“O trabalho a que nos entregamos só não é tão importante quanto o recurso a que nos dedicamos”

No dia 1 de outubro celebra-se, em Portugal, o Dia Nacional da Água. Quanto ao tema, importa ouvir as Entidades que se dedicam a este recurso e, mais importante, o tentam preservar em atos tão simples como a consciencialização. Ouvimos, por isso, Nuno Campilho, Diretor Geral da ABMG, que em palavras claras, garante que a reflexão sobre a escassez deste bem essencial é urgente – e será sempre. Saiba tudo.

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Uma das missões da ABMG é ser reconhecida no setor como uma referência na gestão dos sistemas de abastecimento público de água potável e de saneamento de águas residuais. Lado a lado com a ética, a transparência o rigor e a fiabilidade, de que forma a marca tem vindo a cumprir com estes objetivos e a perpetuar um caminho de sucesso?
Acima de tudo, com muito trabalho, suportado pela competência internalizada das suas equipas de trabalho.
A ABMG é, ainda, uma organização pouco madura, decorrente da sua recente constituição (2020) e do facto de ter herdado dos serviços municipais entretanto agregados (Mira, Montemor-o-Velho e Soure), as infraestruturas, equipamentos e instalações que eram geridos pelos respetivos Municípios, num estado de conservação, manutenção e operabilidade que exigiu um esforço adicional de adaptação e de investimento para que os mesmos garantissem as melhores condições de serviço.
Estamos perante um cenário que ainda não atingiu o seu ponto ótimo de estabilização e ainda se encontra algo longe de estar consolidado, mas é esse o foco e é, também, esse foco, que nos permite estar abertos às novas tendências, à inovação que vai fazendo o seu caminho no setor, preparando-nos para um registo de resiliência que nos permita alcançar o desiderato a que nos propomos, de nos tornarmos a referência que assumimos na missão que encerra a prossecução da nossa atividade.

Além disso, a ABMG também se propôs, ao longo dos tempos, a aumentar a produção própria da água, a aumentar a qualidade da água, a assegurar a sustentabilidade ambiental e a diminuir as perdas. Quanto a estes objetivos, o que tem sido realizado?
Temos vindo a efetuar melhorias e requalificações nas captações de água pré-existentes e temos, no nosso Plano de Investimentos, a execução de mais captações, nos três municípios, que nos permitam caminhar para a total autonomização na utilização de água para consumo humano, o que ainda não se verifica.
Paralelamente, também é nosso propósito investir na construção de novos reservatórios, de maior dimensão, que permitam, não só aumentar a reserva estratégica de água, como contribuir para uma melhoria ao nível da continuidade e da perenidade no abastecimento de água às populações, evitando interrupções e variações de pressão, o que também tem impactos ao nível da qualidade da água.
A este propósito, importa notar que os dados relativos à qualidade da água que servimos, tem vindo, sucessivamente, a melhorar e a estabilizar, o que é visível pela sucessiva aprovação do Plano de Controlo e Qualidade da Água e pela renovação dos Título de Utilização de Recursos Hídricos, não só nas captações de água para consumo humano, como, também para as Estação de Tratamento de Águas Residuais, onde também temos vindo a fazer investimentos de monta, ao ponto de já termos concluído, em Montemor-o-Velho, uma ETAR com capacidade de produção, armazenamento e disponibilização de água residual tratada para reutilização.
No que concerne às perdas de água, para além de se tratar de um processo que nunca tem fim e cujos nossos propósitos ainda são embrionários – até pela elevada percentagem de Água não Faturada que persistimos em registar – o principal destaque vai para a constituição de Zonas de Monitorização e Controlo e para a instalação de caudalímetros intermédios e de fim de linha, com funções de registo e totalização, o que irá ser, certamente, um processo que nos irá permitir grandes avanços e conquistas nesta matéria. Mas não temos como não assumir, ainda, o nosso registo deficitário, a este momento.

