“A proximidade das eleições levanta incertezas quanto à continuidade destas medidas fiscais”

Data:

Com o novo ano fiscal à porta, os contribuintes portugueses podem esperar mudanças significativas nos seus rendimentos mensais. As tabelas de retenção de IRS para 2025 prometem trazer um alívio para o bolso dos trabalhadores e pensionistas. Para nos ajudar a compreender melhor o impacto prático destas alterações, conversamos com Daniel Rocha Cardoso, Partner da FA Accounting & Management, que partilha a sua análise sobre o que estas mudanças representam para os contribuintes e para as empresas, bem como os desafios que ainda persistem no sistema fiscal português.

Qual é a sua opinião sobre as novas tabelas de retenção de IRS para 2025? Acredita que estas medidas terão um impacto significativo nos rendimentos líquidos dos trabalhadores e pensionistas?

As novas tabelas de retenção de IRS para 2025 refletem um ajustamento importante na política fiscal portuguesa, procurando adaptar-se à inflação e à evolução do mercado de trabalho. Em termos gerais, a intenção do governo ao atualizar estas tabelas é reduzir a retenção na fonte para certos escalões de rendimento, permitindo que os trabalhadores e pensionistas tenham um maior rendimento líquido mensal. No entanto, o impacto real dependerá do perfil de cada contribuinte, da sua faixa salarial e da estrutura familiar.

Para alguns, esta atualização significará um alívio imediato no salário líquido mensal. Contudo, há casos em que as novas tabelas podem resultar num aumento da retenção na fonte, reduzindo a liquidez no curto prazo. É importante que os contribuintes compreendam que a retenção de IRS não equivale a um aumento da carga fiscal total, pois o valor final devido será ajustado na declaração anual de IRS.

 

A atualização dos escalões de IRS em 4,6% e o aumento do salário mínimo nacional para 870 euros são medidas positivas para os trabalhadores. Na sua perspetiva, que desafios estas mudanças poderão trazer para o tecido empresarial?

O aumento do salário mínimo e a atualização dos escalões de IRS são medidas que visam melhorar o poder de compra dos trabalhadores, especialmente os que se encontram nos escalões mais baixos. No entanto, do ponto de vista empresarial, estas mudanças podem representar desafios significativos.

Para as pequenas e médias empresas (PME), que constituem a maioria do tecido empresarial português, o aumento do salário mínimo traduz-se num acréscimo de encargos com salários e contribuições sociais. Empresas que operam em setores com margens reduzidas, como a restauração, comércio e agricultura, poderão enfrentar dificuldades em suportar estes custos sem aumentar os preços dos seus produtos ou serviços.

Além disso, o ajustamento dos escalões de IRS pode impactar a gestão de benefícios e incentivos fiscais nas empresas, obrigando a uma revisão da política salarial e das contribuições para a Segurança Social. Algumas empresas poderão tentar mitigar o impacto financeiro através de redução de pessoal, aumento da automação ou outras estratégias de eficiência operacional.

 

Considera que estas alterações podem influenciar a capacidade económica dos trabalhadores de forma positiva? Que setores poderão ser mais beneficiados ou prejudicados?

A melhoria do rendimento líquido dos trabalhadores pode aumentar a capacidade de consumo, o que beneficia setores diretamente ligados ao comércio, serviços, turismo e lazer. Com mais dinheiro disponível, as famílias tendem a gastar mais em bens essenciais, lazer e até investimentos de pequeno porte.

Setores como o retalho, a restauração e o turismo podem ser os mais beneficiados, já que uma maior disponibilidade financeira dos consumidores estimula o consumo destes serviços. Por outro lado, setores que dependem fortemente de mão de obra intensiva, como a agricultura e a indústria transformadora, podem enfrentar desafios com o aumento dos custos salariais.

Outro aspeto importante a considerar é a inflação. Se os aumentos salariais não forem acompanhados por um crescimento sustentável da produtividade, os custos adicionais podem ser transferidos para os preços finais, reduzindo o poder de compra a médio prazo.

 

Muitos trabalhadores que fizeram simulações constataram uma possível diminuição das receitas face a 2024, ou até a necessidade de pagar ao Estado. Como interpreta este cenário? Acredita que há falhas na comunicação ou compreensão das novas tabelas?

O facto de alguns trabalhadores perceberem uma possível diminuição das receitas face a 2024 pode estar relacionado com a forma como a retenção na fonte foi ajustada. Em muitos casos, os trabalhadores estão habituados a um determinado nível de retenção e, quando ocorrem mudanças, podem interpretar mal o impacto real.

