No próximo dia 28 de Novembro, realizar-se-á o Encontro NEUROARQUITETURA”, no Lumen Hotel Lisboa, que aborda este conceito que junto neurociência e arquitetura. A nossa parceira e Arquiteta Teresa Ribeiro, fala-nos desta nova abordagem e dá-nos o mote para os objetivos e desafios que este contexto traz à Sociedade em geral. Saiba mais!
Como o conceito de Neuroarquitetura combina neurociência e arquitetura para criar ambientes que influenciam positivamente a saúde mental e física dos seus utilizadores?
A Neuroarquitetura é uma disciplina científica que conjuga os campos da neurociência e da arquitetura, analisando as respostas humanas aos ambientes através da aplicação de tecnologias avançadas de investigação da neurociência. Estudos demonstram que aproximadamente 95% dos pensamentos, emoções e processos de aprendizagem emergem ao nível do inconsciente, enquanto apenas cerca de 5% ocorrem ao nível do consciente (Zaltman, 2003). Adicionalmente, o cérebro humano recebe cerca de 11 milhões de bits de informação por segundo proveniente dos nossos sentidos, mas apenas processa conscientemente 50 bits por segundo (Glimcher, 2010). A maior parte do processamento ocorre de forma inconsciente, o cérebro filtra e prioriza informações essenciais para a nossa sobrevivência e funcionamento. Essa disparidade entre o volume de dados recebidos e o que conseguimos processar conscientemente demonstra como as nossas perceções são limitadas e seletivas (Zaltman, 2003). Compreendendo a complexidade do funcionamento cerebral, sabemos que apenas através de um profundo conhecimento do ser humano adquirimos a capacidade de projetar de forma a corresponder aos desafios das atividades que exercemos, levando em conta as nossas origens, necessidades e evolução. O foco está na melhoria da qualidade de vida da sociedade como um todo. A Neuroarquitetura estuda dos efeitos que as diferentes características dos espaços têm na saúde e bem-estar humanos. Um exemplo pertinente é o design ativo, que se relaciona com a organização dos layouts, de forma a incentivar a movimentação e atividade física. Estudos indicam que a aprendizagem e a performance podem aumentar significativamente quando as atividades são realizadas em percursos que integram a componente de movimento (Gonzalez et al., 2010). O equilíbrio de estímulos integra uma parte importante para a saúde psíquica e bem-estar. Investigações comprovam que a exposição excessiva estímulos, sem períodos adequados de descompressão ou restauro cognitivo, podem levar a estados de stress crónico, cujas implicações podem se estender ao sono e, a longo prazo, contribuir para distúrbios como a depressão e o Burnout (Simmons & Strack, 2018). Os projetos de Arquitetura devem ter em conta as características de todos os utilizadores, bem como as atividades a serem exercidas em determinados locais, para que possam proporcionar a quantidade adequada de estímulos e, simultaneamente, criar áreas específicas para descompressão e restauração da atenção e cognição, nomeadamente através do contacto com elementos da Natureza, design Biofílico e o acesso a vistas (Kahn et al., 2010). Acreditamos que edifícios saudáveis e que proporcionam o bem-estar devem ser o único tipo de edifícios em que as pessoas vivem, aprendem, trabalham, se divertem ou recuperam.
De que forma características especificas dos espaços podem alterar os comportamentos humanos, diminuindo o stress, incentivando a aprendizagem e a memória, aumentando a produtividade e o bem-estar dos seus utilizadores?
Com base nos princípios da Neuroarquitetura, as características específicas dos espaços podem influenciar diretamente o comportamento humano através de estímulos que afetam o cérebro, os sistemas cognitivos e emocionais (Eberhard, 2008). Os espaços podem atuar como moduladores do estado mental, influenciando aspetos como o stress, a aprendizagem, a memória, a produtividade e o bem-estar. A diminuição do stress é o resultado significativo de ambientes que integram elementos que geram respostas positivas no sistema nervoso, reduzindo os níveis de cortisol, a hormona do stress (Li et al., 2014). Exemplos são espaços com iluminação natural, presença de elementos da natureza, organização clara e fluida dos percursos e acessos aos diferentes ambientes (wayfinding), que oferecem diferentes possibilidades de executar variadas tarefas. O controlo do ruído representa, igualmente, um fator importante para manter a sensação de calma (Gonzalez et al., 2010). No que diz respeito à aprendizagem e à memória, espaços bem organizados, com uma disposição clara e estímulos visuais coerentes, facilitam o processamento da informação (Baker, 2018). A presença de áreas que permitem tanto a concentração quanto a colaboração, bem como a criação de ambientes confortáveis, promove a consolidação da memória, tornando-os mais propícios à aprendizagem. A produtividade, por sua vez, é potenciada em ambientes que equilibram estímulos e conforto. Os espaços projetados com esse cuidado otimizam as funções cognitivas, permitindo melhorar a concentração e aumentar a sua performance (Elliot & Maier, 2007). Além disso, o bem-estar é ampliado em espaços que promovem a interação social, integrando zonas de convivência. Esses ambientes estimulam a liberação de neurotransmissores como a dopamina e a serotonina, associados à felicidade e ao bemestar (Simmons & Strack, 2018). A organização espacial que respeita as necessidades de diferentes tipos de utilizadores, reconhecendo a neurodiversidade, oferece a sensação de segurança e beneficia todos os utilizadores.
