“O projeto HIFU MRg irá tratar muitos doentes com doença de Parkinson e melhorar em muito a sua qualidade de vida”

O Dia Mundial da Consciencialização da Doença de Parkinson, comemorado no dia 11 de abril, foi o ponto de partida da conversa da Revista Pontos de Vista com a Equipa da Unidade HIFU MRg, composta por Joana Alves da Costa, Radiologista e Coordenadora da Unidade HIFU MRg, Nuno Vila Chã e Rui Araújo, Neurologistas da Unidade HIFU MRg e Clara Chamadoira, Neurocirurgiã da Unidade HIFU MRg. Entre outros temas, na entrevista, imperou a importância do recente tratamento inovador, HIFU MRg, para doentes com tremor essencial, ou tremor provocado pelo Parkinson.

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No dia 11 de abril comemora-se o Dia Mundial da Consciencialização da Doença de Parkinson (DP), quão importante é assinalar esta data? E que tipo de iniciativas têm programadas para este dia?
Assinalar esse dia é de extrema importância para ajudar a população que vive com doença de Parkinson (DP). Do ponto de vista humano, promove melhor compreensão das dificuldades que estes doentes têm a nível pessoal e social, dando uma maior visibilidade às suas necessidades, amplificando informação sobre a doença e possíveis tratamentos dos sintomas disponíveis na atualidade. Do ponto de vista médico e científico, a comemoração deste dia, para além de fomentar a partilha de informação sobre a DP entre médicos de diferentes especialidades e outros profissionais de saúde, promove a união de esforços para a pesquisa científica, entre diferentes Unidades Hospitalares, Universidades e Organizações não lucrativas nacionais e internacionais. Do ponto de vista económico, esta consciencialização impulsiona iniciativas para juntar ou angariar recursos económicos necessários à pesquisa científica por exemplo de novas terapêuticas. Por fim do ponto de vista político, permite a sensibilização do SNS e seguradoras de Saúde para tratamentos inovadores que já existem, permitindo o acesso aos mesmos por um maior número de doentes. Para a celebração deste dia, a Hopca Saúde e a JCC Diagnostic Imaging organizaram o primeiro Simpósio de Neurologia da Unidade HIFU MRg, a decorrer nos dias 14 e 15 de abril, no Hospital São Francisco do Porto. É destinado a Neurologistas e outras especialidades médicas que tenham interesse em Doenças do Movimento, no intuito de partilhar a experiência da Unidade e sensibilizar os colegas para o Tratamento inovador não cirúrgico do tremor HIFU MRg, assim como abordar novas aplicações do tratamento para a rigidez muscular e bradicinesia (lentidão nos movimentos) nas pessoas com DP.

Que objetivos norteiam o trabalho diário da Hopca Saúde, no que toca à prevenção do Parkinson e respetiva prestação de cuidados aos doentes com esta doença?
Nos cuidados aos doentes com a DP desenvolvemos planos individualizados com o objetivo de melhorar a qualidade de vida, reduzir o impacto dos sintomas e promover a sua independência. No caso dos novos tratamentos da DP, fomos pioneiros em Portugal com o HIFU MRg que pensamos, no futuro, irá tratar muitos doentes com DP e melhorar em muito a sua qualidade de vida. No futuro, estamos a fazer investimentos para desenvolver uma nova estrutura moderna, junto às atuais instalações da Hopca Saúde no Porto, que vai oferecer fisioterapia, terapia ocupacional e neuropsicologia, para ajudar os doentes a lidar com os desafios físicos e cognitivos associados à DP.  Outro foco que vamos ter é na educação e treino para cuidadores dos doentes, para que possam ajudar os seus familiares a gerir da melhor forma a sua doença. É também nossa ambição desenvolver, futuramente, programas de pesquisa para ampliar a compreensão da doença, além da participação em estudos internacionais e de continuar a oferecer os tratamentos mais recentes e inovadores para o tratamento da DP. Temos procurado sensibilizar a população, através dos nossos canais de informação, sobre os fatores de risco associados à DP, como idade avançada, ou história familiar, assim como fornecer informações sobre hábitos de vida saudáveis, como exercício físico regular, alimentação equilibrada e sono adequado.

