Nova forma de cálculo das retenções na fonte sobre os salários

A partir do mês de julho, as retenções na fonte sobre os salários vão ter uma nova forma de cálculo. Esta alteração irá inevitavelmente impactar os colaboradores nomeadamente no que concerne ao valor mensal que irão auferir, mas impactará igualmente as entidades empregadoras que terão agora que adaptar-se a esta nova realidade, e atualizar os seus sistemas para fazer o correto processamento salarial.

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Até ao final do primeiro semestre de 2023 as tabelas de retenção na fonte de IRS vão aplicar-se como habitualmente, havendo tabelas determinadas pela condição perante o trabalho, ou seja, trata-se de um trabalhador ativo ou de um pensionista, pelo número de titulares de rendimentos no agregado familiar, pelo estado civil, pelo número de dependentes, pelo nível salarial mensal, e havendo igualmente diferenciação por localização da morada fiscal (Continente, Madeira e Açores).

As tabelas em questão traduzem-se em matrizes com várias linhas, pelas quais se divide o rendimento mensal, sendo a partir dele identificada uma taxa concreta a aplicar, considerando as variáveis genéricas acima mencionadas.

Estas tabelas já foram alvo de diversas atualizações desde o início do ano de 2023. Até abril vigoraram as tabelas que foram publicadas em janeiro, e que tinham sido ajustadas ao novo mínimo de existência que se fixa agora nos 10 640 €, refletindo o aumento do salário mínimo para os 760€, estas novas tabelas tiveram igualmente em conta a atualização dos escalões do IRS e a redução da taxa marginal do segundo escalão do IRS, previstos no Orçamento do Estado para 2023.

Devido ao aumento intercalar de 1% dos salários da função pública com retroativos a janeiro, que o Governo concedeu com o propósito de ajudar estes trabalhadores a fazer face à problemática da inflação, houve necessidade de fazer uma nova atualização. Esta atualização visa garantir que o referido aumento de salários se traduzisse num ganho efetivo de rendimento para os trabalhadores e que o mesmo não fosse “absorvido” através do aumento de escalão que implicaria uma maior retenção de imposto mensal. Contudo, estas novas tabelas terão aplicabilidade apenas no mês de maio e junho.

Mas as mudanças não ficam por aí, e no segundo semestre, será então introduzida a nova forma de cálculo, que segundo o legislador, vai seguir uma lógica de taxa marginal conjugada com uma dedução de uma parcela a abater, à semelhança do que ocorre aquando do cálculo do imposto anual sobre o rendimento devido. Além desta parcela a abater, genérica, nas famílias com dependentes a cargo, acresce-se outra parcela a abater, por dependente, com um valor fixo, alinhada com o valor inscrito no Código do IRS.

Este novo método irá mitigar o erro que existe no modelo atual de tabelas em vigor até ao segundo semestre de 2023 e que, tipicamente, subestima as deduções e compele um empréstimo avultado de imposto indevido ao Estado e, naturalmente, determina o recebimento de um inferior valor líquido de salário mensal. Este empréstimo, cujo valor era incrementado todos os meses, era posteriormente devolvido pelo Estado através da liquidação anual de IRS, sob a forma de reembolso.

Isto não significa que os reembolsos anuais serão totalmente eliminados, mas é normal o montante a reembolsar diminua, e que em alguns casos cheguem mesmo a desaparecer. Ou seja, esta nova regra permitirá um reembolso menor aquando da entrega da declaração anual de rendimentos e consequentemente um aumento do valor que se recebe no final de cada mês.

Esta nova fórmula de cálculo permite, igualmente, garantir algo de extrema relevância e que se prende com o simples facto de que sempre que se faça um aumento do salário, o mesmo não se traduza numa redução da remuneração líquida do trabalhador por este ter subido de escalão, algo que era frequente acontecer com o antigo método de cálculo.

Sintetizando de uma forma muito simples, o que vai mudar no segundo semestre e que expetável que se mantenha em vigor nos próximos anos, é uma aproximação do método de cálculo da retenção mensal aos cálculos que se fazem com os escalões do IRS no momento do apuramento do imposto anual.

Deste novo modelo, irá resultar uma taxa efetiva de imposto, que deverá ser sempre de conhecimento do trabalhador e que lhe indica a percentagem efetiva de imposto pago face ao rendimento bruto auferido. Supondo que a taxa é 20%, o que se conclui, é que por cada 100€ de rendimento bruto mensal, será entregue ao Estado 20€ por conta de retenção de IRS.

Para se chegar à taxa efetiva, será necessário considerar que o rendimento terá sido sujeito a várias taxas marginais.

É importante, por isso, recordarmos o conceito de taxa marginal em sede de cálculo do imposto anual sobre os rendimentos das pessoas singulares, que corresponde à taxa de imposto que incide sobre o aumento do rendimento anual do sujeito passivo. Ou seja, com tudo o resto constante, corresponde à percentagem de imposto que é pago, ou deduzido à retenção efetuada, pelo aumento de rendimento sujeito a englobamento em sede de IRS.

