A conclusão resulta de uma reflexão promovida pelo Nova SBE Westmont Institute of Tourism & Hospitality que reuniu empresas do setor, entidades governamentais e associações empresariais para identificar instrumentos e soluções práticas para enfrentar os desafios da sustentabilidade no setor do turismo em Portugal.
O relatório, que analisa quatro áreas-chave – Empresas Sustentáveis, Empresas de Turismo Sustentável, Portugal como Destino de Turismo Sustentável e Sustentabilidade do Turismo em Portugal – aponta 17 recomendações para ajudar as empresas do setor do turismo a identificar riscos e oportunidades no campo da sustentabilidade.
No pilar Empresas Sustentáveis, o professor Rodrigo Tavares identifica a dimensão das empresas do setor (99,9% do tecido corporativo português é composto por PME’s), o desconhecimento generalizado sobre as práticas de sustentabilidade corporativa (restritiva e geralmente apenas centrada em certificações, rótulos, requisitos legais e prémios) e os custos associados à transformação como os maiores desafios que as empresas do setor enfrentam para melhorar as suas credenciais em sustentabilidade. Uma vez que atualmente os níveis de qualificação no setor são ainda muito baixos, o professor destaca a literacia em sustentabilidade como uma das principais recomendações. O investimento em formação deve ser assumido, não só por empresas e organizações (que devem investir em cursos sobre sustentabilidade corporativa ou finanças sustentáveis, já disponíveis no mercado) mas também pelos organismos públicos, nomeadamente, a Academia Digital do Turismo de Portugal (que deveria alargar consideravelmente a sua oferta formativa no domínio da sustentabilidade).
A par da literacia em sustentabilidade, o presente relatório destaca ainda a importância da integração da sustentabilidade na estratégia de financiamento das empresas. Uma vez que, em Portugal, a dívida sustentável atinge um volume total de cerca de 9,3 mil milhões de euros e que existem disponíveis no mercado nacional linhas de crédito específicas (sustainability linked-loans, sustainability linked-bonds, green bonds, sustainability bonds ou social bonds) as empresas podem beneficiar de operações com condições diferenciadas relativamente a produtos mais tradicionais.
No pilar Empresas de Turismo Sustentável, ou seja, aquelas que para além das suas dinâmicas internas integram também a sustentabilidade nos seus produtos e serviços, foi a componente financeira que se destacou com o principal desafio: quais as reais vantagens financeiras e económicas de se enveredar pelo turismo sustentável? Quais os incentivos públicos e privados que existem para ajudar as empresas portuguesas a fazer as transformações necessárias? Como dosear os investimentos financeiros necessários à transição para o turismo sustentável e a necessidade de assegurar receitas a curto prazo?
Atendendo a que, até 2026, é expetável que o mercado global do turismo sustentável cresça, a uma média de 12,7% ao ano, e que é também crescente a importância que os viajantes expressam em viajar de forma mais sustentável no futuro, o relatório recomenda que empresas e destinos turísticos devem incorporar a sustentabilidade nas suas operações, produtos e serviços, aproveitando linhas públicas de apoio regulares na área da sustentabilidade, que serão impulsionadas pelo Plano de Recuperação e Resiliência e pelo Portugal 2030. Ainda neste pilar, a monitorização e análise de dados é apontada como fator-chave: a recolha e monitorização dos indicadores mais comuns no setor do turismo – consumo de eletricidade e energia em quilowatts-hora (kWh) por metro quadrado de espaço atendido; consumo de água em litros ou metros cúbicos (m3) por hóspede por noite; produção de resíduos (kg por hóspede por noite e/ou litros por hóspede por noite) – deverá juntar-se à medição das emissões de gases do efeito estufa (GEE) devendo, todos estes registos ser disponibilizados publicamente a clientes, fornecedores, acionistas. Por último, o professor salienta ainda a importância da atuação do Turismo de Portugal que, apesar de disponibilizar várias iniciativas para apoio do setor na área da sustentabilidade – Empresas Turismo 360º, Guia de Boas Práticas para uma Economia Circular no Alojamento Turístico ou Guia Neutralidade Carbónica nos Empreendimentos Turístico – deveria dar uma atenção concreta aos atributos da sustentabilidade e disponibilizar toda esta informação num website dedicado.
No que se refere ao pilar Portugal como destino de turismo sustentável e apesar de Portugal se afirmar, no plano nacional e internacional, como um destino de turismo sustentável os dados divulgados pelo Environmental Performance Index de 2022 da Universidade de Yale, colocam Portugal apenas no 48º lugar em 180 países identificando também que a trajetória de descarbonização está atrasada. “Portugal está posicionado em 19º na categoria relativa à emissão de gases com efeito de estufa (em 63 países). Para o seu turismo ser sustentável, Portugal tem de ser sustentável. É necessária uma visão holística e estratégica de país”, refere o investigador ao destacar o principal desafio neste pilar.
Também aqui, as recomendações recaem sobre uma atuação mais ativa do Turismo de Portugal (através por exemplo do lançamento de iniciativas nacionais e de larga-escala de descarbonização do setor que levassem cada empresa e empreendimento turístico a comprometer-se a reduzir a sua pegada carbónica, do desenvolvimento de uma calculadora de carbono específica e do lançamento de um selo nacional de certificação de empreendimentos turísticos reconhecidos pelas suas práticas em sustentabilidade). Por último, o professor defende a atualização do quadro regulatório português que estabelece o sistema de classificação de estabelecimentos hoteleiros, de aldeamentos turísticos e de apartamentos turísticos (número de estrelas). Atualmente, os requisitos associados à sustentabilidade são opcionais e referem-se apenas à integração de sistemas que promovam o consumo eficiente de água nos equipamentos interiores e exteriores ou de sistemas de contratação e compras que promovam a inclusão de critérios ambientais nos contratos e fornecimentos (compras ecológicas). “O sistema de classificação deve ser reformulado para integrar critérios de sustentabilidade como requisitos obrigatórios. Esses critérios deveriam ser periodicamente revistos em função do desempenho de sustentabilidade do próprio setor”.
A Sustentabilidade do Turismo em Portugal, o último pilar em análise no presente relatório, apresenta o overtourism (número excessivo de visitas turísticas a um destino ou atração popular, resultando em danos no meio ambiente local e também nas populações mais pobres, afetando a qualidade de vida dos moradores) como o maior desafio do setor.
Em 2021, o consumo turístico no território económico foi de 21,3 mil milhões de euros, representando 10,1% do total do PIB e uma subida de 1,7 p.p. face ao peso do turismo na economia nacional em 2020, quando ascendia a 8,4% do PIB (15,3% em 2019) colocando Portugal como o 5º país onde é mais forte a contribuição do turismo para o PIB. Dentro deste âmbito, o professor defende que as instituições públicas e governamentais, regiões de turismo e municípios deveriam estimular um debate rigoroso e científico sobre a gestão sustentável do turismo em Portugal – identificando potenciais limites à atividade turística no país, desenvolvendo estudos e metodologias de avaliação (impacto do turismo nos territórios) e monitorização e avaliação (capacidade de carga nos destinos turísticos, com detalhe de áreas protegidas e urbanas mais densamente ocupadas) – e as empresas do setor deveriam a fomentar a utilização de ferramentas tecnológicas e start-ups nas suas áreas de negócio para melhorar a eficiência dos seus serviços, aumento dessa forma a produtividade.