Com uma experiência de mais de trinta anos, podemos afirmar que olha para a área da Reprodução com especial interesse?
Claro que sim. Não só porque tem preenchido quase toda a minha vida profissional, mas também porque é extremamente estimulante dos pontos de vista técnico/científico e humano.
O que fez com que se dedicasse em pleno a esta área da Medicina?
Inicialmente foram sobretudo os aspetos técnico-científicos que entrevia enquanto aluno de Medicina. Depois teve também enorme peso a consciencialização profunda de quão importante o seu objetivo final, isto é, ajudar pessoas a realizar sonhos e projetos de vida.
Considera que no campo da Medicina da Reprodução, as técnicas terapêuticas para casais com problemas em procriar sofreram enormes progressos nos últimos anos?
Não sei bem o que se considera os “últimos anos”. Mas a Medicina da Reprodução em geral, incluindo aspetos médicos, cirúrgicos e as técnicas de Procriação Medicamente Assistida, foi e é um campo em profundo progresso no conhecimento científico e nas alternativas terapêuticas que possibilita a quem dela precisa.
Há limitações na eficácia de todo o tipo de tratamentos essencialmente resultantes de um protelar da idade em que se procura ter filhos. Este fenómeno social, baseado em opções obviamente legítimas, conflitua com a redução natural na nossa espécie da capacidade reprodutiva à medida que os anos das senhoras aumentam. Tal circunstância começa a ser importante depois dos 35 anos e torna-se extremamente marcada depois de completados os 40 anos. Nos homens não há aparente redução da fertilidade a não ser em idades muito mais elevadas.
Acredita que estas técnicas vieram possibilitar expectativas muito positivas quanto à resolução da maioria dos problemas de infertilidade?
Há mais de 8 milhões de crianças nascidas no mundo em resultado de tratamentos de Fertilização in vitro (FIV) ou microinjecção de espermatozóides (ICSI). Isso significa muito para um enorme número de beneficiários destas técnicas. Se é possível a resolução da maioria dos problemas de infertilidade, é impossível saber. Depende de muitas variáveis.
Alguns números indicam que a infertilidade conjugal atinge, na população mundial, cerca de 10 a 15% dos casais em idade fértil. Acha que esta percentagem tem vindo a subir ou a diminuir nos últimos anos?
Não há quaisquer dados fiáveis que permitam afirmar que a infertilidade está a aumentar no mundo em geral.
O problema é que no mundo ocidental o fenómeno da parentalidade tardia tem vindo a acentuar-se e isso, como disse atrás, é um fator muito importante na dificuldade em se engravidar, mesmo sem qualquer doença subjacente, já que resulta de alterações no núcleo das células reprodutoras femininas – os óvulos, que já estão contidas nos ovários no momento do nascimento.
Considera que os portugueses estão devidamente informados quanto aos procedimentos, soluções e tratamentos para a infertilidade?
Infelizmente penso que não. Este é um tema a que a maior parte das pessoas só é sensível quando “lhe cai em sorte”.
Por exemplo, foram feitas várias campanhas no sentido de esclarecer que seria desejável engravidar antes dos 35 anos da mulher, que fumar é um péssimo hábito também pelas repercussões negativas na capacidade reprodutiva de homens e mulheres, que a obesidade é igualmente um fator negativo quer para engravidar quer para o evoluir da gravidez quer para a saúde da criança a nascer, que o consumo de álcool é muito prejudicial aos intuitos de engravidar. Mas não me apercebi de qualquer valorização por parte da sociedade.
Por um Portugal amigo das crianças, das famílias e da natalidade concorda que deve haver um maior alargamento do apoio médico em situações de infertilidade?
Com certeza que sim. Numa época em que por razões sociais e financeiras uma parte da população decidiu não ter mais filhos, há um subgrupo de pessoas (os inférteis) que continua desejoso de realizar os seus projetos de vida e se vê confrontado com restrições imensas no acesso aos tratamentos. Nomeadamente as listas de espera para FIV/ICSI são completamente inaceitáveis.