No ano passado, a Hopca Saúde lançou um tratamento único (HIFU MRg) para doentes com tremor essencial ou tremor provocado pelo Parkinson. Como é que surgiu esta ideia inovadora? E quão importante é este tratamento, para evitar o escalar da DP?
A ideia de trazer para Portugal esta tecnologia inovadora HIFU MRg surgiu através do CEO do grupo de Clínicas de Radiologia – JCC Diagnostic Imaging. O Dr. João Carlos Costa, médico Radiologista, fundador e CEO do grupo, sempre procurou ajudar os doentes permitindo o acesso da população às tecnologias mais inovadoras existentes no mercado, sendo de facto a Inovação um dos lemas do grupo. Com esse objetivo, juntou investidores constituindo a Hopca Saúde. Tal como todas as terapêuticas atuais, para a DP, este tratamento não retarda, nem interrompe a progressão da doença, mas pode melhorar de forma muito significativa os sintomas.

Este tratamento está disponível no Hospital da Venerável Ordem Terceira de São Francisco, graças a uma parceria entre o Hospital e o Grupo JCC Diagnostic Imaging, e já é feito em alguns países, como a Espanha, Inglaterra e Dinamarca. Mas, em quê que consiste este tratamento?
É um tratamento não cirúrgico, e sem radiação ionizante, que utiliza os ultrassons de alta energia focados para efetuar uma ablação muito controlada numa zona profunda do cérebro que no caso do tremor é um núcleo específico do tálamo. Na DP existem novos alvos terapêuticos para a rigidez muscular e bradicinesia, nomeadamente, o núcleo subtalámico e a região interna do globo pálido. Como qualquer tratamento ablativo, o objetivo é criar uma microlesão (milimétrica) no conjunto de neurónios que está a funcionar de forma descontrolada e anormal. O local preciso de ablação é determinado por Ressonância Magnética (RM), as coordenadas são inseridas na máquina HIFU e modificáveis se necessário, com alterações sub-milimétricas antes da primeira sonicação de tratamento. Todo o procedimento é realizado com o doente acordado, podendo observar-se o efeito do tratamento em tempo-real, e é sempre controlado por termometria, uma forma que nos permite saber exatamente qual é a temperatura no tecido cerebral. Para efetuar o tratamento é necessário rapar o cabelo, de forma a permitir que as ondas de ultrassom ultrapassem o crânio e cheguem ao alvo cerebral pretendido.

Quais diriam ser as mais-valias deste tratamento inovador? Nesse sentido, os efeitos são imediatos, logo após a realização da primeira sessão de tratamento?
A principal mais-valia é a capacidade de produzir termo-ablação de estruturas cerebrais profundas sem a necessidade de abertura do crânio, o que elimina a probabilidade de efeitos adversos relacionados à cirurgia, nomeadamente, anulando riscos de infeção e de eventual lesão de estruturas no trajeto cirúrgico. Desta forma, o leque de potenciais candidatos é ampliado. Sim, os efeitos são imediatos após uma única sessão de tratamento.

Há certos cuidados a ter no pós-operatório? Se sim, como é que têm contribuído para a formação de familiares ou cuidadores dos doentes que foram sujeitos a este tratamento?
O pós-operatório é excelente pelo facto de não existirem incisões cirúrgicas, e, portanto, não existem os riscos de infeção associados às mesmas. Nós preconizamos uma hospitalização mínima para descanso, meramente, preventiva: o doente entra na tarde da véspera do tratamento e tem alta na manhã seguinte ao tratamento, após RM cerebral de controlo. Em poucos dias, é expectável que possa retomar as suas atividades normais.

