“Temos o desafio de atrair mais jovens para o associativismo”

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Numa altura que a Associação Portuguesa de Técnicos de Contabilidade (APOTEC) organiza o VII Encontro Internacional Luca Pacioli em Santarém nos dias 8 e 9 de novembro, falamos com a Presidente desta Associação, Isabel Cipriano, que nos conta o que é este evento, o que está a ser feito no setor e na instituição, qual o impacto da IA nos processos e como a sociedade em geral pode ser inclusiva.

O que significa para a APOTEC, o VII Encontro Internacional Luca Pacioli que acontece em Santarém, nos dias 8 e 9 de novembro?

Para nós e para toda a classe, é uma data muito significativa. A 10 de novembro assinala-se o Dia Internacional da Contabilidade, porque foi neste mesmo dia, mas em 1494, que Frei Luca Pacioli publicou a famosa Summa de Arithmetica, Geometria, Proportioni et Proportionalita, que permitiu a ampla difusão da Contabilidade. Este evento reúne especialistas nacionais e internacionais, para além muitos interessados em conhecimento histórico relevante e necessário para o futuro, entre eles estudantes universitários e docentes.

Acredita que os jovens se interessam pela temática da Contabilidade?

Existem vários cursos, desde técnico-profissionais, a licenciaturas, mestrados e doutoramentos, públicos e privados, em Contabilidade, embora muitas vezes os jovens estudantes terminem as suas licenciaturas e optam por outras vias profissionais.

A classe profissional precisa de uma renovação?

Numa perspetiva histórica, a Contabilidade surgiu por necessidade, quer organizacional como pessoal, espelhando as necessidades da comunidade, em mútua interação. Neste ano assinalamos os 50 anos do 25 de Abril, e lembrando outras revoluções “em que o povo desceu à rua”, também em 1383 a revolução com o Mestre de Avis gritava “a Liberdade está a passar por aqui”. Acredito que o que a Contabilidade precisa – como em qualquer profissão – de renovação contante, que acompanhe o ritmo das mudanças económicas, sociais e geracionais. É fundamental em qualquer área se preservar o equilíbrio do conhecimento adquirido pela experiência dos mais velhos com o vigor e atrevimento mais novos, naturalmente menos calejados, com visões distintas tecnologicamente mais dotados e dispostos.

A transformação digital no vosso setor é essencial. De que forma acredita que a Inteligência Artificial e a Blockchain impactarão o futuro das operações na Contabilidade?

Ao contrário do que se imagina, um contabilista não é um burocrata. Felizmente que a larga maioria dos processos estão (em via ou) já automatizados e que caminhamos céleres para modelos mais otimizados. A Inteligência Artificial, nesta envolvência, serve como apoio das organizações, executando tarefas rotineiras, por conseguinte libertando os profissionais para o que chamamos de “acrescentar valor” às organizações e ao seu desempenho, seja a nível contabilístico, fiscal, orçamental, financeiro, etc. É ainda preciso ter em conta a dimensão de escala do tecido empresarial nacional, por essa razão os dados indicam que a maioria das estruturas (ainda) não está capacitada para aproveitar esta ferramenta na sua plenitude.

Deveríamos ter formação em IA?

Antes disso, é bem mais urgente a literacia financeira e fiscal! E aqui as necessidades formativas são gritantes. O grosso do tecido empresarial nacional são as PME’S, e dentro destas, micro e nano estruturas, muitas delas de origem familiar. O desfio da formação é global, aliás a formação continua faz parte do processo de desenvolvimento tanto profissional como organizacional.

Um dos temas em destaque no VII Encontro Internacional Luca Pacioli é a evolução e revolução na Contabilidade e negócios. Que desafios e oportunidades considera que a transformação digital trará às empresas que ainda operam de forma tradicional?

A sociedade está a evoluir de forma quase alucinante quando se trata de tecnologia e acredito que possam ser cada vez menos as empresas que ainda esteja reféns de processos mais arcaicos, com uma excessiva dependência do suporte em papel, e de tratamento da informação pouco tecnológico. A tecnologia é o melhor parceiro do contabilista, sobretudo se queremos otimização do desempenho, e claro, sairmos da cauda da tabela da baixa produtividade.

