A Isabel Fernandes conta já com um vasto percurso no mundo jurídico. Queremos conhecê-la melhor. Quem é enquanto mulher e profissional?
Enquanto Mulher, destaco dois grandes papéis de particular importância na minha Vida, em tudo aquilo que Sou e que tenho vindo a Alcançar: o de “Filha “e o de “Mãe”.
Tendo nascido e crescido numa cidade à época bastante conservadora – Braga – tive uma educação pautada pela presença de valores como organização, dedicação, compromisso, lealdade, respeito, humildade (entre outros) que efetivamente foram determinantes na minha personalidade comunicativa e caráter autónomo e nas opções que ao longo da minha vida, pessoal e profissional, fui tomando!
Aos meus Pais devo necessariamente o enorme esforço e dedicação para que conseguisse alcançar os meus objetivos e acima de tudo o apoio incondicional em momentos marcantes do meu crescimento como pessoa e profissional, mesmo que por vezes assolados por sentimentos de angústia decorrentes da separação da única filha, em muitos dos casos por períodos prolongados. Recordo com muito carinho e emoção o quão difíceis eram os momentos de despedida, que tendo-os iniciado em tenra idade (18 anos) com a deslocação para a cidade de Coimbra (Faculdade de Direito), perduraram por muitos mais anos, em partidas para locais cada vez mais longínquos (Lisboa, Macau, Moçambique), tendo apenas regressado a Portugal em 2006!
Aos meus filhos (um casal) a oportunidade única de me sentir “Mãe”, pelas birras e traquinices de crianças, pela sua ingenuidade e perguntas desconcertantes de adolescentes e, acima de tudo, pelos seus abraços, sorrisos e amor! Papel exigente e apenas possível de ser assumido com sucesso contando com o incansável apoio, partilha, cumplicidade e carinho do marido e Pai!
Na vertente profissional assumo uma particular apetência e gosto pela constituição, desenvolvimento e liderança de equipas de trabalho, tentando sempre incutir entre os respetivos elementos um sentimento de compromisso e partilha com os valores de exigência, dedicação e lealdade profissional que deverão, desde sempre, conformar a sua atuação e relacionamento com os demais colegas (seja de profissão ou de trabalho).
Atualmente assegura assessoria e consultoria técnica em todas as matérias do foro jurídico do Grupo Visabeira, em particular na expansão, reestruturação e viabilização societária, com intervenção em processos de constituição, aquisição, fusão e formalização de parcerias, a nível nacional e internacional. Como é pertencer a um Grupo com uma estrutura de mais de 40 anos de atividade?
É naturalmente um privilégio fazer parte de um grupo empresarial com credenciais evidenciadas nos mais diversos setores de atividade em que opera e acima de tudo ter tido a oportunidade de participar ativamente no seu crescimento, tanto a nível orgânico como geográfico.
Tendo iniciado a minha colaboração com o Grupo Visabeira em 2006, participei ativamente nos momentos marcantes do crescimento da respetiva estrutura empresarial, dos quais destaco em 2009 a aquisição das prestigiadas marcas centenárias “Vista Alegre” e “Bordallo Pinheiro” o que conferiu naturalmente uma maior visibilidade ao Grupo Visabeira, quer ao nível nacional como internacionalmente. Destaco igualmente o processo de ampla internacionalização que o Grupo desenvolveu, deste então, com consolidação dos negócios nos países onde já marcava presença (França, Bélgica, Espanha, Angola, Moçambique), em simultâneo com um forte crescimento e expansão para outros países, não só em território europeu (Alemanha, Suécia, Dinamarca, Itália, Reino Unido), como continente Americano (Brasil, EUA e México) e Asiático (India).
Assume ainda a responsabilidade pelo planeamento, supervisão e controlo das atividades do departamento jurídico do Grupo, em simultâneo com a coordenação dos serviços assegurados por consultores externos. Que mais-valias este cargo de seriedade extrema trouxe à sua carreira profissional?
Tendo marcado o início da minha experiência como responsável pela Direção dos Serviços Jurídicos de um grupo empresarial, o desenvolvimento de aptidões de negócio nos mais diversos setores em que o Grupo atua (vulgo “visão de negócio”), alinhadas com o background legal, bem como a constante partilha de interesses com os demais players que integram a respetiva estrutura empresarial, tem sido inegavelmente uma das mais-valias que o cargo trouxe à minha carreira profissional, bem como fator de sucesso no desempenho das diversas tarefas que a equipa jurídica do Grupo Visabeira tem vindo a assumir na respetiva estrutura empresarial, com o devido reconhecimento interno e distinção ao nível dos mais diversos e prestigiados fóruns, no país e no estrangeiro.
