Olho Seco: uma realidade cada vez mais presente na população mundial

“A doença do olho seco tem vindo a tornar-se uma queixa cada vez mais comum, e é importante que a sociedade esteja consciente dos efeitos que esta condição ocular pode ter na qualidade de vida”, revela J. Salgado-Borges, Diretor Clínico da Clinsborges, Embaixador em Portugal do TFOS (Tear Film & Ocular Surface Society) e Membro da EUDES (European Dry Eye Society) - www.clinsborges.pt / www.salgadoborges.com um e dos maiores especialistas a nível nacional e mundial da patologia do Olho Seco. Saiba tudo sobre esta doença e como a prevenção é essencial.

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São várias as doenças oculares que podem surgir a qualquer altura, pondo em risco a saúde da visão. Fazendo uma análise ao problema do Olho Seco, acredita que esta é uma das doenças mais silenciosas e frequentes da atualidade? Por que motivo?
Sim, é um facto. A doença do olho seco pode-se considerar que pertence a essa categoria e há várias razões para isso:
1. Sintomas subtis: Os sintomas da doença do olho seco, como a sensação de areia no olho ou a visão embaciada, podem ser leves e fáceis de ignorar. Além disso, muitas pessoas não associam esses sintomas a uma doença ocular.
2. Ausência de dor: A doença do olho seco é geralmente indolor, o que significa que as pessoas podem viver com os sintomas por anos sem saber que têm um problema ocular.
3. Fatores de risco comuns: Muitos dos fatores de risco para a doença do olho seco, como a idade avançada, a exposição prolongada aos ecrãs e a utilização de lentes de contacto, são comuns na sociedade moderna.
4. Falta de conscientização: A doença do olho seco ainda não é amplamente compreendida ou divulgada, e muitas pessoas não estão cientes da sua existência ou da sua gravidade.
Neste contexto, a combinação de sintomas subtis, ausência de dor, fatores de risco comuns e falta de conscientização pode classificar a doença do olho seco como uma das doenças oculares mais frequentes e silenciosas da atualidade.

A verdade é que o tema do Olho Seco adquire uma real importância quando percebemos que é uma das queixas mais comuns entre as pessoas. Considera que, atualmente, a sociedade olha para esta condição consciente de que pode, efetivamente, prejudicar a sua qualidade de vida? Como evoluiu, na sua opinião, o debate e a importância desta questão?
A doença do olho seco tem vindo a tornar-se uma queixa cada vez mais comum, e é importante que a sociedade esteja consciente dos efeitos que esta condição ocular pode ter na qualidade de vida. Atualmente cerca 40-50% dos doentes que recorrem a uma consulta de oftalmologia apresentam sinais e/ou sintomas atribuídos ao Olho Seco.
Nos últimos anos, houve uma crescente conscientização sobre a doença do olho seco, e enquanto Embaixador em Portugal na Tear Film and Ocular Surface Society (TFOS) e membro da Sociedade Europeia de Olho Seco (EUDES), posso afirmar que está a ser discutido cada vez com mais frequência no meio médico e na sociedade em geral. Isso acontece devido ao aumento da prevalência da doença e às mudanças no estilo de vida que podem contribuir rapidamente para o seu crescimento.
Além disso, a pesquisa e o desenvolvimento de novos tratamentos e terapias para a doença do olho seco têm ajudado a captar a atenção para a importância desta entidade.
De um modo geral, acho que a doença do olho seco está a ser observada com maior importância na sociedade atual, e espero que essa tendência continue, para que as pessoas possam tomar medidas para proteger a sua saúde ocular e prevenir ou tratar a doença do olho seco de forma eficaz

O Olho Seco não é um mito, mas sim uma questão de saúde pública, e que pode ser detetado a partir de diversos sinais. Quais diria que são os primeiros sinais de alerta e que fatores de risco estão aqui associados?
Verdade! De modo nenhum podemos considerar o olho seco um mito, é uma condição real que afeta a qualidade de vida de imensas pessoas.

Alguns dos primeiros sinais para que se deve estar em alerta são:
– Sensação de olhos secos, ardência ou com areia;
– Dificuldade em manter os olhos abertos por períodos prolongados;
– Olhos vermelhos ou irritados;
– Sensação de corpo estranho no olho;
– Visão embaciada ou enevoada;

Alguns dos fatores de risco associados ao olho seco são:
– Idade: o risco aumenta com a idade;
– Exposição prolongada aos ecrãs;
– Alergias;
– Utilização prolongada e/ou inadequada das lentes de contacto;
– Alterações hormonais na mulher, como por exemplo na gravidez e menopausa, terapia de reposição hormonal (TSH) ou uso de medicamentos anticoncecionais;
– Alguns medicamentos, como antidepressivos, anti-histamínicos e medicamentos para pressão arterial;
– Algumas doenças, como diabetes, lúpus e artrite reumatoide;
– Fatores ambientais, tais como: o vento, baixa humidade, ar condicionado, exposição solar, fumo, químicos ou calor;
Qualquer sintoma acima referido é motivo para se dirigir a um oftalmologista para que este possa realizar o diagnóstico e fornecer um tratamento adequado, não permitindo que a doença ocular se agrave.

