“O que mais interessa é escutar e observar as crianças na sua singularidade, individualidade e expressividade”

Em entrevista à Revista Pontos de Vista, Maria Edite Oliveira, Professora, Investigadora e Psicóloga Clínica, destaca a importância do desenvolvimento de competências na infância e ressalva o potencial do Neurofeedback como uma técnica terapêutica eficaz para a evolução cerebral e emocional das crianças. Conheça tudo sobre esta abordagem.

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Como Professora, Investigadora e Psicóloga Clínica, qual tem vindo a ser o seu papel relativamente ao tema do desenvolvimento de competências na infância para o crescimento pessoal e social das crianças?
O meu papel nesta faixa etária tem sido muito mais ao nível da sensibilização e formação de pais, educadores e professores para a importância do desenvolvimento de determinadas características no desenvolvimento da criança. Aspetos como a valorização e validação das competências individuais da criança, promovendo relações interpessoais diversificadas e a participação em atividades desportivas, culturais e sociais que a motivem e lhe permitam sentir-se capaz e satisfeita.
Por outro lado, é importante pensarmos na igualdade de oportunidades, através de uma educação de qualidade com acesso a direitos e oportunidades que permitam desenvolver, potenciar e maximizar as suas capacidades e talentos.

Sabemos que o Neurofeedback tem sido reconhecido como uma técnica eficaz no tratamento de diversas condições como a ansiedade, hiperatividade, défice de atenção, entre outras. Para melhor entender, de que técnica estamos a falar?
Trata-se de uma técnica terapêutica que pretende regular a atividade cerebral para melhorar o funcionamento cognitivo, emocional e comportamental. Através de censores colocados no couro cabeludo, conseguimos dar ao paciente a informação sobre a atividade elétrica em tempo real. Esta informação é traduzida em sinais visuais ou sonoros que o sujeito pode perceber e acompanhar. O que se pretende é que o paciente aprenda a modificar a sua atividade cerebral em resposta aos feedbacks fornecidos. O tratamento será sempre acompanhado por profissionais especializados e com equipamento adequado e ajustado a cada criança. Complementarmente, existem exercícios de regulação comportamental que serão propostos durante as sessões e fora delas.

Poderia explicar de que forma essa técnica influencia positivamente o desenvolvimento cerebral e emocional das crianças?
O Neurofeedback é frequentemente utilizado como parte do tratamento para uma variedade de condições, incluindo Perturbação de Défice de Atenção e Hiperatividade (PHDA), Perturbação do Espectro Autista (PEA), ansiedade, depressão, perturbações de sono, entre outros. Não obstante, o Neurofeedback não é uma cura instantânea e pode implicar várias sessões para alcançar resultados significativos. Para além de que terá sempre de ser utilizado em conjunto com outras formas de intervenção terapêutica, como por exemplo a terapia cognitivo-comportamental, medicação outras terapias consoante as necessidades do paciente.

Compreendendo a importância do Neurofeedback no contexto clínico infantil, como se pode garantir que a mesma seja adequadamente aplicada e adaptada às necessidades específicas das crianças?
A opção por um tratamento com Neurofeedback deve passar por uma análise e reflexão sobre a condição daquela criança e esta deve ser feita por profissionais devidamente qualificados. A taxa de eficácia nunca poderá ser garantida à partida, normalmente optamos pelo neurofeedback quando outras abordagens não estão a ter os resultados que nós esperaríamos, por exemplo a terapia cognitivo-comportamental, a medicação ou outras. Igualmente quando os pais não pretendem recorrer a técnicas invasivas ou medicamentosas. Em caso também, de intolerância da criança a certos medicamentos ou perante dificuldades em seguir um tratamento farmacológico consistente ou apresentando efeitos colaterais aos medicamentos. É importante que a criança esteja motivada para este tratamento, uma vez que as sessões são regulares e implicam trabalho de casa.

Como Psicóloga especializada, como avalia o impacto do Neurofeedback não só na redução dos sintomas, mas também na promoção de habilidades socioemocionais e no bem-estar geral das crianças?
O tratamento por Neurofeedback conciliado com outras técnicas poderá ter resultados muito positivos não só ao nível cognitivo como também em termos de relações interpessoais e competências socio emocionais, uma vez que promovendo maior autonomia da criança na regulação do seu comportamento e das suas emoções conseguirá ter maior responsabilidade, poder de decisão e de escolhas nas suas ações. Sentindo-se mais autónoma, mais capaz terá naturalmente maior bem-estar.

Considerando o contexto do Dia Mundial da Criança, acredita que seria benéfico expandir o foco desta data além das celebrações e lazer, incluindo também uma reflexão sobre a sua saúde física e mental? Diria que esta é uma lacuna atual na sociedade?
E porque o Amor pode transformar o mundo! Pensar a criança e celebrar a sua existência é sempre motivo de grande alegria, sobretudo numa sociedade tão envelhecida quanto a nossa. Refletir sobre a sua saúde física e mental é ter consciência de que a criança é um todo que necessita de ter asseguradas as necessidades básicas de sobrevivência, mas sobretudo de ser envolvida de amor e carinho, no seio dos quais deverá encontrar um caminho estruturante da sua personalidade, permitindo-lhe descobrir, desenvolver e potenciar o seu eu mais profundo e fazê-lo emergir na sua existência individual, proporcionando-lhe uma integração social prazerosa e repleta de bem-estar.

Por fim, como podemos envolver a comunidade educacional e os profissionais de saúde, incluindo Psicólogos Clínicos, para garantir que o Dia Mundial da Criança seja uma oportunidade não só para celebrar, mas também consciencializar e promover a importância da saúde infantil em todas as suas dimensões?
Todos os microssistemas nos quais a criança está envolvida podem celebrar o dia da criança através de palestras alusivas a temáticas específicas, realizando atividades ao ar livre e em contato com a natureza, atividades de criatividade. Promoção de jogos e brincadeiras em grupo, atividades culturais, entre outros. Todavia, o que mais interessa é escutare observar as crianças na sua singularidade, individualidade e expressividade!