Quais os principais objetivos que a APN, APPII e o Espaço de Arquitetura querem alcançar com a realização deste evento? Por que Lisboa foi escolhida para o acontecimento?
Os principais objetivos da APN, APPII e do Espaço de Arquitetura é integrar uma série de novos eventos focados na promoção da importância dos processos de conceção e intervenção no ambiente construído, destacando o impacto significativo que estes têm na sociedade. Tendo como impulso a pandemia do COVID-19, a preocupação com a qualidade dos espaços que ocupamos aumentou exponencialmente entre os grupos decisores. Neste contexto a Neuroarquitetura afirma-se como uma ferramenta essencial para aumentar a consciência sobre os efeitos que o ambiente tem no nosso bem-estar e nas nossas interações. Com este evento, pretendemos divulgar o que é a Neuroarquitetura, demonstrar as suas aplicações e, acima de tudo, sublinhar a sua relevância para todos os intervenientes. O objetivo é proporcionar um entendimento científico sobre o impacto que cada decisão e ação tem nos utilizadores, reforçando a importância de considerar as dimensões cognitivas e emocionais na conceção do ambiente construído. Tentamos perceber e informar de forma científica qual a verdadeira influência que cada uma das nossas atividades tem na sociedade como um todo. Acreditamos que todos os profissionais relacionados com a criação, o projeto, o planeamento, a construção e a gestão dos espaços têm o mesmo objetivo, contribuir para um mundo melhor para todos. Lisboa oferece o cenário ideal para reunir profissionais de várias áreas com um propósito comum: melhorar a qualidade de vida através do ambiente construído. O evento também pretende estreitar laços entre todas as fases do processo com o objetivo partilhado de criar espaços que, além de promoverem o bem-estar, gerem também valor económico e social.
Como o “Encontro NEUROARQUITETURA” pode gerar novas oportunidades no mercado e aumentar a consciência sobre a importância do design no bem-estar humano?
O “Encontro NEUROARQUITETURA” tem como objetivo principal promover uma maior compreensão sobre a relação entre o design dos espaços e o bem-estar físico e mental dos seus ocupantes. Ao reunir especialistas de diversas áreas, desde arquitetura e urbanismo até neurociência, ESG e imobiliário, o evento proporciona um fórum único para explorar como o design centrado no ser humano pode transformar espaços, desde edifícios comerciais até infraestruturas públicas. Através da partilha de conhecimento em casos práticos, as empresas do setor imobiliário, construtoras, gestores de ativos e investidores podem identificar novas oportunidades para incorporar práticas de neuroarquitetura nos seus projetos. Isso pode não apenas melhorar o bem-estar e a produtividade dos ocupantes, mas também gerar retornos financeiros sustentáveis, uma vez que a criação de ambientes mais saudáveis e eficientes torna-se um diferencial competitivo. No painel sobre ESG, vamos abordar de forma prática como os relatórios de sustentabilidade podem incluir métricas mais robustas sobre o impacto social (o “S” do ESG), em linha com as exigências legais e normativas, como a Taxonomia da UE. A discussão vai também focar-se em exemplos de projetos já implantados que geraram retorno positivo para os investidores, demonstrando como a adoção de estratégias de design especificas pode aumentar o valor dos ativos no mercado imobiliário. Além disso, o evento visa aumentar a consciência sobre como o projeto pode influenciar positivamente a qualidade de vida das pessoas, atraindo e retendo talentos, e fomentando comunidades mais inclusivas e colaborativas. Ao discutir os benefícios tangíveis de projetos que integram neuroarquitetura e design centrado no ser humano, esperamos impulsionar um novo paradigma no desenvolvimento imobiliário, focado na criação de espaços que promovem a saúde, a sustentabilidade social e o bem-estar geral.
