeção no Código dos Contratos Públicos, o mesmo altera 16 artigos do código, adita dois novos artigos ao seu clausulado – Artigo 57-A – “documento demonstrativo da estrutura de custos do trabalho” – e artigo 419-A – “trabalhadores afetos à concessão” – e tem um efeito revogatório da alínea e), do nº 6, do seu artigo 42.º, em matéria de caderno de encargos.

Em traços gerais, poder-se-ão destacar, de forma muito sumária e não exaustiva, as seguintes alterações introduzidas, pelo Decreto-Lei n.º 78/2022, ao Código dos Contratos Públicos, a saber:

– Alterações ao regime dos critérios materiais que fundamentam a adoção de ajuste direto, independentemente do valor do contrato a celebrar;

– Aditamento de um novo fundamento autónomo de exclusão das propostas, no caso, as propostas cuja análise revele que desrespeitam manifestamente o objeto do contrato a celebrar;

– Previsão expressa – artigo 57.º-A – da possibilidade de a entidade adjudicante exigir, no convite ou no programa do procedimento, que as propostas sejam constituídas por um “documento” demonstrativo da estrutura de custo do trabalho necessário à execução do contrato a celebrar, nomeadamente, quando o mesmo respeite a setores em que o custo fixo do trabalho é determinante na formação dos preços.

Registe-se que os termos de elaboração do documento, em causa, são regulamentados por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas da alimentação pública e do trabalho.

– Clarificação da matéria relacionada com os contratos de acesso reservado, nos termos do artigo 54.º-A do código;

– Nova resposta em matéria de suprimento de candidaturas e de propostas e previsão de contraordenação grave para o incumprimento por parte dos concorrentes ou dos candidatos;

– Alteração ao regime dos trabalhos complementares e à noção substantiva de trabalhos complementares, sendo, no futuro, considerados trabalhos complementares aqueles cuja espécie ou quantidade não esteja prevista no contrato e cuja realização se revele necessária para a sua execução.

– Alterações cirúrgicas ao nível dos prazos de garantia para a correção de defeitos, no contrato de empreitadas de obras públicas (artigo 397.º) e, ainda, ao nível do prazo de garantia em relação aos bens fornecidos no contrato de aquisição de bens móveis.

Dever-se-á, ainda, destacar, com caráter manifestamente inovador, a consagração de um regime especial de empreitadas de conceção-construção, no âmbito das medidas especiais de contratação pública, com a introdução, na Lei n.º 30/2021, de 20 de maio, do artigo 2.º-A, sob a epígrafe, “Regime especial de empreitadas de conceção-construção”.

Na fase de preparação técnica, deste novo diploma legal, o Gabinete Jurídico da ATAM apresentou os seus contributos, sobre a introdução deste novo regime especial de empreitadas de conceção-construção, manifestando, em tal sede, as suas grandes reservas jurídicas e operacionais, sobre o mérito deste regime e sua sã convivência com a distribuição do risco do contrato de empreitadas de obras públicas e com o princípio da concorrência.

As inquietações legais manifestadas pela ATAM, em tempo oportuno, sobre esta matéria, foram, também, registadas no parecer técnico emitido, pelo Tribunal de Contas, sobre esta iniciativa legislativa.

Como disse, então, o Tribunal de Contas, sobre esta matéria, “a criação de mais um regime especial, sem qualquer horizonte temporal e apenas dependente da previsão e vontade da entidade adjudicante é, dificilmente, compaginável com as garantias de ampla concorrência, de ponderação de custo-benefício, em sede de contratação pública, e da boa prossecução do interesse público”.

A criação deste regime especial comporta, seguramente, vários riscos para os princípios da concorrência, da proporcionalidade e da transparência, tanto mais que o mesmo irá determinar, à partida, uma alteração ao mercado do projeto de obras públicas, desviando o seu foco das empresas projetistas e colocando-o na esfera de intervenção dos empreiteiros, com fundamento, diz-se, agora, na criação de medidas de aceleração e simplificação procedimental.