Face aos sucessivos avanços tecnológicos, existem hoje novas armas terapêuticas e soluções inovadoras que permitem tratar esta condição de forma mais eficaz. Que opções de tratamento existem hoje, graças à tecnologia?
Sim, graças aos avanços tecnológicos e investigação, existem atualmente várias opções de tratamento para os diferentes estádios da Síndrome de Olho Seco.
Primeiramente, em quase todas as situações é recomendado a utilização de colírios, preferencialmente sem conservantes. Se este tratamento não proporcionar melhorias, pode ser necessário recorrer a anti-inflamatórios para conseguir alcançar maior conforto na evolução do olho seco.
Além disso, há outros tratamentos recentes e eficazes, tais como a Luz Pulsada (IPL) e o Plasma Rico em Plaquetas (Endoret), tratamentos que temos disponíveis no nosso Centro Integrado de Olho Seco (CIOS), localizado no Porto.
O tratamento ideal para a doença do olho seco depende de uma série de fatores, incluindo a causa subjacente, a gravidade dos sintomas e outras condições médicas. Por isso, é importante consultar um oftalmologista.

Falar do impacto positivo da inovação e da tecnologia é transversal a todas as áreas – e a da Visão não é exceção. Considera que a inovação anda lado a lado com as vitórias no combate ao problema do Olho Seco? O que tem vindo a mudar?
Sim, a inovação e a tecnologia têm desempenhado um papel importante no combate ao problema do Olho Seco. Nos últimos anos, tem havido uma série de avanços significativos em tecnologias e terapias para ajudar a tratar e gerir esta condição de forma mais eficaz. Algumas das mudanças mais significativas até à data são:
Melhoria da qualidade das lágrimas artificiais: as lágrimas artificiais disponíveis hoje no mercado são muito mais eficazes e semelhantes às lágrimas naturais do que as disponíveis no passado. Isso significa que os pacientes podem obter um alívio mais rápido e duradouro dos sintomas do olho seco. O tipo de olho seco diagnosticado é igualmente fundamental para a escolha da lágrima artificial a ser prescrita.
Novos equipamentos de diagnóstico: a tecnologia tem permitido aos fabricantes desenvolver novos equipamentos com imagens de alta resolução e técnicas de análise de imagem avançadas como é o caso do Keratograph 5M, um equipamento que dispomos no CIOS e permite uma melhor visualização e avaliação das glândulas de Meibômio e da superfície ocular, ajudando a identificar a causa subjacente do Olho Seco em pacientes individuais.
Desenvolvimento de novas terapias: a tecnologia permitiu aos cientistas desenvolver novas terapias, como o é o caso da Luz Intensa Pulsada (IPL), que ajuda a estimular a produção e qualidade das lágrimas através da aplicação de pulsos curtos de luz intensa sobre a superfície ocular. A luz emitida pela IPL tem ainda um efeito anti-inflamatório e estimula a regeneração de colágeno presente na superfície ocular.
De um modo geral, a tecnologia e investigação têm sido um aliado valioso na luta contra esta doença ocular e, tem permitido ter uma abordagem ainda mais personalizada e eficaz no tratamento. Com os avanços em curso na área, é provável que vejamos ainda mais soluções inovadoras a surgir no futuro.

Numa era em que vivemos, na grande maioria, agarrados a ecrãs, como perspetiva os desafios que ditarão o futuro dos problemas oculares, nomeadamente o Olho Seco, caso a população não reconheça a importância do combate ao mesmo?
De facto, a exposição prolongada aos ecrãs é uma das principais causas de Olho Seco e pode agravar a sua condição em pessoas que já sofrem desta doença. Se a população não reconhecer a importância de combater o problema, espera-se que a prevalência do Olho Seco aumente e se torne um dos problemas de saúde visual mais prevalentes no futuro. Além disso, com a continuação do uso crescente de tecnologias digitais, é bem provável que surjam novos problemas oculares relacionados com a exposição aos ecrãs, tornando ainda mais importante a prevenção e o tratamento eficaz do Olho Seco.
Assim sendo, é importante que as pessoas compreendam a importância de cuidar da sua visão e evitem o uso excessivo dos aparelhos digitais, praticando hábitos de prevenção, como fazer pausas regulares quando se utilizam regularmente os aparelhos digitais, beber imensa água, praticar uma dieta saudável, usar lágrimas artificiais e sobretudo ter um plano de consultas anuais com um médico oftalmologista. A educação e conscientização sobre esta questão é fundamental para garantir que as pessoas possam proteger a sua visão e viver de forma saudável e confortável no futuro.

Dedicou toda a sua vida ao estudo das doenças oculares, enquanto médico e cirurgião oftalmologista. Olhando para o âmbito da inovação e investigação da área, considera que é imprescindível que se continue a traçar um caminho de vanguarda? Como se encontra esta realidade em Portugal?
Portugal tem acompanhado, tanto ao nível da investigação como nos avanços do diagnóstico e tratamento das doenças oculares, o que de melhor se faz nos países mais desenvolvidos. Tanto no âmbito da oftalmologia médica como cirúrgica e desde a patologia da córnea, retina ou glaucoma, estamos ao nível dos melhores.
Na minha opinião é fundamental que esta performance se perpetue e que os oftalmologistas portugueses continuem a ser reconhecidos e a liderar projetos inovadores e de vanguarda, não só entre nós como no estrangeiro. Só assim será possível continuar a ser apontados como profissionais de excelência e líderes de opinião a nível mundial.
No que diz respeito ao Olho Seco acho que não é ainda reconhecido ainda pela comunidade oftalmológica nacional como uma das entidades mais frequentes e incapacitantes. Diante dessa situação, em meados de 2018 inauguramos o primeiro Centro Integrado de Olho Seco em Portugal, para preencher essa lacuna e atender melhor às necessidades dos pacientes com essa condição através de uma abordagem global e integral. Pensamos que este é o caminho a seguir.