Como as estratégias e o conceito de Neuroarquitetura podem contribuir para objetivos de ESG (Environmental, Social, Governance) no setor imobiliário?
As estratégias e o conceito de Neuroarquitetura podem contribuir significativamente para os objetivos de ESG (Environmental, Social, Governance) no setor imobiliário, particularmente através do impacto direto na dimensão social, criando espaços que reduzem o stress, aumentam a produtividade e promovem a inclusão social, considerando as necessidades de diferentes populações, como pessoas com neurodiversidade. Estes ambientes ajudam a melhorar a qualidade de vida dos utilizadores e contribuem para uma maior coesão social (Sternberg, 2010). Oferece benefícios à sustentabilidade ambiental, como o incentivo a comportamentos ecologicamente responsáveis através do design biofílico, que reduz o consumo de energia e melhora o conforto dos ocupantes (Kellert, 2015). No âmbito da governança pode reforçar a transparência e a responsabilidade corporativa, promovendo a conformidade com regulamentações de saúde e bem-estar. Ferramentas como o uso de sensores para monitorizar o stress dos ocupantes podem fornecer dados objetivos para os relatórios ESG, demonstrando o compromisso das empresas com práticas sustentáveis e centradas no ser humano (Gage, 2003). No caso do edifício EDGE em Amesterdão, o edifício de escritórios certificado como o mais sustentável do mundo, observouse que, apesar do seu elevado padrão de sustentabilidade e tecnologia, a performance inicial em termos de frequência e conforto não correspondeu às expectativas. Foi concluído que esse facto deveu-se ao desenvolvimento do design focado apenas nas métricas ambientais e tecnológicas, tendo negligenciado as necessidades e interações dos ocupantes. A experiência com o EDGE demonstra a importância de considerar os comportamentos, as emoções e as interações sociais dos utilizadores, para alcançar um desempenho sustentável a longo prazo, e a Neuroarquitetura oferece uma metodologia cientifica que pode garantir que os espaços construídos não só cumpram critérios ambientais, mas também maximizem a experiência e bem-estar dos ocupantes (BREEAM (2015).
O design baseado na ciência pode agregar valor a projetos imobiliários? Quais são os principais desafios para implementar este conceito em larga escala?
O design baseado em evidências científicas agrega valor significativo aos projetos imobiliários, promovendo a produtividade e a satisfação dos ocupantes, reduzindo o absentismo e tornando os imóveis mais atrativos para inquilinos e investidores. Ambientes saudáveis e focados na interação social podem atrair compradores dispostos a pagar mais, abordando preocupações sociais e regulatórias. Reduções de 10% na rotatividade e aumentos de até 23% na produtividade podem resultar em uma rentabilidade 21% superior para organizações com colaboradores altamente comprometidos. O design eficiente também reduz custos operacionais e melhora o acesso a financiamentos verdes e títulos sociais, ajudando a proteger os investimentos a longo prazo. Empresas que adotam princípios ESG atraem clientes e talentos, especialmente da Geração Z, melhorando a sua reputação e sustentabilidade. No entanto, a implementação deste design em larga escala enfrenta vários desafios. O custo inicial é uma preocupação, uma vez que a aplicação de princípios científicos no design pode exigir investimentos mais elevados em pesquisa, desenvolvimento e tecnologias especializadas. As questões éticas dos participantes nos estudos, bem como o tratamento e uso dos seus dados. Além disso, a falta de conhecimento e formação nas escolas de arquitetura sobre a integração da neurociência limita a adoção desses princípios. A resistência à mudança é outro obstáculo a indústria da construção é tradicionalmente conservadora, e os profissionais podem hesitar em adotar novas práticas. A implementação eficaz deste design exige a colaboração de várias disciplinas, como arquitetura, psicologia, sociologia e neurociência, o que pode ser complexo e exigir uma abordagem mais colaborativa. Embora o design baseado em evidencias científicas tenha o potencial de agregar valor significativo aos projetos imobiliários, a sua implementação em larga escala enfrenta desafios que precisam ser abordados para garantir uma adoção bem-sucedida e sustentável. “Quanto mais ampla for a nossa compreensão da experiência humana, melhor será o design que conseguiremos” (Steve Jobs). Embora o cérebro controle o nosso comportamento e os genes controlem o plano para o design e a estrutura do cérebro, o ambiente pode modular a função dos genes e, em última análise, a estrutura do nosso cérebro, e assim alterar o nosso comportamento. Ao planear os ambientes em que vivemos, o design arquitetónico altera o nosso cérebro e o nosso comportamento (Fred Gage).