A Psicologia tem um papel cada vez mais relevante na sociedade contemporânea, não apenas no contexto clínico, mas também na formação, inovação e democratização do conhecimento. Vitor Nuno Anjos, Fundador da Associação Portuguesa Conversas de Psicologia, tem sido uma figura central nesse movimento, promovendo o diálogo acessível e prático sobre temas fundamentais para o desenvolvimento da profissão e para a sensibilização da sociedade quanto à importância da saúde mental. Na edição da Revista Pontos de Vista de 31 de Março, no Dia Mundial da Saúde, o entrevistado evidencia ainda mais a importância da Psicologia Colaborativa e a Formação como Motor de Desenvolvimento!
O que o motivou a criar a Associação Portuguesa Conversas de Psicologia e qual foi o seu objetivo inicial?
O projeto começou em 2013, inicialmente com o nome “Pensar a Psicologia: Café com Psicólogos”. A ideia era simples, mas impactante: criar um espaço informal, acessível e prático para estudantes, profissionais da Psicologia e a sociedade em geral discutirem temas relevantes, partilharem experiências reais e explorarem o impacto da psicologia no nosso dia a dia. Na altura, percebi que muitos sentiam falta de um local onde pudessem aprender através dos testemunhos de profissionais experientes, esclarecer dúvidas e debater os desafios da área, mas sem a rigidez do ensino tradicional.
Além disso, percebi que as novas abordagens e tendências da psicologia estavam a ser menos destacadas nas universidades, enquanto os modelos teóricos tradicionais continuavam a ser amplamente seguidos. Essas abordagens precisavam ser atualizadas para refletir as novas realidades, nomeadamente ao nível dos modelos de intervenção mais recentes e os estudos científicos de alta qualidade, que, na altura, eram praticamente exclusivos de eventos científicos e do círculo restrito dos especialistas. Isso criava a sensação de que a psicologia era uma ciência “fechada” aos olhos do público em geral.
A nossa missão era inverter esta dinâmica. Queríamos trazer maior dinamismo à comunicação da psicologia com a sociedade, de forma inovadora e inclusiva, envolvendo as pessoas num diálogo aberto e numa reflexão sincera, sem receio das objeções ou críticas que a exposição pública pudesse trazer. Acreditava que este seria um caminho essencial para que a sociedade olhasse para a saúde mental de forma mais compreensiva e inclusiva.
O objetivo não era apenas debater, mas também desmistificar. Queríamos criar um espaço onde todos, independentemente do seu conhecimento prévio, pudessem sentir-se à vontade para participar nas discussões, sem medo de serem julgados ou de terem uma opinião diferente daquilo que é consensual nas ciências. Pelo contrário, acreditávamos que ao dar espaço a diferentes pontos de vista, conseguiríamos educar os participantes de uma forma mais acessível e clara, sem depender da terminologia académica complexa, mas explicando de forma simples e objetiva o que estava em causa.
Com uma equipa de colegas fantásticos que se juntaram a mim nesse projeto, criámos um espaço de tertúlias e encontros regulares, com convidados que traziam temas relevantes para a psicologia contemporânea, desde novas abordagens terapêuticas até questões sociais e políticas públicas. O objetivo era criar um ambiente acolhedor, sem julgamentos, onde todos pudessem partilhar, interagir e exercitar o pensamento crítico.
O nome “Pensar a Psicologia” evoluiu para a Associação Portuguesa Conversas de Psicologia, mas o nosso objetivo continuou o mesmo: aproximar a psicologia da sociedade, promovendo uma visão mais inclusiva e humana da saúde mental. Essa abordagem visava também a desconstrução dos estigmas sociais, proporcionando um ambiente de aprendizagem contínua onde todos os participantes pudessem expandir os seus horizontes.
Além disso, com a apresentação das novas tendências e abordagens da disciplina, começámos a quebrar a rigidez do ensino tradicional.
Queríamos ir além dos modelos teóricos que eram ensinados nas faculdades, (que é um complemento ao que já fazem) e, cujo fator diferenciador e inovador não se sobrepõe ao já feito. Esta troca de conhecimentos visava não só desmistificar a psicologia, mas também tornar os avanços científicos mais acessíveis ao público em geral, permitindo que todos participassem ativamente nesses cafés com psicólogos.
Foi assim o início das Conversas de Psicologia, que hoje tem um impacto significativo na inovação e disseminação do conhecimento em Psicologia.
Como avalia o impacto da Associação ao longo destes anos?
O impacto tem sido extremamente positivo e transformador, tanto na formação contínua dos psicólogos quanto na sensibilização da sociedade para a importância da saúde mental. Desde a nossa fundação, promovemos mais de 9.000 horas de formação, alcançámos 30.000 participantes e contamos com uma comunidade ativa de associados.
Apostamos numa abordagem dinâmica e interdisciplinar, oferecendo congressos, workshops e projetos de investigação, sempre alinhados com as necessidades emergentes da sociedade. Mas o nosso impacto vai além da formação técnica. Trabalhamos também em projetos comunitários, iniciativas de voluntariado e ações de sensibilização, ajudando a reduzir o estigma em torno da Psicologia e tornando o acesso ao conhecimento mais democrático.