A Contabilidade lida com números, finanças de empresas e pessoais, ou seja, com dados sensíveis. Como é que se podem proteger de um ciberataque?

A segurança é um fator de risco e deve ser considerada sempre de forma primordial nas organizações. A questão que devemos colocar não é “e se acontecer”? mas sim “o que fazer quando tal suceder”. Muito dificilmente vivemos sem o digital, mas não há bela sem senão… Hoje, tudo o que são “dados” são monitorizados, replicados, suscetíveis de serem divulgados – para o bem e para o mal. Faz parte da análise de risco de cada organização medir as suas fragilidades. A cibersegurança é um desses fatores de risco, que devemos cada vez mais, acautelar.

O capital humano continua a ser um pilar fundamental e é frequentemente mencionada como um fator-chave para o sucesso organizacional. Como vê o papel da valorização dos profissionais da contabilidade nesta fase de evolução e revolução digital, mas também a sua formação contínua?

Há uma frase muito usada e que se assemelha a um cliché, mas que não deixa de ser verídica: “as organizações são as pessoas”, não me preocupa tanto a IA mas sim a falta de capacidade da inteligência natural. Para usar a tecnologia, é necessário compreender o processo, caso contrário seria a mesma coisa que estar a fazer um balanço em word, tal como fazíamos com as máquinas de escrever no século passado.

O Dia Internacional da Contabilidade assinala-se a 10 de novembro. Como avalia a situação atual da classe em termos de diversidade e inclusão? Que medidas podem ser implementadas para promover um ambiente mais inclusivo nas empresas de contabilidade?

Se há setor inclusivo, é este. Só há uma incapacidade que ainda não se conseguiu suplantar, que é a incapacidade visual, mas acredito que com a IA também essa limitação possamos ser capazes de ultrapassar.

As empresas precisam de incentivos à inclusão?

Que tipo de inclusão? As empresas precisam de gestão assente em princípios éticos, valorativos e de comunidade. Há profissionais com incapacidades físicas a desempenharem zelosamente a sua atividade, adaptada claro. São exemplos diários de superação, plenamente integrados. Até porque como pessoas que somos, a integração ou melhor, a não segregação começa connosco, em nossas casas, nas nossas famílias, com os amigos, no café onde habitualmente vamos, no cinema, no nosso trabalho, em todas as realidades onde o humano age. Isto é a norma geral, o restante é demagogia e um outro tipo de agenda que não passa felizmente por mim, nem com aqueles que de forma muito gratificante tenho o privilégio de partilhar esta jornada de vida e de trabalho.

Quais são os objetivos da APOTEC para 2025?

Continuar a contribuir com dignidade para que os profissionais se sintam realizados. Para isso a formação continua é essencial, e a nossa oferta formativa é de excelência. Há que manter bem alta esta conquista! Este ano de 2024 tínhamos como missão criarmos o Museu da Contabilidade, tema no qual estamos a trabalhar. Temos também o enorme desafio que é o de atrair mais jovens para o associativismo. Esta geração mais nova cresceu num mundo em o livre associativismo é pouco divulgado, apoiado e valorizado. A APOTEC é uma das poucas exceções, conta 47 anos num país em que a média das associações é de 19 anos. Por isso, a ligação com a Academia é essencial sobretudo porque temos tido a capacidade de estar na vanguarda, quer em procedimentos quer em defesa de causas profissionais.

Que mensagem gostaria de deixar aos profissionais e estudantes de contabilidade que participarão neste evento em Santarém, sobre o futuro da profissão?

O VII Encontro Internacional Luca Pacioli por si só, traduz uma mensagem: a dignidade dos profissionais e a importância da coletivamente defendermos a mesma. Todos nós lidamos com necessidades de contabilidade no nosso quotidiano, como por exemplo, a gestão do nosso orçamento familiar. Aos jovens e aos menos jovens, apelo a que mantenham o seu entusiasmo pela profissão, porque quer seja nesta, quer seja noutra, se não conseguirmos garantir que enquanto sociedade possamos beneficiar dos direitos (e deveres) fundamentais, teremos perdido todo o nosso sentido de comunidade viva.

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