A quem aconselham a realização deste tratamento? Apenas a doentes que se encontram numa fase avançada da DP? Como é que é feita a seleção dos candidatos a este tratamento?
Este tratamento é aconselhado para tratar o tremor em pessoas com Tremor Essencial, ou com DP na sua forma tremor-dominante, nas quais o tremor é perturbador para a atividade de vida diária e resistente aos medicamentos orais. Não se aplica apenas nas fases avançadas da DP, até porque nestes casos o tremor pode ser uma manifestação precoce. O tratamento é realizado para o lado mais afetado, ou que incapacita mais a pessoa (normalmente o lado dominante), podendo ser repetido para o outro lado, posteriormente. De facto, muito recentemente o tratamento bilateral faseado por HIFU MRg com 9 meses de intervalo recebeu aprovação FDA. Na DP, existem novos alvos cerebrais onde se pode aplicar este tratamento, nomeadamente, para tratar a rigidez e bradicinesia. A seleção para o tratamento é feita por critérios clínicos, segundo escalas específicas de Neurologia em Consulta dedicada da Unidade, e por confirmação de ausência de contraindicação ao tratamento através de exames prévios de Radiologia. É realizada uma Tomodensitometria Computorizada (TC) cerebral para medição da densidade óssea do crânio e uma RM cerebral para excluir lesões que poderão ser uma contraindicação dependendo da sua localização.

Têm ideia de quantos doentes já foram sujeitos a este tipo de tratamento em Portugal? E qual tem sido o feedback dos doentes depois da realização do procedimento?
Neste momento, até à data somos os únicos em Portugal a disponibilizar este tratamento e já tratamos o tremor em 7 pessoas com Tremor Essencial. Iniciaremos em breve os tratamentos de sintomas em casos de DP. O feedback tem sido excelente. Os doentes recuperaram qualidade de vida, referindo que a independência nas suas atividades diárias foi a melhor conquista, conseguindo voltar a escrever, alimentar-se, ou beber de forma independente e em todos os casos tratados sem efeitos adversos associados.

Sabemos que a tecnologia presente no tratamento e o próprio procedimento são recentes, por isso que tipo de ações têm desenvolvido para divulgar este tratamento inovador, de forma a que chegue a um grande número de doentes? Por exemplo, a curto prazo será possível ter acesso a este tratamento em outra zona do país?
Temos procurado divulgar o tratamento, através dos nossos canais de informação, de entrevistas dadas a pedido da RTP e Porto Canal, assim como através dos sites e redes sociais das entidades clínicas e hospitalares envolvidas, nomeadamente, do grupo JCC Diagnostic Imaging, do Hospital Particular Grupo Saúde (parte integrante da Hopca Saúde) e do Hospital São Francisco do Porto, com o qual foi desenvolvida parceria. No futuro, pretendemos alargar o tratamento para tratar outros sintomas dos doentes com DP, para além do tremor: a bradicinesia e rigidez muscular. O alargamento a outras zonas do país não faz parte dos nossos projetos a médio prazo.

Por último, que mensagem ou conselhos gostariam de transmitir aos nossos leitores, no sentido de os alertar para os sintomas de Parkinson?
Atualmente, sabe-se que a DP é complexa e que tem múltiplos sintomas, para além dos que afetam os movimentos. O principal sintoma é a lentidão de movimentos, a dificuldade para iniciar um movimento, ou arrastar os pés ao caminhar, o que provoca desequilíbrios. Os outros sintomas são o tremor, que ocorre inicialmente nos membros e em repouso, a rigidez e a dificuldade em falar ou escrever. Normalmente, estes sintomas afetam mais um dos lados do corpo. Para além destes sintomas, a que chamamos motores, existem os sintomas não-motores iniciais da doença, como a depressão, obstipação, alteração do sono, alteração do olfato, dor ou fadiga.  A DP, geralmente, começa de forma insidiosa e pode ser difícil de diagnosticar nos estágios iniciais. Por este motivo, é muito importante o doente ser observado numa consulta especializada por um Neurologista que tenha experiência em doenças do movimento.