Outro marco importante foi o reconhecimento nacional e internacional da nossa atuação, com projetos financiados pela Comissão Europeia e Portugal 2020/2030, consolidando o nosso compromisso com a inovação e a excelência na Psicologia.
Ainda há muito a fazer, mas o crescimento da nossa comunidade demonstra que estamos no caminho certo, promovendo uma Psicologia mais acessível, colaborativa e orientada para o impacto social.
Com mais de 2.500 horas de formação ministradas, que mudanças já observou no setor da Psicologia?
Nestes anos, a Psicologia passou por grandes transformações, tanto na prática profissional quanto na forma como é percebida pela sociedade. A formação e a consultoria têm sido essenciais para essa evolução, promovendo a especialização dos profissionais e preparando-os para os desafios contemporâneos.
Entre as mudanças mais significativas, destaco:
- Maior especialização e diversificação – Hoje, há uma oferta mais ampla das áreas de atuação, como neuropsicologia, psicologia do trabalho e das organizações, psicologia da saúde e intervenção comunitária.
- Novas abordagens terapêuticas – Terapias de terceira geração, psicologia positiva e mindfulness tornaram-se cada vez mais comuns, tornando as intervenções mais eficazes.
- Digitalização da Psicologia – O atendimento online, o uso de inteligência artificial e realidade virtual começaram a ganhar espaço, exigindo novas competências dos profissionais.
- Redução do estigma e maior procura por apoio psicológico – A crescente valorização da saúde mental tem levado mais pessoas a procurarem ajuda, aumentando a necessidade de psicólogos bem preparados.
Acredito que a formação contínua é a chave para consolidar essas mudanças. Profissionais bem capacitados garantem intervenções mais eficazes e uma Psicologia cada vez mais valorizada na sociedade.
Como a Psicologia e a mentoria podem beneficiar a Gestão de Pessoas e Recursos Humanos?
A Psicologia tem um impacto profundo na gestão de pessoas, pois ajuda a compreender o comportamento humano, a motivação e os fatores que influenciam o desempenho no trabalho. A mentoria, por sua vez, é uma ferramenta essencial para o desenvolvimento profissional sustentável, pois oferece suporte, orientação e acelera o crescimento de talentos.
Entre os principais benefícios da Psicologia e da mentoria para os Recursos Humanos, destaco:
- Desenvolvimento de talentos – Identificação de potencial e orientação para o crescimento dentro das organizações.
- Promoção do bem-estar e equilíbrio emocional – Estratégias para prevenir burnout e criar ambientes de trabalho mais saudáveis.
- Aumento do engagement e produtividade – Quando os colaboradores se sentem apoiados, o seu desempenho melhora.
- Gestão de conflitos e inteligência emocional – Ferramentas psicológicas ajudam a resolver conflitos e a melhorar a comunicação interpessoal.
- Tomada de decisão baseada em ciência – Métodos psicológicos permitem decisões mais estratégicas em recrutamento e avaliação de desempenho.
Num mundo cada vez mais dinâmico, investir na Psicologia e na mentoria dentro das organizações não é apenas um diferencial, mas uma necessidade para criar equipas mais fortes, motivadas e preparadas para os desafios do futuro.
Que conselhos daria a jovens psicólogos e profissionais que procuram crescimento na área?
O futuro da Psicologia está a ser moldado pela inovação, pela digitalização e pela necessidade de novas abordagens terapêuticas. Para o jovem profissional que procura crescer na área, deixo cinco conselhos fundamentais:
- Apostar na formação contínua – A Psicologia está sempre a evoluir, por isso, é essencial manter-se atualizado com as novas abordagens e metodologias baseadas na evidência.
- Desenvolver competências interpessoais – A empatia, a comunicação eficaz e a inteligência emocional são tão importantes quanto o conhecimento técnico.
- Construir uma rede de contactos e parcerias – O networking é essencial para encontrar oportunidades e colaborar em projetos inovadores.
- Explorar novas tecnologias e abordagens digitais – Dominar ferramentas como telepsicologia, inteligência artificial e realidade virtual pode abrir novas possibilidades de atuação.
- Manter-se fiel à ética e à ciência – Com o excesso de informação, é crucial basear a prática em evidências científicas e manter um compromisso ético sólido.
A Psicologia está a expandir-se para novos horizontes, e os jovens profissionais têm um papel fundamental nesta transformação. O segredo está em aprender continuamente, adaptar-se às mudanças e inovar, sem perder a essência da Psicologia como ciência e prática dedicada ao desenvolvimento humano.
A Psicologia enfrenta um futuro promissor, com desafios e oportunidades significativas. A formação contínua, a mentoria e a inovação serão pilares essenciais para que os profissionais se destaquem e contribuam para uma sociedade mais saudável e equilibrada.
A Associação Portuguesa Conversas de Psicologia continuará a desempenhar um papel ativo nesse processo, promovendo conhecimento, colaboração e crescimento profissional para psicólogos e estudantes da área.