Para começar, gostaríamos de conhecer mais aprofundadamente o seu percurso profissional até então. O que nos pode contar?
Tive a oportunidade de iniciar a minha carreira jurídica num estágio no departamento tributário da Cargill Agrícola S.A., uma empresa americana do agronegócio. Após 13 anos de dedicação ao contencioso tributário, decidi seguir um novo caminho em 2013.
Como profissional liberal, a minha missão sempre foi oferecer o mesmo nível de excelência que conheci ao trabalhar numa multinacional americana de grande dimensão.
Grandes empresas contratam grandes escritórios e a oportunidade de conhecer o trabalho de excelentes advogados foi um parâmetro decisivo na minha carreira. Já a atuar no meu próprio escritório, ampliei o meu escopo de atuação ao integrar as áreas do Direito Imobiliário, Família e Sucessões, garantindo um atendimento abrangente aos clientes.
Numa jornada pessoal em busca da minha ancestralidade, descobri as inúmeras vantagens da dupla nacionalidade brasileira e portuguesa. A minha primeira viagem a Portugal foi em 2018 para conhecer o local de nascimento do meu avô e, desde então, visito Portugal todos os anos, tanto em negócios como por sentimentos de forte ligação ao país.
Sabemos que, em 2019, ingressou na Ordem dos Advogados em Portugal, visando proteger os interesses da comunidade portuguesa no Brasil. Quais foram os principais desafios que enfrentou ao integrar o sistema jurídico português e como é que isso impactou a sua prática profissional, especialmente em relação ao atendimento de clientes brasileiros?
Sabemos que muitas das primeiras leis brasileiras foram adaptadas ou copiadas das legislações portuguesas. Na minha área de atuação atual, que é o Direito Civil, as normas a respeito de posse e propriedade, como usufruto, servidão e hipoteca, usucapião e responsabilidade civil ainda refletem a herança portuguesa.
Na questão processual, apesar das origens comuns em civil law, é verdade que os sistemas judiciais de Portugal e Brasil distanciaram-se em alguns aspetos. Por isso, atuar em Portugal exige estudo e dedicação antes de estabelecer uma estratégia jurídica para o cliente.
Por exemplo, atuei num inventário litigioso onde o falecido (com domicílio habitual em São Paulo) deixou bens imóveis no Brasil e em Portugal. No momento da partilha, a minha cliente (herdeira) demonstrou interesse em ficar com os imóveis de Portugal, enquanto a sua irmã preferiu os imóveis do Brasil. A solução imediata foi lavrar uma escritura de cessão de quinhões hereditários em Portugal conjuntamente com uma escritura de permuta de bens imóveis no Brasil, com foco na equivalência de valores, possibilitando assim uma partilha justa entre ambas as herdeiras.
A procura pela dupla nacionalidade tornou-se um aspeto importante no seu percurso profissional e pessoal. Quais são os principais benefícios que os descendentes de portugueses no Brasil podem obter ao adquirir a nacionalidade portuguesa?
Adquirir a nacionalidade portuguesa é um benefício que, além de possibilitar uma reconexão com a própria história, traz inúmeras oportunidades de estudo nos países da União Europeia.
Por exemplo, é possível aplicar para o Programa Erasmus, um programa de bolsas de mobilidade académica entre países da União Europeia, que abrange os níveis de graduação, mestrado e doutorado, permitindo aos alunos cursarem até dois semestres noutras universidades e ter uma experiência não só académica, mas também cultural.
Os nossos clientes relatam que a graduação tem um custo oito vezes menor para o aluno português, o que tem feito com que os pais se preocupem cada vez mais em entrar com os processos de nacionalidade portuguesa para os seus filhos, com foco no planeamento dos estudos.
Do ponto de vista do trabalho, é uma grande vantagem não precisar que uma empresa seja sponsor para o visto de trabalho. Além disso, a oportunidade de trabalhar em países como a Suíça cresce exponencialmente se tiver dupla nacionalidade.
Ainda sobre os interesses legais dos descendentes de portugueses no Brasil e em Portugal, quais são, na sua opinião, as principais vantagens do atendimento presencial em comparação com o online, especialmente para clientes que necessitam de orientação jurídica em questões transnacionais?
A relação entre advogado e cliente é fundamentalmente baseada na confiança e o atendimento presencial contribui para criar um ambiente de empatia e segurança na partilha de informações sensíveis e pessoais, essenciais para a construção de uma representação eficaz.
A experiência de enviar dinheiro, informações confidenciais e documentos pessoais para um advogado noutro continente pode ser bastante desconfortável, especialmente para os clientes mais conservadores.
É verdade que eu também faço atendimentos de forma remota, especialmente nos esclarecimentos iniciais, mas sempre que possível, prefiro receber os documentos originais das próprias mãos do cliente, acompanhado de um bom cafézinho.
A conexão humana é fundamental na Advocacia, onde a confiança e a empatia desempenham um papel crucial. Poderia partilhar um exemplo em que a interação presencial com o cliente fez uma diferença significativa na condução de um caso ou na resolução de um problema jurídico?
Houve um cliente que teve o pedido de nacionalidade negado pelo Consulado de Portugal, pois desconhecia que os filhos adotivos precisam de intervenção na justiça portuguesa.
Como foi preciso desarquivar o processo de adoção ocorrido no Brasil, na nossa reunião presencial ficou acordado que ele não receberia cópia desse processo, pois ainda não se sentia pronto para lidar com os detalhes dos acontecimentos passados. E a sua vontade foi respeitada, mantendo-se em sigilo tal documento.
Como personaliza o atendimento para responder às necessidades específicas dos clientes em ambos os países e quais são os principais desafios que enfrenta ao lidar com questões jurídicas complexas e burocráticas de duas jurisdições distintas?
Quando estou em Portugal, faço reuniões presenciais com os clientes que possuem demandas no Brasil. Discutimos juntos as próximas etapas e alinhamos expetativas no médio prazo.
Aqui, em São Paulo, ofereço serviços de pesquisas e obtenção de todas as certidões necessárias para instruir os processos, além de retificações quando necessário.
A depender da complexidade do caso, buscamos parcerias estratégicas para oferecer a melhor solução, seja em Portugal ou no Brasil.
Ao longo dos anos, tem expandido o seu escopo de atuação e estabelecido parcerias estratégicas para responder às necessidades dos clientes tanto no Brasil como em Portugal. Quais são as suas perspetivas futuras para o seu escritório e que novas áreas ou serviços planeia desenvolver para continuar a oferecer excelência e atendimento personalizado aos seus clientes transnacionais?
A minha perspetiva futura é conseguir passar mais tempo em Portugal, continuar a expandir as minhas áreas de atuação e fortalecer as parcerias estratégicas, tanto no Brasil quanto em Portugal, para garantir que os meus clientes tenham sempre o melhor atendimento, com soluções jurídicas eficientes e personalizadas.