“A poesia, como Arte, é uma força invisível que me sai da alma”

A Revista Pontos de Vista conversou com Natividade Teixeira, Escritora, Poetisa, Professora e Empreendedora – e uma Mulher exemplo com muitas lições (e missões) de vida para nos deixar. Conheça a sua história e o que é que a motivou durante a sua longa jornada em várias vertentes da vida.

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A Natividade Teixeira é empreendedora, escritora e poetisa – e é um prazer conversar consigo sobre o seu próximo livro. Pode partilhar um pouco sobre a sensação de estar prestes a lançar esta obra? O que a inspirou a escrevê-la e qual é a mensagem que espera transmitir aos leitores?
Em primeiro lugar agradeço a oportunidade desta entrevista, que a vossa prestigiada revista me proporcionou.
A sensação que eu tenho é a de atravessar uma ponte desde a procrastinação à realização efetiva de algo que eu nunca tinha pensado ser possível. Isto, porque nunca me considerei Poetisa, no seu sentido mais lato, mas sim alguém apaixonada pela Arte de escrever e de ler poesia. Na verdade, comecei a “escrevinhar” poemas aos 11 anos de idade, como uma forma de catarse após o falecimento de meu pai, desconhecendo, na altura, o que era a poesia. A escrita foi uma forma de psicanálise, o transbordar de emoções complexas e de questões da “alma” que eu não conseguia, com aquela idade, expressar.
Ao longo do tempo, as emoções deram lugar às cogitações da alma, à indagação do “eu”, à presença e ausência de um universo que me ultrapassava em seu sentido, à construção do pensamento como reflexão sobre todos os propósitos da vida e, finalmente, à visão, experimentação e paixão da Poesia como forma de Arte per si.
Florbela Espanca foi a minha musa, dela lia e relia o que também me ia na alma, identificando-me e fortalecendo o meu espírito com a sua Obra inigualável.
Mas foi com a descoberta do nosso Fernando Pessoa e seus heterónimos que me revi inteira, a minha grande paixão em termos de literatura, a minha ajuda nos momentos mais difíceis e naqueles em que buscava o sentido das coisas.
E, tal como este grande, enorme Poeta referiu, a mensagem do que escrevo está no próprio leitor. Busque, quem lê, o que procura em si mesmo. Se a minha poesia contribuir para esse encontro, o do leitor consigo mesmo, então já sinto que essa mensagem cumpriu o seu propósito (e não o meu).

Gostaríamos de saber mais sobre as perspetivas do seu novo livro. O que nos pode contar sobre o mesmo e quando podemos esperar o seu lançamento? É possível antecipar alguns detalhes sobre o evento de lançamento?
Aprendi a viver sem expetativas, mas está para muito breve uma coletânea de poemas que abrange o período da minha adolescência e juventude. Isto porquê? Tanto como pessoa, como docente, gostaria de incentivar os adolescentes e jovens a ler, a apreciar e sentir mais a poesia, não no âmbito de sua interpretação, mas como impulsionadora da sua autodescoberta como interior, como motivação para o seu processo de desenvolvimento como pessoas em constante mudança. Por fim, incentivar esses jovens à expressão escrita como processo criativo, revelador e dinâmico. Se conseguir contribuir para que muitos destes jovens iniciem, prossigam com a escrita e apreendam a Poesia, não como um conjunto de regras e de meras palavras ao acaso, mas sim sentindo-a no seu mais puro significado, já me sentirei realizada com a publicação da obra.

Sendo uma artista das mais variadas formas, certamente experienciou diversas emoções ao longo do seu percurso. Pode partilhar um pouco sobre a sua jornada na escrita e como as experiências de vida influenciaram o seu trabalho?
A poesia nunca foi algo racional para mim. Não penso sobre o que vou escrever nem como. A poesia, como Arte, é uma força invisível que me sai da alma e passa para o papel, uma catarse, como eu referi antes, por isso nunca leio o que escrevo, senão muito tempo depois de ter escrito. Nesse sentido, a poesia escreve-se a si mesma, eu sou meramente um recurso impulsionador para a explosão de sentimentos, emoções, ideias, ideais, sonhos, vivências e muitos “quês” e “porquês”.
Há momentos em que a inspiração surge do nada, outras do “tudo” que me rodeia, seja uma palavra dita por alguém, um pensamento que me assalta ou simplesmente aquele momento mágico em que a chuva e o vento sacodem as árvores em sibilos ou melodias que só a alma entende.
Construo muitas vezes poemas na mente, em situações em que não tenho como as escrever. Escrevo muitas vezes de madrugada, quando o silêncio me fala e o ambiente noturno que me envolve me arrebata emoções subconscientes de amor, de ira, desejo, em delírios tanto sagrados quanto profanos.

