A 10 de Outubro comemora-se o Dia Mundial da Saúde Mental e a Revista Pontos de Vista voltou à conversa com a nossa parceira Maria Edite de Oliveira, pofessora na Universidade Nova de Lisboa e Psicóloga Clínica, e que revelou um dos principais fatores que atualmente muito incide na saúde mental, o bullying! Vamos ao encontro do que a especialista considera como fundamental para o equilíbrio psicológico e mental das vítimas.
Como o bullying impacta a saúde mental das vítimas a curto e longo prazo?
O bullying foi descrito pela primeira vez em 1970 por Dan Olweus e é definido como um comportamento agressivo e intencional que ocorre repetidamente ao longo do tempo, envolvendo um desequilíbrio de poder real ou percebido. Neste sentido para ser considerado um comportamento de bullying tem de ser persistente, ter uma duração de pelo menos 6 meses, ser intencional e intimidatório. Assim, quanto mais precoce for o seu aparecimento tanto mais forte poderá ser o seu impacto na saúde mental do agredido, uma vez que vai gerar ou intensificar caraterísticas psicológicas na vítima, tais como, baixa autoestima, sentimentos de inferioridade e de incapacidade. Tendência ao isolamento, dificuldades nas relações sociais, ansiedade e depressão. Estas caraterísticas psicológicas, na ausência de acompanhamento psicológico vão persistir e ganhar dimensões que poderão comprometer a saúde mental a curto e longo prazo das vítimas.
Quais são os principais sinais que podem indicar que uma criança ou adolescente está sendo vítima de bullying?
Os sinais podem ser vários, para além dos descritos acima podem aparecer marcas físicas, no caso de haver agressões físicas ou alterações psicológicas como choro, tristeza, dificuldades de comunicar ou estabelecer contactos sociais, mas também académicas, desinvestimento escolar, desinteresse e desmotivação, falta de concentração, hiperatividade. Recusa de ir para a escola, medo e angústia. É importante perceber as mudanças de comportamento, nomeadamente atitudes comportamentais novas e diferentes das precedentes.
Na sua opinião, quais as formas mais eficazes de prevenção ao bullying nas escolas?
A melhor forma de prevenção do bullying e de outros comportamentos antissociais e agressivos é sempre pela sensibilização e prevenção. É importante insistir na literacia de toda a comunidade escolar, alunos, professores e colaboradores, uma vez que a escola é constituída por um conjunto de atores e só na interligação de todos pode haver um funcionamento que contribua para a construção de cidadãos felizes munidos de competências técnicas e científicas mas também pessoais, sociais, relacionais e éticas que lhes proporcionem um futuro estruturado e com propósito.
Quais são os maiores desafios enfrentados pelas instituições escolares ao abordar o bullying?
O bullying tem uma causalidade multifatorial, individual, familiar e social, essencialmente. assim sendo, é necessário um trabalho multifacetado baseado num modelo bioecológico que trabalhe nos quatro sistemas (micro, exo, meso e macrosistema) nos quais o aluno está inserido. Sendo a escola um microssistema muito importante na vida do aluno não é suficiente se não for coadunado e cruzado com os demais, é necessário trabalhar as famílias mas também a comunidade e a sociedade onde o sujeito está inserido. Portanto, estamos a falar de uma intervenção sistémica que tenha uma abordagem e incidência holística.
O bullying se manifesta de maneiras diferentes em ambientes físicos e digitais? Quais são as semelhanças e diferenças mais marcantes?
Neste caso falamos de bullying direto e indireto, tanto num como noutro caso têm de estar presentes as características mencionadas acima, sendo que o bullying físico implica danos e agressões físicas e neste sentido é necessário um contacto físico e presencial dos dois protagonistas, agressor e vítima. No bullying digital encontramos mais o bullying verbal ou psicológico, pois acontece numa plataforma virtual. Não obstante as consequências na vítima são semelhantes.
Como a família pode ajudar a prevenir e a lidar com o bullying?
A família, sendo o principal agente de socialização e estruturação da personalidade, deve sensibilizar a criança para o conhecimento e a prática de comportamentos socialmente ajustados e aceites. neste sentido, consciencializar as crianças para a consciência da existência de comportamentos sociais e antissociais e sua identificação. Na realidade, a fragilidade com a qual as famílias atuais se deparam em termos de estrutura é preditor de aparecimento deste tipo de comportamento, uma vez que uma das principais causas do bullying é o modelo de funcionamento familiar.
Que tipo de suporte psicológico é mais adequado para as vítimas de bullying?
Para uma vítima de bullying, mas igualmente para o agressor, é necessário perceber que tipo de estrutura psicológica está presente e promover uma ajuda psicológica que comtempla uma abordagem sistémica que trabalhe não só com o sujeito que está em sofrimento psicológico mas, igualmente, com os sistemas adjacentes da criança, adolescente ou adulto em questão.
O que é preciso mudar na sociedade para que o bullying seja tratado com mais seriedade?
A nível macrosistémico é necessário investir na promoção da saúde mental e prevenção da doença mental, proporcionar programas de desenvolvimento de competências socioemocionais e relacionais desde idades precoces, trabalhar as famílias e a comunidade. Urge quantificar do ponto de vista económico as consequências de taxas tão elevadas de doença mental e de comportamentos delinquentes existentes na nossa sociedade e concluir que investir nesta área desde muito cedo representa benefícios sociais e económicos consideráveis.
Qual o papel da Comunicação Social na consciencialização sobre os efeitos do bullying?
A comunicação social deve estar alinhada com as premissas acima descritas e investir em programas de literacia em saúde mental e promoção de bem-estar. Um investimento nesta área da saúde mental e do bem-estar deve ter uma abordagem top down, começar pelos decisores políticos e ser acompanhada por todos os canais e meios de comunicação.
Como o bullying entre adultos, muitas vezes negligenciado, afeta a saúde mental?
O bullying não detetado, reconhecido e denunciado, acarreta danos físicos, psicológicos e sociais em qualquer faixa etária. Na idade adulta está na maioria dos casos sediado no mundo laboral mas também familiar, tornando maioritariamente as vítimas reféns da sua situação económica ou familiar, várias vezes associado a situações de violência doméstica.