Se a retenção for reduzida em demasia ao longo do ano, pode levar a um valor mais elevado a pagar na liquidação do IRS no ano seguinte. Isto pode dar a falsa impressão de que a carga fiscal aumentou, quando, na realidade, o imposto foi apenas diferido para um momento posterior.

Uma falha na comunicação das novas tabelas de retenção pode ter contribuído para esta confusão. Seria importante que as Finanças disponibilizassem informações mais detalhadas e acessíveis sobre como estas alterações impactam diferentes perfis de rendimento e incentivassem os contribuintes a fazer simulações mais precisas.

 

Com as eleições à vista, se houver uma mudança de orientação política no Governo, quais são as suas expetativas em relação à continuidade destas medidas fiscais? Poderá haver um retrocesso ou ajustes significativos?

A proximidade das eleições levanta incertezas quanto à continuidade destas medidas fiscais. Caso haja uma mudança de governo com uma orientação política diferente, é possível que sejam introduzidos ajustamentos nas tabelas de retenção, nos escalões de IRS ou mesmo na taxa do imposto.

Governos com uma abordagem mais liberal poderão apostar na redução da carga fiscal global, especialmente para empresas e trabalhadores com rendimentos mais elevados. Por outro lado, um governo com uma visão mais social poderá procurar manter ou reforçar políticas de redistribuição, ajustando as taxas de IRS para garantir maior equidade.

Independentemente da direção política, é provável que qualquer mudança não seja imediata, pois há compromissos orçamentais a cumprir e medidas fiscais que exigem um período de transição para serem implementadas.

 

Na sua perspetiva, como os líderes e empresários poderão mitigar possíveis impactos negativos destas mudanças nas suas organizações?

Os empresários devem adotar uma abordagem estratégica para lidar com o impacto destas alterações. Algumas ações que podem ser tomadas incluem:

  • Revisão da política salarial para garantir que os aumentos salariais sejam sustentáveis dentro da estrutura de custos da empresa.
  • Otimização fiscal e incentivos para maximizar benefícios e minimizar impactos financeiros.
  • Investimento em automação e eficiência operacional para reduzir a dependência de mão de obra intensiva.
  • Formação e qualificação dos colaboradores para aumentar a produtividade e justificar aumentos salariais.

 

Acredita que estas alterações podem desencadear um aumento na capacidade de consumo e, consequentemente, impulsionar alguns setores da economia? Que tipo de empresas poderiam beneficiar deste efeito?

Sim, um aumento do rendimento disponível pode estimular o consumo e beneficiar setores como o comércio, turismo, restauração e bens de consumo. Pequenas empresas locais podem ganhar com o aumento da procura, assim como empresas que oferecem produtos e serviços acessíveis a famílias com maior poder de compra.

No entanto, se os preços subirem devido ao aumento dos custos empresariais, o impacto positivo pode ser mitigado.

 

Que estratégias financeiras recomendaria para empresas e trabalhadores melhor se prepararem para estas mudanças?

  • Empresas: Planear orçamentos com margem para o aumento dos custos salariais, otimizar processos e explorar incentivos fiscais.
  • Trabalhadores: Gerir melhor o orçamento mensal, considerar investimentos e utilizar ferramentas de simulação fiscal para evitar surpresas na liquidação do IRS.

 

Considera que a implementação destas medidas foi bem estruturada? Que sugestões faria para melhorar o impacto positivo e mitigar efeitos negativos?

Embora a intenção das medidas seja positiva, a comunicação e a implementação poderiam ter sido mais claras. Uma estratégia mais eficaz incluiria:

  • Divulgação antecipada das alterações com simulações detalhadas.
  • Campanhas de esclarecimento para trabalhadores e empresários.
  • Ajustes graduais para reduzir impactos abruptos.

Partilhar

Revista Digital

Revista Pontos de Vista Edição 140

Popular

Mais Artigos deste tipo

“Sousa Martins 17” O NOVO ÍCONE RESIDENCIAL DE LUXO EM LISBOA

No coração das Avenidas Novas, nasce o Sousa Martins...

“Desde o início, optamos por um modelo de negócio focado em marca própria”

A Arcobarca – Mediação Imobiliária, Lda., sob a liderança...

Setor da Cerâmica e do Vidro de braço dado com o Hidrogénio Verde

Nesta edição, damos destaque a Inês Rondão, Coordenadora Técnica...