A escrita, muitas vezes, reflete as emoções e experiências pessoais. Pode destacar alguma parte do seu novo livro onde a sua própria vida e emoções são evidentes? Como é, para si, partilhar essas partes mais íntimas com os leitores?
O ato poético reflete sempre emoções e vivências que nos marcam ou marcaram, tanto a nível consciente como subconsciente. “Deixo-me ir” ao sabor da pena, não penso, não tenho expetativas quando escrevo.
A partilha dessas emoções e vivências poderia “doer” se fosse uma partilha da nossa persona mais íntima. Não pretendo que me conheçam, mas, mesmo sem pretensões, que seja o próprio leitor a encontrar-se, conhecer-se ou reconhecer-se na poesia palavras (não na minha). Nesta minha primeira coletânea, no entanto, se há algo que transmito, é o crescimento interior de uma adolescente e jovem, inerente a todos os jovens de todas as épocas, pois todos passamos pelos mesmos estados (eufóricos, lacrimosos, líricos, de frustração e paixão).

Certo é que, além do que foi anteriormente abordado, tem também mais de 30 anos de experiência no ensino. Qual foi a fase de vida mais marcante enquanto professora? Que desafios a inspiraram ao longo destes anos?
Ser professora nunca foi uma opção, porém, à medida que fui aprendendo com os meus alunos, conhecendo o seu lado humano, comecei a sentir que esta profissão é muito mais do que ensinar ou mesmo educar. Estão ali seres à nossa frente que se debatem com traumas, problemas familiares, em desenvolvimento e muito pressionados pelo sistema de ensino que, a meu ver e como consequência de eu ter lecionado no estrangeiro, não é de longe o sistema ideal.
Refiro-me, não somente ao método de ensino e aos horários sobrecarregados, mas muito mais à falta de um sistema que desenvolva a criatividade, a sensibilidade, a harmonia, o companheirismo e, principalmente, sabermos que estamos a lidar com pessoas, seres humanos que estão a passar pelo mesmo processo de crescimento que nós, nessas idades.
Sugeriria seguirmos o exemplo dos Países nórdicos (num dos quais lecionei), em que as crianças têm mais tempo para estar com seus familiares, mais atividades criativas na escola, aprendizagem in loco e tarefas mais práticas, menos teoria, mais tarefas de investigação com a finalidade de se tornarem seres mais autónomos e emocionalmente equilibrados.

Além da sua carreira na educação, sabemos que também está envolvida no empreendedorismo na área do e-commerce. O que é que esta área lhe dá, enquanto pessoa, mulher e profissional – e também escritora? Como é que o empreendedorismo se cruza com a sua paixão pela escrita? Existem lições do mundo empresarial que influenciam a sua abordagem artística ou vice-versa?
O empreendedorismo sempre fez parte da minha vida. Tive primeiramente um Centro de Estudos, no Porto, mas acabei por emigrar e estabeleci-me como proprietária de um Spa, com clínica de emagrecimento e rejuvenescimento facial.
Sempre quis aprender o mais que pude, dentro dos meus interesses pessoais, considerando que sou multifacetada (falo sete idiomas) e que a vida profissional e a criatividade não se apartam, mas sim complementam-se, de variadas formas.
Nesta era digital, o e-commerce tornou-se uma opção razoável e em crescimento. Torna a vida das pessoas muito mais fácil em termos de tempo e deslocação, por exemplo, fazer compras online, escolher uma gama mais variada de produtos em minutos do que deslocar-se a lojas físicas.
O e-commerce e a poesia dar-me-á tempo e espaço para a criatividade e para a família. Espaço, no sentido de espaço a mim mesma para me organizar e evoluir como pessoa e como empresária. Se a meta é a realização dos nossos sonhos e o sonho comanda a vida, quando se faz tudo com paixão tornamo-nos mais livres e disponíveis para ajudar os outros.

