“Mulheres informadas e conscientes dos seus direitos são Mulheres empoderadas”

Núbia Alves, além de ser Advogada e Fundadora da NNA | Escritório de Advogados, é profundamente entusiasta e defensora dos direitos humanos – nomeadamente dos das Mulheres. No âmbito do Dia Internacional da Mulher, a própria deu-nos a conhecer o panorama no universo do Direito no que diz respeito à igualdade de género e contou-nos qual tem vindo a ser a abordagem da sua marca nesse sentido.

1226

Gostaríamos de começar por conhecer um pouco mais sobre o seu percurso de vida. O que a motivou a escolher a Advocacia como profissão e quais foram as maiores conquistas ao longo desse caminho?
Sempre me questionei sobre as desigualdades e as injustiças sociais, que podem ser determinadas por razões que não dependem de nós, como o lugar onde nascemos ou opções feitas por outras pessoas, mas que interferem nas nossas vidas. Gosto de pessoas, de “gente”, e detesto a sensação de impotência, de injustiça. Por isso, a escolha pela carreira jurídica foi uma consequência natural dessa minha inquietação, vou chamar assim. Sentia que podia fazer alguma diferença desempenhando uma função em que pudesse contribuir para a realização da Justiça. A expetativa era que seguisse para a magistratura, mas comecei a advogar, primeiro na área criminal, e a partir daí a minha vida profissional foi se delineando.
A advocacia permite-me dar voz a pessoas que muitas vezes estão em situação de grande dor e quando é possível restaurar um pouco a vida dessas pessoas é gratificante. Como também, permite-me realizar planos e desejos de mudança, ajudar a organizar a estrutura familiar e até empresarial de alguém, o que é outro lado feliz da advocacia. Já conheci pessoas muito especiais no exercício da minha profissão e para mim as maiores conquistas profissionais são, sem dúvida, as pessoas.

Sabemos que a Núbia Alves é entusiasta e defensora dos direitos humanos. Assim, no âmbito do Dia Internacional da Mulher, como analisa a importância da data, considerando os avanços e desafios enfrentados pelas Mulheres em todo o mundo?
A data é um marco histórico necessário, uma forma de lembrar e celebrar as conquistas femininas chamando a atenção do mundo para a luta das mulheres por melhores condições de vida e de trabalho e por igualdade no que diz respeito aos direitos económicos, políticos e sociais.
Ao longo da história, as mulheres sempre estiveram à frente de manifestações em prol da igualdade e contra toda a espécie de discriminação e de limitação de liberdades, seja lutando pelos seus próprios direitos ou reivindicando justiça em nome dos seus filhos ou maridos.
Esta história de força e resistência está longe de acabar, os direitos das mulheres estão sempre sob escrutínio e ameaça, alteram-se ao sabor das correntes ideológicas e políticas. Imagine só: as mulheres tiveram e continuam a ter de lutar até pelo direito de poderem decidir sobre o seu próprio corpo, por direito a respeito!
Por isso, é obrigação de todas as mulheres darem continuidade a esta luta em honra daquelas que vieram antes de nós e que penhoraram a sua vida para melhorar a vida de todas nós.

Neste seu contexto, que é o Direito, como observa o papel das mulheres e a sua representatividade, tendo em conta que esta é uma área tradicionalmente dominada por homens? Quais são, na sua perspetiva, os desafios que hoje as mulheres Advogadas ainda enfrentam?
Apesar de atualmente as mulheres representarem a maioria na carreira jurídica, nota-se que ainda não há paridade na formação dos Tribunais, nas sociedades de advogados, nos cargos de chefia ou liderança de classes profissionais, entre outros. Temos, assim, o desenho de uma profissão maioritariamente formada por mulheres, mas em que as mulheres são a minoria em funções com maior poder ou representatividade.
A verdade é que as mulheres ainda são consideradas emocionalmente frágeis e incapazes de tomar decisões complexas, numa profissão vista por muitos como própria para pessoas aguerridas e de pulso forte, digamos assim. O que é um preconceito sem precedente.
A sociedade de certa forma evoluiu. Espera-se uma Justiça cada vez mais humanizada e nesse sentido a sensibilidade, via de regra, uma qualidade nas mulheres, é muito positiva. Quebrar esses preconceitos e mudar os paradigmas é o grande desafio que as mulheres Advogadas enfrentam. As mulheres Advogadas querem ser notadas pelas suas capacidades intelectuais e produtivas e querem também ser consideradas pela sua própria natureza: querem ter o direito de exercerem a maternidade sem sobressaltos e com respeito, de ter condições dignas de trabalho, de ser assistidas na doença, que são direitos de qualquer pessoa trabalhadora.

Como fundadora de um escritório de advocacia, qual é a abordagem adotada pela NNA | Escritório de Advogados para promover a igualdade de género e o empoderamento das mulheres no setor e na prestação de serviços jurídicos?
Exerço a advocacia em prática individual, mas o plano desde o início do escritório que fundei em 2017 foi partilhá-lo com outras pessoas engajadas nesta forma de trabalhar com liberdade e autonomia. O que eu noto é que a nossa classe ainda é muito fechada para a partilha e para o trabalho em colaboração, mas esta realidade aos poucos está a mudar por exigência da própria profissão.
Especialmente no caso das mulheres, o empoderamento feminino é sustentável em independência, autonomia e liberdade financeira e a nossa profissão tanto pode nos permitir isto para nós próprias como pode nos auxiliar como instrumento de informação para outras mulheres.
No meu caso, eu utilizo as plataformas de redes sociais e o Blog NNA para informar as pessoas, sobretudo as mulheres, a respeito dos seus direitos e da necessidade de combaterem a desigualdade de género identificando formas de discriminação e violência e apontando as ferramentas de defesa. Dou o meu exemplo, mostrando o que significa e como é possível enfrentar as dificuldades afirmando-se como mulher, mãe, profissional e imigrante, sem perder as próprias características. Faço isto de forma voluntária de modo a retribuir o facto de me considerar, neste universo que acabei de descrever, uma pessoa privilegiada. Estou certa de que mulheres informadas e conscientes dos seus direitos são mulheres empoderadas.

Perante as lutas contínuas por igualdade, justiça e empoderamento feminino, que mensagem ou conselho gostaria de deixar a todas as mulheres que estão a iniciar as suas carreiras jurídicas?
Quero deixar uma mensagem de atenção, parafraseando Simone de Beauvoir: “Nunca se esqueça que basta uma crise política, económica ou religiosa para que os direitos das mulheres sejam questionados. Esses direitos não são permanentes. Você terá que manter-se vigilante durante toda a sua vida.”
Nós, Advogadas, temos um instrumento poderoso de transformação nas nossas mãos que é a nossa capacidade técnica e argumentativa para reivindicar direitos. Portanto, o conselho que deixo para as mulheres que estão a iniciar as suas carreiras jurídicas é exatamente este: desde o primeiro dia no exercício desta honrosa profissão, sejam “instrumento”, transformem vidas, aceitem esta missão. Nós, mulheres, acolhemos. Não é verdade que temos de deixar as emoções de lado no nosso trabalho, mas ao contrário, não devemos ter receio de colocar o coração em tudo o que fizermos. Só assim fazemos a diferença, só desta forma podemos contribuir para melhorar o mundo em que vivemos.