O Instituto dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção, I.P. (IMPIC) tem na sua génese uma história com mais de meio século. Ao longo da sua existência, de que forma, o mesmo, tem vindo a perpetuar um cenário de rigor, isenção e credibilidade para o setor?
O atual IMPIC, I.P. tem uma longa história, com nascimento em 1956 apenas atribuindo alvarás para obras públicas. Ao longo dos anos foi aumentando a sua capacidade regulatória na atividade da construção, e em 1992 o seu âmbito de atuação foi alargado à atividade da mediação imobiliária. Só em 2015 ficou materializada a sua missão de regular igualmente a contratação pública. Assim, a missão do IMPIC é a de regular e fiscalizar o setor da construção e do imobiliário, dinamizar, supervisionar e regulamentar as atividades desenvolvidas neste setor, produzir informação estatística e análises setoriais e assegurar a atuação coordenada dos organismos estatais no setor, bem como a regulação dos contratos públicos. Os valores do IMPIC, independentemente da sua área de atividade, são claros: O Rigor, a Isenção e a Credibilidade. A forma de os implementar passa por capacitar os recursos humanos do IMPIC, monitorizar permanentemente os indicadores da sua atividade, da apreciação crítica dos questionários de satisfação – e das queixas efetuadas – por parte das empresas e cidadãos que interagem com este Instituto, e colaborar de forma equidistante com os todos os stakeholders da atividade do IMPIC.
Segundo o IMPIC, a Contratação Pública tem um peso significativo na economia, representando cerca de 14% do PIB europeu. Neste sentido, quais têm vindo a ser as mudanças que mais impactaram esta área em Portugal?
A contratação pública, em qualquer Estado da União Europeia, tem um peso significativo, pois estamos numa trajetória clara das administrações públicas serem cada vez mais contratualizantes, ou seja, as necessidades públicas são prosseguidas, em grande medida, através de contratos públicos. O grande desafio colocado é transformar a contratação pública como um instrumento de alavancagem da prossecução de políticas públicas, como sejam a sustentabilidade ambiental e económica, a competitividade das PMEs, a inclusão social e a promoção da inovação. Em síntese, deve-se almejar a criação de uma contratação pública estratégica.
É do conhecimento geral que o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) é um instrumento no contexto pós-pandemia. No que diz respeito à Contratação Pública, dado a sua preponderância, de que forma é abrangida por esta componente e que metas, assim, se pretendem alcançar?
O PRR é um plano financeiro, de cariz europeu, que implica a atribuição de subvenções e empréstimos, o que irá permitir que a economia portuguesa possa recuperar, de forma sustentada, da estagnação provocada pela pandemia Covid-19. Este plano será determinante para uma mudança estrutural, com impacto em áreas relevantes nos domínios da inovação e da transição digital, da demografia, qualificações e inclusão, da transição climática e sustentabilidade e da coesão territorial. Sobretudo as transições climática e digital são assumidas como os principais motores para a recuperação económica e social, às quais devemos acrescer a resiliência (social, económica – e do tecido produtivo – e territorial). Sendo grande parte das verbas atribuídas a entidades públicas, que para fazer uso delas têm de contratualizar, parece óbvia a importância que a contratação pública irá ter na sua concretização.
Em que medida é possível assegurar que a Contratação pública é uma área nuclear de intervenção do Estado, nomeadamente em alturas de crise, uma vez que tem potencial para impulsionar o tecido económico e o desenvolvimento das comunidades? Com os investimentos do PRR, que desafios poderão surgir?
Como já referi, a contratação pública pode, e deve, ser utilizada como uma ferramenta de alavancagem da prossecução de políticas horizontais e, nessa medida, é uma área que qualquer Estado não pode descurar. A esmagadora maioria do investimento processa-se através da contratação pública, e como tal, havendo disponibilidades financeiras, como ocorre com os investimentos do PRR, os grandes desafios são os de priorizar e planear os processos aquisitivos, de forma mais robusta possível, para permitir que, em tempo, se possam celebrar e executar, de forma exata e pontual, o maior número de contratos possíveis, dentro das necessidades identificadas e programadas.
Certo é, recentemente, o Conselho de Ministros discutiu um projeto de Decreto-Lei que cria um regime excecional, facultativo e temporário, para permitir a revisão de preços nas empreitadas de obras públicas e nos contratos de aquisição de serviços, por forma a assegurar que não existam interrupções no investimento público que está a ser feito em Portugal. Como analisa este projeto e que impacto trará?
O Decreto-Lei nº 36/2022, de 20 de maio, veio efetivamente estabelecer um regime excecional e temporário de revisão de preços, desde logo aplicável às empreitadas de obras públicas, mas aplicável igualmente, com as necessárias adaptações, aos contratos de aquisição de bens e de serviços. Este diploma visa fazer face aos aumentos abruptos dos preços das matérias-primas, dos materiais e da mão-de-obra, que têm gerado graves impactos na economia, criando-se medidas extraordinárias, urgentes e indispensáveis para garantir as condições de execução e conclusão dos contratos, sob pena, por um lado, da prossecução do interesse público ficar comprometida pela não realização ou conclusão das obras programadas, e por outro ser posta em crise a própria sustentabilidade e viabilidade dos operadores económicos. Este regime aplica-se aos contratos públicos, em especial de empreitadas, que venham a ser celebrados ou já em execução, durando até 31 de dezembro de 2022. Nesta medida, analiso este diploma como uma ferramenta útil e eficaz para permitir que a execução dos planos e programas de apoio financeiro instituídos para a recuperação da economia não seja prejudicada pela conjuntura desfavorável resultante das várias crises que perduram desde 2019.
Face a todas as mudanças, desafios e oportunidades que se irão manifestar, como perspetiva a área da Contratação Pública no futuro a curto/médio prazo? O que urge, na sua perspetiva, estabelecer?
Na esteira do que disse, a contratação pública tem tendência para se tornar mais complexa, tendo como finalidade não apenas satisfazer a necessidade nuclear que está na base do contrato, mas também com o cumprimento de metas de sustentabilidade, independentemente da sua natureza, algumas delas impactando não no presente, mas num futuro mais ou menos próximo. Para que todo este ecossistema da contratação pública dita “estratégica” possa funcionar de forma harmoniosa, urge, sobretudo, melhor planear as aquisições e proceder a uma maior profissionalização de todos os que, de uma forma ou de outra, do lado da Administração Pública, participam nos procedimentos pré-contratuais e na execução contratual.
Neste processo, qual continuará a ser o posicionamento do IMPIC no mercado, com a finalidade de contribuir para uma Contratação Pública transparente e eficiente?
O IMPIC pretende continuar a recolher e tratar os dados da contratação pública, para melhor ser possível definir as políticas públicas, aumentar os campos de informação na área pública do portal BASE, permitindo, assim, uma mais abrangente transparência e “accountability” e, está nos seus planos, capacitar “o comprador público”, quer por mecanismos internos, como sejam linhas de apoio no esclarecimento de dúvidas e na disseminação de boas práticas, mas também dando formação, tendo para isso celebrado protocolos, destacando-se o INA, I.P. e o IGAP, bem como associando-se como parceiro em cursos pós-graduados com a Academia, tendo terminado agora um curso pós graduado com a Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. No âmbito do seu Centro de Competências Procure+i, em parceria com a ANI, pretende capacitar as entidades com interesse nas compras públicas de inovação (CPI).