Dado o seu percurso, como observa a evolução da igualdade de género em todas as vertentes e áreas da sua vida ao longo do tempo? Que desafios ainda existem, no seu entender?
A vida é um desafio constante, dado que o ser humano está em constante desafio com a vida e com ele próprio. Se conseguíssemos evoluir para um estado em que já não se falaria de igualdade de género, mas de igualdade Humana, o mundo seria o paraíso.
Infelizmente os desafios ainda são tantos, a meu ver, que não conseguiria inclui-los todos nesta entrevista. Como Mulher (e não mulher) perdi a conta em que a minha qualidade de pessoa / ser humano foi posta em causa, pelo facto de ser mulher! E afirmo isto em muitas áreas da vida. Mas, como o problema está nos outros, na sociedade, mentalidades, hábitos culturais e mais não direi para não ofender ninguém (e nenhuma instituição) o grande desafio é mesmo esse: compreendermos que somos todos humanos, sem exceção, pelo que todos temos os mesmos direitos, exceto o de interferir na liberdade e integridade dos outros. Ainda teremos pela frente um constante trabalho de superação de décadas e décadas de desigualdade, preconceitos, pré-juízos, supressões e validação, mas que o façamos com afinco.
“O meu espaço começa onde o teu termina”.

A Natividade Teixeira é, de facto, um exemplo de uma Mulher que brilha nas suas áreas de atividade. Neste sentido, gostaria de deixar uma mensagem a todas as jovens que estão agora a iniciar as suas carreiras profissionais?
Acima de tudo amem-se, valorizem-se, aprendam, sigam os vossos sonhos, pois ninguém vive a vossa vida além de vós mesmas. Não deixem para trás o que vos poderá trazer, no futuro, arrependimento ou vazio interior.
Desde tempos imemoriais, o papel da Mulher foi o mais abrangente na sociedade, o mais desvalorizado, mas o mais completo. Os sonhos realizam-se passo a passo e cada passo torna-se mais largo à medida que avançamos com orgulho em nós próprias, autoestima e, muito importante, sejam seletivas.

Biografia Natividade Teixeira

Licenciada em Línguas e Literaturas Modernas, profissionalizada na área da Educação, nasci no nosso único e maravilhoso norte de Portugal. Amante de viagens e aventura, residi e trabalhei na Noruega durante 12 anos e no sul de Espanha por 4 anos.

De volta à minha Pátria Lusitana, já com eterna Saudade da Alma portuguesa, ingressei novamente na profissão de docente.

A minha vida tem sido uma incansável procura do Eu, do significado da existência humana e de uma perpétua admiração da obstinada e quase sensual natureza que nos rodeia.

Sempre me fascinou o conhecimento, seja o esotérico ou o exotérico, admiro as distintas culturas indígenas e celtas, a sua riqueza intemporal e resistente ao tempo, assim como a História de civilizações antigas, tais como Grécia e o Egito.

Ávida de leitura desde muito cedo, devotei-me às obras completas de Florbela Espanca, esta que foi o meu primeiro encontro com a Poesia. Revia-me nos seus poemas e muito mais na sua sensibilidade quase carnal e anti-mundana.

Os meus grandes heróis, quase supranaturais, são o nosso grande, imenso, Camões cuja forma de escrita considero inigualável.

Foi, porém, com a descoberta de Fernando Pessoa e subsequentemente Mário de Sá Carneiro, Natália Correia, para nomear só alguns, que me aficionei.

à Poesia como Arte per si, qual tela pintada a jorros de tintas desregradas, sublimes, profundas, em que tudo é permitido e nada deve ser negado – «se a Alma não é pequena» – tal como nos disse o Poeta.

Sempre com um livro à cabeceira da cama e na mochila, comecei a ter por companhia também um caderninho onde escrevia o que sentia, o que pensava, os meus ideais e cogitações, as minhas dores mundanas e fictícias.

Poetas somos todos nós, os que sentem, os que sonham, os que se interrogam, os que ficam na berma do abismo e a partir dele se transformam.

Os que buscam a utopia do Amor, o tal incondicional, os que muito têm para dar, mas que, a eles, lhes deram a vida por solidão.

Escrevo Poesia desde os 11-12 anos de idade, após a morte de meu pai, que pouco conheci, mas dele me ficou a imagem de um ser quase transcendental, revolucionário e extremamente solitário – um ser que praticava, contudo, a sua humanidade, entregando a sua própria camisa aos mais necessitados.

A sua morte foi o motivo operandi do início da minha escrita como poetisa. Porque necessitava de desabafar e não tinha com quem, precisava de me expressar, mas não sabia como, porque é no silêncio que a cura da Alma encontra as palavras e a melodia da dor, a música dos sonhos e as sílabas e métricas da fé, vida e morte.