Na verdade, a função de advogado/jurista interno a uma estrutura empresarial não se pode mais circunscrever à mera gestão dos riscos legais decorrentes dos projetos, mas implica ter uma visão de negócio, avaliando e compreendendo, em cada momento, os principais termos e condições em que os projetos operam, bem como a estratégia e os principais objetivos que se pretendam alcançar com a implementação/gestão dos mesmos. Importa igualmente promover um relacionamento cada vez mais próximo com os demais colegas de trabalho também envolvidos na respetiva implementação/gestão, a fim de colocar as perguntas certas e comunicar eficazmente os riscos e as questões jurídicas envolvidas em qualquer decisão, tentando sempre apresentar soluções viáveis e de valor acrescentado.
Os valores que são assumidos, enquanto elementos definidores da marca Visabeira, são transversais a todos os profissionais e às várias áreas da organização, mostrando-se decisivos para a evolução do Grupo e o seu contínuo sucesso. No que ao departamento dos Serviços Jurídicos diz respeito, de que forma têm mantido um nível de qualidade de serviços superior nos diferentes mercados onde opera?
De facto os valores preconizados pelo Grupo Visabeira – “Criatividade”, Inovação”, “Dinamismo”, “Competitividade” e “Ambição” – são transversais aos diversos serviços/divisões que compõem a respetiva estrutura orgânica, incluindo a Direção dos Serviços Jurídicos.
Sendo o Grupo Visabeira um grupo económico multissetorial, de grande expansão multinacional, procurando liderança em todos os setores e mercados em que opera e marca presença, a Direção dos Serviços Jurídicos, como parte da respetivo estrutura orgânica, caracteriza-se ela próprio por uma contínua procura de soluções inovadoras, integradas e cada vez mais completas que tende a identificar e apresentar de acordo com as necessidades da empresa, criando, desse modo, valor acrescentado para a estrutura de negócios.
A Direção de Serviços Jurídicos do Grupo Visabeira tem vindo a assumir progressivamente uma função comercial dentro da estrutura empresarial em que se integra, sendo atualmente considerada e tratada como um “parceiro de negócios”, estruturado e com capacidade de trabalhar em diferentes (i) unidades de negócios, (ii) especializações e (iii) regiões do mundo, sendo, portanto, capaz de manter um bom nível de comunicação e interação com todas as demais divisões/departamentos do Grupo e, deste modo, garantir a máxima eficiência na prestação de assessoria jurídica aos seus principais interfaces.
Além da forma inovadora com que estruturamos internamente o departamento e gerimos a função de Direção, assumindo simultaneamente um papel consultivo e de gestão sustentado no alinhamento contínuo do expertise legal e do contexto dos negócios, a inovação também está presente na forma como estruturamos nosso relacionamento com assessores externos.
Nessa medida, valorizamos a advocacia proactiva e colaborativa em vez de advocacia reativa: advogados que podem fornecer soluções comerciais proactivas para os nossos problemas em vez de aconselhamento jurídico reativo a problemas que já surgiram. No seguimento do ponto anterior, procuramos advogados com conhecimentos sólidos dos setores de negócio em que operamos, e não meros especialistas em áreas de prática jurídica.
A título pessoal, que características diria serem fulcrais para se singrar no mundo dos negócios?
O Advogado interno de uma estrutura empresarial terá que ser “MAIS DO QUE APENAS UM ADVOGADO”, na medida em que o seu contributo terá que ir necessariamente além do mero conhecimento jurídico, atuando cada vez mais como consultor jurídico e empresarial junto da administração e demais estrutura de gestão.
O desenvolvimento de uma “PERSPETIVA DO NEGÓCIO” implica diversificar competências para além da estritamente legal (como é o caso da capacidade de liderança e de negociação, bem como alguns conhecimentos na área da contabilidade e financeira), permitindo ser parte ativa na discussão, ao nível da estrutura de gestão, de problemas complexos e na definição de soluções construtivas e de valor acrescentado.
A REFLEXÃO DO ADVOGADO INTERNO DEVE SER MAIS AMPLA DO QUE A MERA CIRCUNSCRIÇÃO A QUESTÕES PURAMENTE LEGAIS, devendo ponderar os impactos a longo prazo na estratégia de negócios da respetiva empresa e no valor acrescentado para os acionistas em resultado de uma transação, litígio ou outra questão corporativa que lhe tenha sido endereçada (em vez de meramente ponderar impactos legais de curto prazo).
