“O ISEP assume-se como comunidade socialmente responsável”

Maria João Viamonte, Engenheira e Presidente do Instituto Superior de Engenharia do Porto (ISEP), conversou com a Revista Pontos de Vista sobre esta Instituição de Ensino Superior, que se destaca não só por ter tradição em inovação nas suas áreas associadas, mas também por promover a igualdade de género neste que é um setor historicamente dominado por homens.

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Gostaríamos de começar por falar de si, primeiramente, como Pessoa, Mulher, Engenheira e Presidente do Instituto Superior de Engenharia do Porto (ISEP). O que é que, ao longo da sua vida, moldou o seu percurso profissional e pessoal e em que medida esses marcos influenciaram a sua abordagem à liderança no contexto académico?
Licenciei-me em Informática numa turma maioritariamente de rapazes. Destes, apenas quatro estudantes finalizaram o curso em 1987, dois rapazes e duas raparigas. Eu era uma das raparigas. Era um curso novo, aliciante, senti que o futuro ia passar pelas áreas mais tecnológicas e como no secundário era boa aluna a Matemática, decidi arriscar. Em 1992 estava a tirar o mestrado em Engenharia Informática e trabalhava, ao mesmo tempo, no departamento de informática de uma empresa química e defendi o meu doutoramento, em Inteligência Artificial, em dezembro de 2004.  Comecei a trabalhar no ISEP como professora e investigadora em 1997, fui vice-presidente do conselho técnico-científico durante nove anos até assumir a liderança da instituição de Ensino Superior, em abril de 2018.

Falemos, agora, do ISEP. Como Presidente desta instituição reconhecida pelo seu compromisso com a excelência no ensino e inovação em Engenharia, quais diria que são os principais pontos diferenciadores na sua abordagem ao ensino? O que diferencia o ISEP?
Os estudantes procuram o ISEP, acredito, por causa da tradição na inovação no ensino de Engenharia. O ISEP integra o consórcio CDIO (Conceiving, Designing, Implementing, Operating), que nos permite estar na vanguarda mundial do ensino-aprendizagem de orientação prática para formar a próxima geração engenheiros. O reconhecimento de excelência está patente na certificação europeia de qualidade OE+EUR-ACE, a principal referência de qualidade do ensino em engenharia a nível europeu e temos ainda um curso com a acreditação Americana ABET, o que muito nos prestigia.
O ensino é suportado na utilização de plataformas digitais facilitadoras do estudo autónomo e colaborativo, que possibilitam aos docentes o acompanhamento do processo formativo e da evolução de cada estudante. Ensinamos através do estudo de casos reais, de projetos interdisciplinares e de unidades curriculares integradoras, que constituem uma mais-valia no desenvolvimento de competências fundamentais. É também uma prioridade a constante formação da comunidade docente e a consciencialização para a importância da partilha das melhores práticas pedagógicas.

De que forma, o ISEP, enquanto instituição de ensino de referência, se tem vindo a posicionar no contexto da evolução tecnológica e das necessidades do mercado de trabalho em constante transformação?
No ensino, os desafios passam pelo aprofundamento da multidisciplinariedade no desenvolvimento de programas conjuntos e de duplo grau, nacionais e internacionais. O ISEP aposta na disponibilização de unidades curriculares de escolha livre e no aumento do estudo autónomo, para permitir aos estudantes construírem os seus percursos formativos. Estas matérias são um desafio tanto para as instituições de ensino superior, como para as agências de avaliação e acreditação dos cursos, mas são fundamentais para que os processos de aprendizagem deem resposta à evolução da sociedade, à digitalização e à crescente complexidade e sofisticação das profissões, cada vez mais transversais em relação aos diferentes tipos de conhecimento e meios tecnológicos. Apostamos também numa oferta formativa ao nível do mestrado em áreas emergentes e temos um forte portefólio de pós-graduações que permite a atualização dos diplomados e ir ao encontro das evoluções contínuas do mercado de trabalho e necessidades das empresas.

Sabemos que, a igualdade de género é uma pauta essencial em todos os setores, nomeadamente na Educação e na Engenharia. Assim, como avalia o atual momento da igualdade de género nestes dois universos e quais os desafios que ainda persistem, no seu entender?
A realidade mostra-nos que, apesar da igualdade formal alcançada em Portugal, ainda persistem e resistem muitas desigualdades que penalizam as mulheres. Garantir a igualdade de género é essencial para criar valor, contudo tem de ser um trabalho conjunto da família, sociedade, estado e também das instituições de ensino.
É urgente reverter a tendência da fraca participação das raparigas e mulheres nas Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) e nas Engenharias, através de ações conjuntas que possibilitem que tanto rapazes como raparigas desenvolvam as suas capacidades nestas áreas, das quais depende a competitividade do nosso País.
Temos de continuar a trabalhar para que as oportunidades não sejam determinadas ou condicionadas ao facto de se ser mulher ou homem. Sabemos que o trabalho em conjunto com crianças e jovens é imprescindível para que sejam alteradas atitudes e práticas discriminatórias.

Refletindo sobre o Dia Internacional da Mulher, como Mulher e Presidente de uma marca de referência em Portugal, qual é a sua perspetiva sobre a importância deste dia na sociedade atual?
Portugal tem avançado na igualdade de género, mas ainda está abaixo da média europeia. Entendo que comemorar o Dia Internacional da Mulher, 8 de março, se reveste de um duplo significado: por um lado assinalar a data em que se celebra as muitas conquistas femininas, ao longo dos últimos séculos; e simultaneamente contribuir para alertar e sinalizar que ainda persistem graves problemas de género.

O ISEP tem desempenhado um papel fundamental na formação e especialização de profissionais de Engenharia ao longo de décadas. Sabendo que a Engenharia foi, em tempos – ou ainda é – uma profissão maioritariamente dominada por homens, de que forma o Instituto tem promovido a participação e o sucesso das Mulheres na Engenharia e áreas afins?
O ISEP assume-se como comunidade socialmente responsável, onde as preocupações com a igualdade de género estão naturalmente presentes. Somos uma comunidade de cerca de 8000 mil pessoas que procura a excelência. Internamente cumprimos o regime da representação equilibrada entre homens e mulheres nos órgãos de gestão, o que nem sempre é fácil uma vez que somos uma escola onde há muitos mais homens do que mulheres. Participamos no projeto “Engenheiras Por Um Dia”, integrado na Estratégia Nacional para a Igualdade e Não Discriminação, que promove, junto das estudantes do ensino não superior, a opção pelas engenharias e pelas tecnologias, desconstruindo a ideia de que estes são domínios masculinos.
Deste projeto faz parte também a iniciativa “semana dedicada às mulheres em tecnologia e engenharias”, onde também participamos com diversas atividades, anualmente.

O que ainda podemos esperar do ISEP para o futuro? Quais os projetos que pretendem desenvolver?
No ensino e na oferta formativa os desafios passam pelo aprofundamento da multidisciplinariedade no desenvolvimento de programas conjuntos e de duplo grau, nacionais e internacionais. A aposta será também na disponibilização de doutoramentos em áreas emergentes e importantes para o Pais. Tendo já sido submetidos para acreditação quatro novos doutoramentos alicerçados na investigação de excelência que desenvolvemos na nossa escola. Realizamos atividades aplicadas de investigação, desenvolvimento e inovação em estreita ligação com o tecido social, cultural e empresarial, pois a complementaridade entre ciência, teoria e prática é essencial para a evolução pessoal, profissional e organizacional.