Transpondo agora este conceito para o cálculo mensal da retenção, e de uma forma mais simplista, estas taxas de imposto marginais aplicam-se às diferentes partes do rendimento, aumentando de escalão em escalão, acompanhando deste modo os salários mais elevados.

Estas novas tabelas terão 13 escalões, o primeiro que representa os rendimentos auferidos até 720€ que ficarão isentos, e o último para rendimentos superiores a 20 064,21€. Na prática, quem recebe salários mais elevados, verá o seu rendimento dividido por um maior número de escalões (até 13), sendo que à semelhança do que acontece com o cálculo do IRS anual, a taxa de retenção será superior de escalão de retenção para escalão de retenção, a já conhecida progressividade. Sendo que a taxa marginal progressiva variará dos 0% aos 47,17%.

Após a aplicação das diferentes taxas marginais, soma-se o valor do imposto retido de cada escalão e divide-se pelo rendimento bruto mensal. O resultado dar-nos-á a taxa efetiva de imposto que varia entre os 0% e os 41,4%.

Regra geral, a taxa efetiva é sempre inferior à taxa marginal, exceto no caso em que o rendimento mensal seja tão baixo que seja apenas aplicável o primeiro escalão, neste caso as taxas serão idênticas.

Cabe alertar que esta taxa poderá não ser ainda a taxa efetiva de imposto apurada anualmente no momento da entrega da sua declaração de IRS. Isto porque, no cálculo anual são tidos em conta outros fatores relevantes, nomeadamente possíveis benefícios fiscais adicionais (como por exemplo os concedidos por subscrição de PPR – Planos de poupança reforma), e terão em consideração outros possíveis tipos de rendimentos passiveis de tributação às taxas progressivas. Para além disso, se no agregado familiar os dois titulares registarem uma diferença considerável no valor de remuneração mensal auferido, terá de haver necessariamente um ajustamento no cálculo do imposto anual.

Olhemos agora para as a fórmulas de cálculo que devem ser aplicadas.

Quando se trata de rendimentos do trabalho dependente auferidos por titulares com um ou mais dependentes, a retenção na fonte corresponde ao resultado da seguinte fórmula:

[Remuneração mensal (R) x Taxa marginal máxima] – Parcela a abater – (Parcela adicional a abater por dependente x número de dependentes).

Quando se esteja perante rendimentos do trabalho dependente auferidos por titulares sem dependentes ou de pensões, a retenção na fonte corresponde ao resultado da seguinte fórmula: Remuneração mensal (R) x Taxa marginal máxima – Parcela a abater

Vejamos a aplicabilidade deste novo método de cálculo com um exemplo prático: Um trabalhador cuja remuneração bruta mensal é de 1 400€, casado, dois titulares e com um dependente a cargo.

Ao analisarmos as novas tabelas, neste caso específico a Tabela III – Trabalho Dependente – Casado dois titulares, com um ou mais dependentes, percebemos que com o rendimento de 1 400€, este trabalhador fica enquadrado no sexto escalão, que prevê uma remuneração mensal até 1 600,36. A taxa marginal a aplicar é de 28,50%, com uma parcela a abater de 191,23€. A parcela adicional a abater aplicável por dependente, segundo a tabela é de 21,43€.

Neste caso a retenção na fonte apurada seria de: [1 400 x 28,5%] – 191,23 – (21,43 x 1) = 186,34€

A taxa efetiva para este trabalhador seria de 13,31% (186,34€ ÷1 400€).

Ainda de ressalvar que no Despacho nº 14837-C/2022 de 29 de dezembro, estão igualmente previstas algumas situações, que se devem observar aquando do cálculo da retenção, como por exemplo no caso de dependentes com grau de incapacidade permanente igual ou superior a 60 %, em que é acrescentado à parcela a abater o valor de 84,82€, no caso de não casado ou casado, único titular, e o valor de 42,41€ no caso de casado com dois titulares.

Parece claro que este novo sistema é mais complexo no que toca à sua fórmula de cálculo, quando comparado com o que tem vindo a ser aplicado. No regime de cálculo que ainda vigora até ao mês de junho, o cálculo resumia-se à aplicação direta de uma taxa. Esta nova forma de cálculo é mais justa para o trabalhador, contudo em termos de compreensão não será tão linear.

Para além disso, existe um tema relevante que se levanta para as empresas/entidades empregadoras, que se prende com a necessidade de atualização dos softwares utilizados para o processamento salarial.

Mas ao contrário das atualizações a que já nos habituámos das tabelas de IRS que acontecem com bastante frequência, desta fez a própria fórmula matemática terá de ser adaptada, passando a ter em conta a remuneração mensal, o número de dependentes, a aplicação de uma parcela a abater, o valor fixo a deduzir por cada dependente.  Para além disso, e devido à obrigação de divulgar a taxa efetiva mensal de retenção na fonte ao trabalhador, com o objetivo de garantir uma maior clareza sobre o valor de imposto retido, os layouts de recibos de vencimento tem igualmente que ser ajustados.

Não restam dúvidas de que este método vai aportar maior complexidade ao cálculo do imposto, contudo será mais justo para os trabalhadores no sentido que a retenção estará mais ajustada ao verdadeiro imposto a pagar.