É essencial ao Advogado interno possuir AGILIDADE DE APRENDIZAGEM. Para desenvolver os seus conhecimentos empresariais, alcançar perspicácia do negócio e desenvolver aptidões de gestão, o Advogado interno que aspira a uma posição de liderança deve aprender com a variedade de experiências que vai tendo que enfrentar e lidar, aplicando posteriormente esses mesmos conhecimentos para realizar, com sucesso, tarefas em condições novas ou no seguimento das inicialmente atribuídas.
Acredita que atualmente, os desafios continuam a ser maiores quando é uma mulher a enveredar pelo mundo dos negócios bem como em cargos de liderança, como no caso da Isabel Fernandes?
A liderança é apenas uma das vertentes em que o desequilíbrio entre géneros no mercado do trabalho continua a persistir.
Estamos perante uma questão geracional, sendo necessária uma contínua mudança de mentalidades, estereótipos e atitudes, acompanhadas de um amplo processo de aprendizagem social, para que seja possível alcançar, de forma natural e objetiva, o desejado equilíbrio da igualdade de género em cargos de chefia e gestão, como em tudo o resto! As medidas de natureza legal para a promoção da igualdade de género que têm vindo a ser adotadas, poderão funcionar como um fator de aceleração da referida mudança e um motor de correção dos desequilíbrios que a sua não implementação em devido tempo necessariamente gera. Fica contudo a dúvida, frequentemente infundada, acerca do mérito do cargo de liderança assim alcançado!
As Mulheres continuam, contudo, a dispor, caso assim o pretendam e verdadeiramente o assumam, de oportunidades únicas para demonstrar que Liderança não tem género, nem dele depende de forma alguma, estando intrinsecamente dependente de uma série de valores e atitudes assumidas no exercício profissional, como o sejam responsabilidade, compromisso, respeito, partilha, espirito de equipa, autenticidade.
A opção nesse sentido tende por regra a revelar-se árdua, desafiante e quase sempre estruturada em planos de permanente cedência e compromisso entre os diversos papéis assumidos pelas Mulheres no seio familiar, social e profissional. No entanto, uma vez assumidos com determinação e caráter o sucesso estará naturalmente garantido!
Todos nós somos movidos diariamente por algo que nos fascina, por querer fazer mais e melhor ou por um objetivo concreto que desejamos alcançar. Qual tem vindo a ser o seu estímulo diário ao longo dos anos?
Tentar sempre “GOSTAR DO QUE FAÇO E FAZÊ-LO COM GOSTO, DEDICAÇÃO E PROFISSIONALISMO”, talvez tenha sido, e continua a ser, um dos meus maiores estímulos para ter tido a coragem, ainda muito jovem, de deixar o “conforto” do lar e família e partir para locais desconhecidos, assumindo funções novas e completamente díspares, mas suficientemente desafiantes e sempre perspetivadas pelo incentivo do potencial sucesso ao nível da realização pessoal e profissional!
O mesmo princípio está igualmente presente na gestão equilibrada que tento sempre fazer entre os diversos interesses e exigências do meu dia-a-dia, seja no papel da Mãe, Mulher ou Profissional, podendo por vezes ser também um belo refúgio e tentativa de justificação para todos aqueles momentos de angústia e alguma frustração que por vezes nos assolam!
Para acabar – e para este 2021 que está agora no início –, qual continuará a ser o seu papel no Grupo Visabeira, dando seguimento à cronologia de sucesso?
O ano de 2021, embora no início, antevê-se igualmente desafiante para a Direção dos Serviços Jurídicos em face do contexto excecional e totalmente imprevisível de pandemia que continuamos a enfrentar, o qual ditou e continuará a impor a necessidade de uma liderança e gestão próximas e uma dedicação extrema por parte da equipa jurídica que lidero e com quem tenho tido o privilégio de trabalhar ao longo dos últimos 14 anos.
Nessa medida, continuaremos a garantir respostas ágeis, inovadoras e estratégicas em face das sucessivas alterações dos mais diversos regimes legais e regulatórios e rápida mudança no paradigma da prestação do trabalho, transversal aos diversos setores de atividade económica do Grupo Visabeira, tanto a nível nacional como internacional.
A par da função de consultoria, aptidões comunicação e empatia continuarão a ser uma tarefa prioritária no desempenho da função de Diretor dos Serviços Jurídicos, tendo em vista garantir uma liderança coesa da equipa e uma gestão prudente de emoções em resultado do ambiente de total incerteza causado pela atual pandemia.