O Dia Nacional da Água celebra-se, em Portugal, a 1 de outubro e é uma oportunidade para se refletir sobre a importância deste recurso. Dada a crescente preocupação com o fenómeno das alterações climáticas e o seu impacto na qualidade de vida humana, quão urgente e necessária é, atualmente, esta reflexão?
Esta reflexão é urgente atualmente… como já o era no passado e será, sempre, no futuro. Os recursos hídricos são, por norma, o parente pobre das políticas públicas ambientais em Portugal, e no mundo. Não há qualquer prioridade política, a nenhuma instância, que esteja a contribuir para alterar este cenário. O grito de alerta, vociferado pelas Entidades Gestoras e pelos seus responsáveis, teima em não ser ouvido, e, quando o for (se for), temo que seja demasiado tarde.
Pode ser que o próximo Encontro Nacional das Entidades Gestoras, organizado pela APDA, e que terá lugar em Gondomar, de 27 a 30 de novembro, oportunamente com o mote “Um Grito pela Água”, alerte consciências. No entanto, mesmo que o faça, receio que seja insuficiente, enquanto persistirmos em dedicar o nosso (que não o meu) esforço a outras temáticas menores (passe a imodéstia). Mas é o que temos e, enquanto vamos tendo (Água e Vida), siga.

A água, um bem precioso, essencial a todos os aspetos da vida no planeta terra, é um recurso cada vez mais escasso devido aos desafios ambientais que vivemos – e, por isso, é tempo de agir. A consciencialização é um dos primeiros passos a dar? Diria que Portugal é um país consciente no que concerne a esta problemática?
Muito pouco, para não dizer nada. Mal se começa a ter consciência do problema (como se ele não estivesse sempre presente e ciente), chove. E a chuva tudo leva… até os problemas. Mais palavras para quê? Desde que continue a chover… (o que é que importa que os ciclos hidrológicos sejam cada vez mais curtos e os períodos de seca cada vez mais recorrentes e prolongados? Há de chover… e como as pessoas que morrem com doenças derivadas da escassez e má qualidade da água estão mais distantes que a Ucrânia, who cares?).

A ABMG associou-se, recentemente, à campanha “Água é vida – não a desperdice”, um projeto do Grupo Águas de Portugal, da Agência Portuguesa do Ambiente e da Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos. O que visa esta campanha e em que medida é importante para a ABMG ser sua associada?
A ABMG associa-se e associar-se-á a toda e qualquer campanha que vise alertar consciências e demonstre realidades que são desconhecidas da maior parte dos cidadãos. Mesmo que possam, na prática, servir para pouco, estamos lá! Há pessoas que continuam a utilizar (diria, melhor, a desperdiçar) a água, como se ela fosse um recurso infinito. Só se preocupam com o que lhes custa…, mas não têm o mínimo de noção e preocupação com o que custa às Entidades Gestoras disponibilizarem essa mesma água, fruto dos avultados investimentos na captação, no tratamento, no transporte, na adução e na distribuição em baixa. De facto, a água cai do céu, mas, não é, propriamente, esta…

No dia Nacional da Água, é comum organizarem-se múltiplas iniciativas em Portugal. Além da campanha “Água é vida – não a desperdice”, que outras iniciativas serão realizadas pela empresa?
Com a escassez de água a afetar milhões de pessoas em todo o mundo, a ABMG aliou-se ao Exploratório – Centro Ciência Viva de Coimbra, no apoio da exposição que alerta miúdos e graúdos, cidadãos e entidades oficiais, educadores e investigadores, para a responsabilidade que cabe a todos nós no uso eficiente deste bem precioso que permite a vida na Terra: a água!
«Água – Uma exposição sem filtro», é uma exposição cativante e consciente que convida a experimentar e a descobrir múltiplas facetas da disponibilidade e uso da água. Desta forma, a ABMG não encontrou melhor forma de comemorar o Dia da Água do que proporcionar a todos os utilizadores da área de abrangência da Entidade Gestora a oportunidade de visitar esta exposição, oferecendo vouchers de desconto, para que possam ter contacto com esta realidade e com as dificuldades que todos nós passamos no que toca à temática da água.

Enquanto Diretor Geral da ABMG tem uma opinião preponderante sobre o uso mais eficiente da água, sobre o seu valor em todas as dimensões (sociais, ambientais e económicas) e, sobretudo, sobre o impacto que a mesma tem no futuro de todos nós. Assim, que palavras gostaria de deixar aos nossos leitores?
Consciência, respeito e solidariedade. O trabalho a que nos entregamos só não é tão importante quanto o recurso a que nos dedicamos. O simples e vital gesto de abrir uma torneira, de onde sai um dos mais preciosos (e vilipendiados) recursos da nossa vida, tem, por trás, um sem número de interações que são de uma complexidade tão grande, quanto a simplicidade desse gesto. Da próxima vez que o fizerem, não o façam tão inconscientemente quanto o fazem todos os dias, várias vezes por dia, e lembrem-se disso…